1. A palavra reduflação está a entrar no quotidiano dos falantes de língua portuguesa. Trata-se de um termo relativamente recente usado para descrever uma técnica comercial implementada pelas marcas, que consiste em reduzir a quantidade de um dado produto, mantendo o seu preço (ou mesmo aumentando-o). Esta é uma estratégia adotada para fazer face à inflação, reagindo ao aumento dos custos de produção e à diminuição dos lucros. A operação em questão nem sempre é feita de forma transparente, pois muitas vezes a redução de tamanho ou de peso não é comunicada aos consumidores, que, estando mais desatentos, poderão não se aperceber da manobra. A palavra é uma tradução do termo inglês shrinkflation, adaptado ao português por meio da junção de duas palavras truncadas: redu- (de redução) e -flação (de inflação).
2. A palavra coronials constitui a nova entrada registada em A covid-19 na língua. Este é um termo que vem descrever uma nova realidade relacionada com algumas das características dos bebés nascidos no decurso do primeiro ano de pandemia.
3. As dúvidas em torno da concordância do verbo com o sujeito assumem muitas dimensões. Neste contexto, a professora Carla Marques traz um apontamento relacionado com um caso de concordância com o sujeito composto (divulgado no programa Páginas de Português, da Antena 2).
4. Ao Consultório regressa a análise sintática de segmentos de textos dos clássicos: uma primeira questão relacionada com dois versos de Os Lusíadas e uma segunda com uma expressão de P.e António Vieira. As combinações de verbos em complexos verbais motivam análises às possibilidades flexionais do verbo dever e à natureza dos constituintes da estrutura «pode ir lendo». E ainda: «Radio-ocultação ou radiocultação», «O -s final antes de vogal» e «Plural de coletivo: doçarias».
5. Transcrevemos, com a devida vénia, os seguintes artigos que desenvolvem temas de interesse linguístico:
– «Podia ser pior» é uma expressão bem enraizada nos costumes linguísticos portugueses. Todavia, quando explorada na sua significação e nos contextos em que é usada, pode causar perplexidades, como nos mostra a escritora portuguesa Maria Gaio na sua crónica;
– A professora universitária e linguista Margarita Correia apresenta um artigo dedicado ao turco e às línguas túrquicas, no qual descreve as suas áreas geográficas e os povos que as falam;
– A evolução do ensino do chinês ao longo dos últimos 30 anos em Portugal está na base do artigo de Wang Suoying, professora universitária de chinês em Portugal, já aposentada, no qual faz um balanço do percurso efetuado (sem esquecer o crescimento do ensino do português na China) e dos desafios futuros.
1. Herculano é o apelido de um dos expoentes da literatura do período romântico em Portugal, Alexandre Herculano (1810-1877). No Pelourinho, o cofundador do Ciberdúvidas, José Mário Costa, dá conta de como, nos novos autocarros da frota da Carris, em Lisboa, se anuncia a paragem que fica na rua dedicada à memória do escritor. A forma escrita abreviada do seu apelido motiva uma realização fonética, no mínimo, ridícula.
2. Os usos da oralidade nos contextos escolares atraem atualmente o interesse de um número cada vez maior de linguistas. Na Montra de Livros, apresenta-se volume 26 (2022) da revista Veredas , da Universidade Federal de Juiz de Fora, dedicado ao tema "O lugar da oralidade em sala de aula: práticas de ensino da escola à universidade". Trata-se de 17 estudos organizados segundo quatro eixos temáticos da investigação em ensino da oralidade em diferentes níveis de escolarização.
3. Numa frase do Crime do Padre Amaro, de Eça de Queirós (1845-1900), procurando recriar a linguagem popular, lê-se a sequência «coma-lhe e beba-lhe». Que valor está, neste caso, associado ao pronome lhe? A pergunta motiva o parecer que se dá no Consultório, que recebe outras cinco respostas subordinadas aos seguintes tópicos: a possibilidade do infinitivo flexionado (pessoal) depois da preposição sem; a análise da construção «tendo em vista que»; a associação do pronome átono a verbos auxiliares; as variantes abcesso e abscesso; e a origem do nome custarda.
4. Exame, máximo e taxa são palavras que apresentam três das várias maneiras de ler a letra x. Num apontamento publicado em 08/10/2022, no mural Língua e Tradição (Facebook), e transcrito com a devida vénia em O Nosso idioma, o professor universitário Rafael Rigolon (Universidade Federal de Viçosa) comenta, na perseptiva brasileira, o valor da letra x em vários termos científicos.
5. Num artigo da edição brasileira da BBC, em 11/10/2022, afirma-se que não é costume pedir desculpa nos Países Baixos. Independentemente do rigor da peça jornalística sobre esta atitude nacional, importa saber que no neerlandês dos Países Baixos – não foi aqui possível reunir elementos referentes à Bélgica, onde a língua é igualmente falada –, ocorre frequentemente o anglicismo sorry, a par de expressões vernáculas, mais enfáticas e sentidas, como «het spijt me» (cf. dicionário neerlandês-português da Infopédia). Em português, às desculpas não faltam ocasiões quer na oralidade quer na escrita, como comprovam algumas respostas do Ciberdúvidas acerca do tópico: "Pedir desculpa ou pedir desculpas", "'Pedir desculpas' vs. 'apresentar desculpas'", "A origem das palavras perdão e desculpa", "Desculpe/desculpa", "A pontuação de 'desculpa'".
6. Uma chamada de atenção para três dos programas dedicados à língua portuguesa na rádio pública de Portugal:
– As diferenças entre a oralidade e a escrita, entre questões do funcionamento da língua, são o tema de uma conversa com a professora Sandra Duarte Tavares em Língua de Todos, transmitido pela RDP África, na sexta-feira, 14/10/2022, às 13h20* (repetição no dia seguinte, c. 09h05*).
– Assinala-se em 15 de outubro o centenário do nascimento de uma das maiores romancistas portuguesas do século XX, Agustina Bessa-Luís (Vila Meã, Amarante, 1922). Para falar da sua vastíssima obra, Isabel Rio Novo, que escreveu uma biografia sobre a autora, é a convidada de Páginas de Português, emitido na Antena 2, no domingo, 15/10/2022, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 22/10/2022, às 15h30*). Também neste programa, a professora Carla Marques debruça-se sobre esta questão gramatical: devemos dizer «a tristeza e a solidão abateu-se sobre mim» ou «a tristeza e a solidão abateram-se sobre mim»?
Na imagem, Leonor Silveira, num fotograma de Vale Abraão (1993), um filme de Manoel de Oliveira (1907-2015) baseado no romance homónimo (1991) de Agustina Bessa-Luís.
– De 17 a 21 de outubro, às 09h50 e às 18h50*, no programa Palavras Cruzadas, realizado por Dalila Carvalho e transmitido na Antena 2, convida-se Carlos Bobone, fundador da Livraria Bizantina, para falar de alfarrabistas.
* Hora oficial de Portugal continental.
7. Como nota da atualidade cultural e voltando ao centenário de Agustina Bessa-Luís, refira-se o programa Agustina. O Riso das Palavras, que lhe dedica a Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa), integrando um colóquio a ter lugar em 18/11/2022 (mais informação aqui). Recorde-se ainda a relação de Agustina Bessa-Luís com a cinematografia de Manoel de Oliveira, da qual resultaram vários filmes, entre eles, o já mencionado Vale Abraão (1993) – ver ponto 6, acima –, do qual aqui fica a apresentação:
1. Ainda às voltas com a apresentação do Orçamento de Estado para 2023, os portugueses são constantemente confrontados com a palavra recessão, que, no quadro da economia, descreve a diminuição da atividade económica de um país. Trata-se de um substantivo com uma grafia que oferece algumas dificuldades ortográficas que advêm do caráter convencional da relação entre o som /s/ e a sua representação por meio das letras <ç>, <c> ou do dígrafo <ss>. Note-se que este som /s/ pode ainda ser grafado <sc> (descer), <sç> (desça), <x> (trouxer), <xs> (excesso), num total de oito possibilidades, cuja origem se encontra na história da língua e no percurso de evolução das palavras. A juntar-se às dúvidas que a grafia da palavra por vezes oferece encontra-se o facto de existirem palavras parónimas (ou seja, com pronúncia e grafia semelhantes) que vêm exigir uma atenção redobrada para evitar mal-entendidos na comunicação escrita. São elas receção ('ato ou efeito de receber') e ressecção – resseção, no Brasil – ('ação de extrair por meio de cirurgia').
Primeira imagem: O Banqueiro e a mulher, de Quentin Matsys, 1514.
2. Em A covid-19 na língua, registamos a entrada da expressão «números artificiais», que alerta para a possibilidade de os atuais números oficiais relativos às infeções em Portugal por covid-19 estarem abaixo da real situação sanitária.
3. O conceito de exónimo, ou seja, o nome pelo qual um dado nome próprio é conhecido numa outra língua é o ponto de partida para explicar a razão pela qual Lisboa assume em diferentes línguas as formas Lisbon, Lisbonne ou Lisbona, entre outras, o mesmo acontecendo com Brasil (Brazil). A este esclarecimento vem juntar-se uma resposta de âmbito morfológico relativa à formação de biforme e de caça e outra de natureza etimológica referente à palavra alma. No quadro da semântica, analisa-se a função do artigo definido ao incidir sobre um nome e a significação de diferentes termos de âmbito médico. Por fim, reflete-se sobre a função de uma vírgula em Machado de Assis e sobre a identificação de relações de regência do nome numa frase.
4. A presença de termos portugueses na atual língua concani, falada em Goa e restantes regiões da Costa do Malabar, resulta de um lento processo de manutenção de palavras portuguesas, herdadas no processo de contacto de línguas da época da expansão marítima. Aí encontramos palavras como sapatu, sai ou Natal (do português, sapato, saia ou Natal). Estas são algumas das curiosidades trazidas pelo apontamento do publicista e escritor goês Mário Cabral de Sá, publicado originalmente na revista Nam Van, em janeiro de 1986.
5. A Turquia e a situação das línguas faladas no país constituem o ponto de partida para a análise da professora universitária portuguesa Margarita Correia centrada na questão do ensino destas línguas e no respeito pelos direitos humanos (crónica transcrita do Diário de Notícias de10 de outubro de 2022)..
6. A professora universitária brasileira Edleise Mendes enceta, na sua crónica, uma viagem entre as palavras que destroem e as que constroem a utopia de um mundo melhor (crónica divulgada no programa Páginas de Português, da Antena 2).
1. Em Portugal, os temas da ordem do dia centram-se no quadro da economia. O Governo português, na reunião em sede de Concertação Social, propôs um aumento do salário mínimo nacional para os 760 euros e anunciou o crescimento até aos 900 euros até ao final da legislatura. As medidas propostas pelo executivo e o contexto em que ocorrem trazem para a atualidade linguística substantivos como salário, remuneração, ordenado, vencimento, mas também inflação ou precariedade (que não deve ser usada com a forma "precaridade", que é incorreta). Entre os verbos recorrentes, encontramos aumentar (os rendimentos, os salários, as pensões, os apoios sociais) e reduzir (as contribuições, a taxa de IRS, os impostos). Um conjunto de termos que descrevem as intenções políticas associadas ao Orçamento de Estado para 2023, que agora se prepara e cuja abordagem linguística pode ser consultada em diferentes textos disponíveis no sítio do Ciberdúvidas.
2. A formação do plural da expressão latina «persona non grata» («pessoa indesejada») deve reger-se pelas regras de formação do plural em latim, como se explica na resposta que se pode ler no Consultório. Aqui é possível também acompanhar respostas a questões de natureza ortográfica: «A abreviatura de "previsto e punível"» e «A grafia de chutar». No quadro da morfologia, analisa-se a diferença entre os elementos compositivos -logista e -logo. Já no âmbito da semântica, trata-se uma questão relacionada com a expressão temporalidade na construção «tem/faz dois dias que» e outra com a significação e a relação entre os termos adesão e aderência. Por fim, no campo da sintaxe, analisa-se a regência do adjetivo ávido.
3. O Dicionário Crítico das Ciências Sociais, organizado por Lívio Sansone e Cláudio Alves Furtado, é apresentado na Montra de Livros. Trata-se de uma obra que, do ponto de vista linguístico, encontra «formulações em português para a construção de terminologias nesta área de investigação, tantas vezes sujeita ao jargão científico anglo-saxónico».
4. A origem, percurso linguístico e significado de palavras como cadeia, prisioneiro, presidiário, detento, prender ou cárcere dão matéria à crónica do linguísta Aldo Bizzochi, que assim explora termos do campo semântico da detenção, tão em voga na atualidade linguística de algumas áreas políticas (transcrita com a devida vénia).
5. Entre os acontecimentos de natureza cultural ou de interesse linguístico, destaque para:
– A atribuição do Prémio Nobel da Literatura à escritora francesa Annie Ernaux, a 17.ª mulher a quem a Academia Sueca concede a distinção;
– As III Jornadas de Ensino e Aprendizagem de Língua Portuguesa (JEALP), dedicadas ao tema "A avaliação no ensino básico" e organizadas em seis sessões, tendo início a 19 de outubro e prolongando-se até 4 de novembro. A presente edição conta com a presença de oradores portugueses e brasileiros e poderá ser acompanhada presencialmente ou de forma remota (inscrições abertas aqui).
6. Nos programas da rádio pública de Portugal dedicados à língua portuguesa, tratam-se os seguintes temas:
– Língua de Todos, transmitido pela RDP África (sexta-feira, 07/10/2022,13h20*; com repetição no dia seguinte, pelas 09h05*) tem como convidado Victor Macedo, coordenador do Grupo Interinstitucional de Terminologia do Português das instituições europeias, para falar do projeto deste grupo de trabalho;
– Páginas de Português, difundido pela Antena 2 (domingo, 09/10/2022, 12h30*; repetido em 15/10/2022, 15h30*), traz à antena a professora universitária Isabel Leite, que apresentará o estudo Como estão a ser preparados os futuros professores para o ensino da leitura e da escrita. Neste programa, divulga-se ainda a crónica de Edleise Mendes, acerca das palavras e da utopia de um mundo melhor;
– Palavras Cruzadas, programa de Dalila Carvalho (Antena 2, de segunda a sexta, às 09h50 e às 18h50*) apresenta o Dicionário do Compliquês, coordenado pela equipa da claro.pt, um projeto em linha que continua em construção e que aceita entradas propostas pelos leitores.
* Hora oficial de Portugal continental.
1. A primeira volta das eleições gerais do Brasil teve lugar em 2 de outubro e, se, no plano presidencial, deu alguma vantagem a Lula da Silva, não o deixou a grande distância de Bolsonaro. Aguarda-se, portanto, um segundo turno eleitoral – no português brasileiro, o mesmo que «segunda volta» –, marcado para 30 de outubro, continuando o momento político a alimentar novos usos linguísticos, uns fugazes, outros nem tanto. É o caso dos significados literal e pejorativo de bolsonarista, palavra analisada num artigo publicado em A Folha de S. Paulo, em 29/09/2022, e transcrito, com a devida vénia, em O Nosso Idioma. A propósito de bolsonarista, que é nome mas também ocorre adjetivalmente, leia-se na referida rubrica uma crónica da professora Carla Marques acerca da função e da significação dos adjetivos.
2. Diz-se que a expressão camoniana «ocidental praia lusitana» constitui uma sinédoque, ou seja, configura uma figura de retórica pela qual se toma a parte («a ocidental praia») para aludir a um todo – mas que "todo"? Alguma praia da região lisboeta? Não é só isso, como se revela numa das novas respostas do Consultório, cuja atualização traz ainda outras cinco questões: a que classe de palavras pertence enquanto, no sentido de «na qualidade de»? Bateria é o nome coletivo correspondente a exame? A localidade portuguesa de Dois Portos tem algum gentílico? Na área da química, o termo lignina é mais correto que lenhina? A palavra arejabilidade existe?
Na imagem, uma quadro de José Malhoa (1855-19339, "Dois pintores pintando à beira-mar" (1918). Fonte: "As praias portuguesas na pintura", blogue Escrita(s), 11/07/2013.
3. Em 5 de outubro, festeja-se o 112.º aniversário da implantação do regime republicano em Portugal. A palavra república tem origem no latim respublica, um composto formado pelas palavras também latinas res publica, entendidas como o mesmo que «coisa pública, o Estado, a administração do Estado» (Dicionário Houaiss). A forma moderna república está atestada, pelo menos desde o século XV, em variação com "repubrica" e "repuvrica", embora no século XVI se recolham exemplos de respublica como forma culta (cf. José Pedro Machado, Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa). À volta da efeméride e de certos aspetos associados a república, sugere-se a consulta de "As palavras república e monarquia", "'Viva a República' e 'vivà República'", "A bem da previdência e do respeito pela língua da República" e "Tipos de texto e tipo de ato no Diário da República (Portugal)".
4. Ainda relativamente à história da república em Portugal e ao seu impacto na história cultural do país nos anos 10 e 20 do século XX, regista-se a inauguração em 4 de outubro, pelas 18h00, na Biblioteca Nacional de Portugal, da exposição que assinala o centenário da revista Seara Nova, cujo primeiro número saiu em 15 de outubro de 1921. Sobre esta publicação, leia-se a resposta "Seara Nova", da autoria do professor universitário e crítico literário Ernesto Rodrigues.
5. Iniciativas que visam promover as literaturas de língua portuguesa internacionalmente:
– De 6 a 12 de outubro, realiza-se o F(O)LIO – Festival Literário Internacional de Óbidos, que nesta edição de 2022, é dedicado à temática do poder.
– Na cidade da Praia (Cabo Verde), decorre de 6 a 8 de outubro a X edição do Encontro de Escritores de Língua Portuguesa, subordinado ao tema "Insularidade e Universalidade na Literatura". Trata-se de uma realização da União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA) e da câmara municipal da Praia.
6. Dois registos finais, para:
— O artigo "A Guiné-Bissau e a luta pelo futuro", da autoria da linguista e professora universitária portuguesa Margarita Correia, publicado no Diário de Noticias do dia 3/10/2022, em que aborda as dificuldades de erradicação do analfabetismo e do acesso universal à educação num país de pouco mais de 1,5 milhões de habitantes e com uma vintena de línguas (incluindo o português, como língua oficial, mas falado apenas por 15% da população); e
— A recomendada prolação do nome Nobel, cujos prémios de 2022 começaram a ser anunciados na presente semana.
1. A agressividade verbal e não verbal marca a campanha para a primeira volta (ou turno) das eleições gerais que se realizam no Brasil em 2 de outubro de 2022. Em O Nosso Idioma, a respeito deste tema, José Mário Costa, cofundador do Ciberdúvidas, respiga várias das expressões – umas de intenção pejorativa, outras de tom grosseiro e poucas de sentido mais benigno – que se salientaram não só no discurso da comunicação social mas também no dos próprios candidatos, nomeadamente nos últimos dois debates televisivos com os sete candidatos presidenciais neles participantes. Ainda no âmbito político, mas noutra área de intervenção, inclui-se na mesma rubrica uma reflexão da linguista Edleise Mendes (Universidade Federal da Bahia) sobre os desafios que a diversidade linguística num território lança a qualquer governo.
Na imagem, Pintura n.º 2 (Museu de Arte do Rio Grande do Sul Ado Malagoli) de Carlos Carrion de Britto Velho (Porto Alegre, 1946).
2. Com a pandemia, que ainda não está fora do horizonte das atualidades, surgiu a necessidade de inventariar os muitos neologismos decorrentes desta crise, como é exemplo o próprio reportório vocabular e fraseológico A covid-19 na Língua, que se disponibiliza no Ciberdúvidas. Mas outros glossários têm surgido, enquadrados por preocupações de recolha científica, como sejam o Dicionário multilingue da Covid-19, desenvolvido pelo curso italiano Lessicologia e Lessicografia da Universidade de Nápoles, o Glossário Colaborativo COVID-19, a cargo de uma equipa de investigadores do Centro de Linguística da Universidade NOVA de Lisboa, e o Vocabulário da pandemia do novo coronavírus, disponível na página da Universidade Federal de Santa Maria (Rio Grande do Sul). Na presente atualização, estes três projetos passam a ter registo também em A covid-19 na Língua, onde se incluem ainda três outras entradas, alusivas quer à evolução da pandemia quer às suas consequências: «Erik e Nelly», em referência a duas das mutações mais contagiosas do vírus da covid-19; Manaus, capital do estado do Amazonas e um dos epicentros da pandemia no Brasil; e «(perda da) perceção do tempo», expressão que designa uma das consequências psíquicas dos períodos de confinamento, segundo um estudo norte-americano.
3. Diz-se sem errar «pisar o chão», mas «pisar no chão» é também uso correto? No Consultório, dá-se resposta a esta e outras perguntas, num total de seis: que valor tem a expressão «tanto assim que» numa frase ou num texto? «Para manutenção» significa o mesmo que «para manter»? Qual é a origem do emprego de alvo, no sentido de «ponto de mira»? Como analisar a formação de estadiómetro? E qual é afinal o género gramatical de flange?
4. O que será o cúmulo do anglicismo? Talvez um galicismo disfarçado de palavra inglesa. No século XIX e, em parte do século XX, os galicismos eram motivo de censura sistemática entre gramáticos e estudiosos da língua. Hoje parecem menos preocupantes, a não ser quando se tornam anglicismos, como se revela em Diversidades, num apontamento traduzido do francês sobre a origem de termos como e-mail ou glamour.
5. Da atualidade com interesse linguístico, tanto no espaço lusófono, como fora dele, são de realçar:
– O passatempo A Palavra do Ano, promovido pela Porto Editora, que pede ao público sugestões para a elaboração de uma lista com as palavras mais marcantes de 2022. Recorde-se que a palavra mais votada em 2021 foi vacina.
– O Dia Internacional da Tradução, que se celebra em 30 de setembro, coincidindo com o dia de S. Jerónimo, e motiva iniciativas como a do leitorado do Camões I.P. em Varsóvia, o qual leva a cabo as «Conversas Noturnas de Tradutores e Intérpretes», no Teatro Halina e Jan Machulski, no bairro varsoviano de Ochota, a partir das 18h00. A propósito da data, leiam-se também as observações que o tradutor e professor universitário Marco Neves publicou em 2 de janeiro de 2022, no Sapo 24, acerca de tradução de cosy, uma palavra inglesa supostamente intraduzível.
– No blogue Certas Palavras, o tradutor ucraniano Sérguei Lúnin assinou em 29 de setembro de 2022 um artigo a respeito dos aspetos linguísticos também envolvidos na guerra da Ucrânia.
6. Quanto a três dos programas dedicados à língua portuguesa na rádio pública de Portugal:
– Em Língua de Todos, transmitido pela RDP África (sexta-feira, 30/09/2022,13h20*; repetição no dia seguinte, c. 09h05*), entrevista-se a chefe dos serviços de interpretação em português da Comissão Europeia, Anabela Frade, sobre a relevância da língua portuguesa na União Europeia e nos projetos desenvolvidos por esta organização junto de comunidades do Brasil, dos países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP) e de Timor-Leste.
– Para falar sobre a tradução a partir de muitas línguas e difundida por várias instituições da Comissão e União Europeias, os tradutores Teresa Bairos e Victor de Macedo são os convidados de Páginas de Português, difundido pela Antena 2 (domingo, 02/10/2022, 12h30*; repetido em 08/10/2022, 15h30*). No programa, participa também a professora Carla Marques, com uma crónica sobre a função dos adjetivos na frase.
– O liberalismo e a linguagem do debate parlamentar dão o mote às emissões de 3 a 7 de outubro de Palavras Cruzadas, programa realizado por Dalila Carvalho e transmitido na Antena 2 (segunda a sexta, às 09h50 e às 18h50*). O convidado é o economista Carlos Guimarães Pinto, deputado da Iniciativa Liberal.
* Hora oficial de Portugal continental.
1. Os italianos foram a votos no passado domingo e deram a vitória a Giorgia Meloni, abrindo caminho a um governo de coligação liderado pelo partido Irmãos de Itália. Esta é uma situação que traz novos receios à Europa, num período de complexos problemas do foro militar, político e económico. O novo panorama político em Itália traz para a atualidade linguística palavras e expressões convocadas pelo pensamento político da líder do partido vencedor, tais como extrema-direita (que deve ser grafada com hífen), «coligação de direita» ou direitista. Algumas perspetivas trazem também termos como fascismo, neofascismo (que, no quadro do AO90 se deve escrever sem hífen) ou pós-fascismo (que mantém o hífen porque o prefixo tem acento próprio).
No Ciberdúvidas, podem ser recordados alguns textos que abordam questões relacionadas com este tema: «À volta do conceito de extrema-direita» e «Os direitos das palavras: fascista».
2. A covid-19 na língua recebe três novas entradas que dão conta da evolução de diferentes situações neste tempo de alívio pandémico. Por um lado, analisam-se os números da «Esperança da vida», para concluir que, em Portugal, esta recuou para os 80,72 anos. Por outro, observam-se consequências da reação aos excessos do teletrabalho, com o fenómeno «Quiet quitting». Por fim, anunciam-se possíveis «Calamidades futuras» para as quais o mundo se deve preparar.
3. A concordância do predicativo do sujeito numa frase copulativa é o assunto abordado numa das respostas que integram a atualização do Consultório. Poderão também ser consultadas diversas respostas de âmbito lexical: «Antologiar e antologizar», «Determinista e determinístico», «O significado de peroração», «O verbo abarrotar» e «Découpage e decupagem». No plano sintático, registam-se também duas novas respostas: ««O que não lhe falta são amigos», de novo» e «Complemento indireto em português coloquial de Angola».
4. Na rubrica Montra de Livros, apresenta-se a recolha Património Linguístico do Norte Alentejo, uma obra resultante de um trabalho de alunos do 5.º ao 9.º ano do Agrupamento de Escolas José Régio, em Portalegre. Um levantamento que considera o léxico e particularidades lexicais da região e que constitui um trabalho relevante para a manutenção da memória linguística portuguesa.
1. No quadro da guerra da Ucrânia, o presidente russo Vladimir Putin decretou mobilização parcial dos reservistas, uma decisão que mostra que o atual conflito não tem ainda fim à vista e que o preço a pagar do ponto de vista humano, social e económico continua a crescer a cada dia que passa. Do ponto de vista linguístico, o termo reservistas designa os "militares que não se encontram no ativo"; do ponto de vistas político, evidencia que os líderes russos estão dispostos a tudo para atingirem os seus objetivos, o que parece estar cada vez mais distante da vontade da população russa, como tem ficado patente nas manifestações antiguerra que têm tido lugar e na fuga de russos para países vizinhos. Reservistas deriva do nome reserva, que é muito produtivo em contexto militar. Este designa também as tropas que, no campo de batalha, ficam à retaguarda para ocuparem os lugares onde vierem a ser necessárias. É ainda o nome dado ao conjunto de vasos de guerra destinados a irem em auxílio de outros. Reserva pode ainda referir um militar que substitui outro que esteja impossibilitado de prestar serviço.
2. O comportamento do adjetivo esbulhado está dependente dos argumentos selecionados pelo verbo esbulhar, tal como se explica nesta resposta que integra a atualização do Consultório. Neste espaço, analisam-se também as diferenças entre os termos profanação e desconsagração aplicados à situação de alteração de funções de uma igreja. Da variante brasileira do português, chega-nos a construção «deixa eu ver» cuja adequação se analisa. Por fim, consideram-se os argumentos do verbo matar e a construção proverbial «Quem com ferro mata com ferros morre».
3. A evolução da pronúncia da rainha Isabel II deu lugar a um estudo de fonética e processamento da fala que comprova que, ao longo da vida, a voz e o sotaque mudam. Este último sofre influências de um conjunto de mudanças sociais, culturais e tecnológicas a que o falante está sujeito. Estas são algumas das conclusões aplicadas à língua inglesa que resultam da investigação desenvolvida a partir de 35 transmissões que a rainha fez entre os 26 e os 91 anos (artigo traduzido, disponível na rubrica Diversidades).
4. A presença do latim na língua portuguesa fica patente em inúmeras situações. Uma delas consiste no uso de expressões latinas que mantêm a sua vitalidade até aos dias de hoje, o que acontece, por exemplo, com a priori ou mea culpa. Este é o assunto de base deste pequeno apontamento (aqui transcrito com a devida vênia).
5. Entre acontecimentos culturais de relevo, realçamos:
– O Festival Literário Internacional de Óbidos – Fólio 2022, dedicado ao tema do poder, que decorrerá de 6 a 16 de outubro em Óbidos (programa);
– A 20.ª edição do DocLisboa, festival internacional de cinema, com o tema "A questão colonial", com um ciclo de cinema associado ao passado colonial de França e Portugal, entre 6 e 16 de outubro (programa).
6. Nos programas da rádio pública portuguesa, destacamos
- Língua de Todos, da Antena 2, que convida a professora Lúcia Vaz Pedro para falar sobre “O curso de Português Académico” que ministrou para os estudantes provenientes dos PALOP e que frequentam o ISCTE (sexta-feira, dia 23 de setembro, pelas 13h20*, com repetição no sábado, 24 de setembro, depois do noticiário das 09h00*);
- Páginas de Português, da Antena 2, dedicado ao Dia Europeu das Línguas, que se celebra a 26 de setembro, convida dois tradutores/intérpretes do Parlamento Europeu, Francisco Falcão e Anabela Frade; na sua crónica habitual, a professora universitária Edleise Mendes tratará o tema Língua e Poder (domingo, dia 25 de setembro, pelas 12h30*, repetido no sábado, 1 de outubro, às 15h30*).
*Hora oficial de Portugal continental
1. A 21.ª Semana Europeia da Mobilidade 2022 subordina-se este ano ao tema «Melhores Ligações». Em Portugal, vários são os municípios que aderiram à iniciativa, desenvolvendo diferente medidas que têm em vista promover e testar soluções de mobilidade limpa e sustentável, uma opção cada vez mais imperiosa face às alterações climáticas a que a humanidade está a assistir. Notamos, porém, que a divulgação das atividades deixa a nu o recurso sistemático à língua inglesa: pode-se experimentar uma "cargobike", fazer um "checkup" à bicicleta, conhecer soluções de "carpooling" e há "ecolaps" solidárias. Para todas estas designações é possível encontrar uma solução em português: bicicleta de carga, exame completo, viagens partilhadas, produtos feitos de materiais reciclados, respetivamente. O recurso à língua inglesa é uma opção que continua a exigir um olhar atento e uma posição firme que se oriente na defesa da língua portuguesa.
2. A constatação de que na variante de português do Brasil se recorre à palavra bem em contextos em que se usaria muito dá matéria para a primeira resposta da nova atualização do Consultório. A ela vêm juntar-se duas questões de regência verbal («ficar em» e «logar-se em/a»), uma relacionada com a ordem dos constituintes quando se usa o adjetivo último e outras duas relacionadas com toponímia (a origem e significado de Carapinha e a tradução de Norcia, pequena localidade italiana).
3. O falecimento da rainha Isabel II trouxe para a atualidade linguística a palavra exéquias, cuja origem, pronúncia e significados se exploram na crónica da professora Carla Marques (divulgada no programa Página de Português, da Antena 2 e aqui transcrita).
4. A professora universitária e linguista Edleise Mendes reflete sobre a proximidade entre as língua portuguesa e espanhola, duas línguas com quase 850 milhões de falantes, numa crónica que destaca todo o potencial que estas línguas, "irmãs históricas", encerram (texto elaborado para o programa Página de Português, da Antena 2, que aqui se transcreve).
5. Um registo final para esta noticia no mínimo surpreendente: Erros de português tramam juiz de Leiria
1. Em Portugal, como noutros países, o mês de setembro é marcado pelo retomar de muitas atividades, e o arranque do novo ano letivo é tema obrigatório. Mas o mundo nunca para de alimentar notícias: acumulam-se tensões políticas nacionais e internacionais, a guerra na Ucrânia não cessa, os problemas ambientais também não. Entretanto, a pandemia de covid-19 parece prestes a tornar-se uma página da História, sem deixar de estar presente na atualidade, como se ilustra no glossário Covid-19 na língua, que recebe três novas entradas: Emer Cooke, diretora executiva da Agência Europeia do Medicamento (EMA) e, paradoxalmente, antiga lobista da indústria farmacêutica; a expressão «fim à vista», relativa às declarações, em 14/09/2022, de Tedros Ghebreyesus, diretor da Organização Mundial de Saúde, sobre a diminuição do número de mortes causadas pela doença; e «imunidade, 95,8%», em referência ao facto de a maior parte da população residente em Portugal já ter anticorpos, segundo um relatório datado de 15/09/2022, do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA).
Do ponto de vista etimológico, a palavra imunidade vem do latim immunìtas, atis, «isenção (de impostos, de encargos), dispensa, desobrigação, imunidade» (Dicionário Houaiss). Em português, como noutras línguas, denota frequentemente o «privilégio de estar isento de algo (dever, encargo, pena) a que os outros estão sujeitos» e é sinónimo de isenção e dispensa (dicionário de língua portuguesa da Infopédia). Por extensão semântica, tornou-se termo da área da biologia, usado no sentido de «invulnerabilidade natural ou adquirida dos organismos vivos aos efeitos de determinados agentes patogénicos ou substâncias estranhas» (ibidem). Quanto à expressão imunidade de grupo, consulte-se a rubrica aqui referida. Na imagem, um quadro de Francis Smith (Lisboa, 1881-Paris, 1961).
2. O que é correto: «convidar a escrever um livro», ou «convidar para escrever um livro»? A resposta encontra-se no Consultório, onde se disponibilizam mais sete respostas às seguintes perguntas: quando se faz maionese e ela talha, diz-se que deslassou ou deslaçou? Como se classifica a oração «sem se ver»? Na frase «começa cedo a criaturinha» falta uma vírgula ou não? Como usar sem errar a expressão «após o que»? No Brasil, azarar só significa «dar azar»? A palavra heládico tem algum sinónimo? E o que quererá dizer o provérbio «se não fora o Pindo e a Panadeira, todas as velhas iam à Ribeira»?
3. Sobre o Serviço Nacional de Saúde português e o seu funcionamento com um novo estatuto, a comunicação social referiu-se algumas vezes à figura que o vai gerir, Fernando Araújo, como sendo o novo CEO, sigla da expressão inglesa chief executive officer. A respeito deste anglicismo repetido e escusado, leia-se o comentário de José Mário Costa no Pelourinho.
4. O português de Angola suscita cada vez mais interesse entre linguistas e especialistas em planeamento linguístico. Na Montra de Livros, apresenta-se Da Fonologia à Lexicografia. Elementos para uma Gramática do Português de Angola, uma obra publicada pelas edições Húmus, com a coordenação do professor universitário Paulo Osório, que reúne um conjunto de estudos como primeiro passo para a construção de uma gramática para a variante angolana do português.
5. Quanto aos temas de três dos programas que a rádio pública de Portugal dedica à língua portuguesa:
♦ o curso de formação de professores de Português dos países africanos de língua oficial portuguesa e de Timor-Leste que a Universidade Federal da Bahia (UFB) está a levar a cabo, com o apoio do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), em Língua de Todos, na RDP África (sexta-feira, 16/09/2022,13h20*);
♦ o curso de Português Pluricêntrico, também organizado pela UFB e patrocinado pelo IILP, em associação com o Ministério das Relações Exteriores do Brasil e o Observatório de Português Língua Estrangeira/Segunda Língua, em Páginas de Português, na Antena 2 (domingo, 18/09/2022, 12h30*), programa que conta ainda com a participação da professora Carla Marques, com uma crónica sobre a palavra exéquias, em alusão às cerimónias fúnebres de Isabel II;
♦ e, em Palavras Cruzadas, programa realizado por Dalila Carvalho e transmitido pela Antena 2 de segunda a sexta (às 09h50* e às 18h50*), Maria Regina Rocha explica o que é uma metáfora e fala da sua importância na política, no discurso amoroso, na literatura e na linguagem corrente.
* Hora oficial de Portugal continental.
Este é um espaço de esclarecimento, informação, debate e promoção da língua portuguesa, numa perspetiva de afirmação dos valores culturais dos oito países de língua oficial portuguesa, fundado em 1997. Na diversidade de todos, o mesmo mar por onde navegamos e nos reconhecemos.
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