A preferência1 por ç (antes de a, o, u, sempre no meio de palavra) ou c (antes de e e i, em qualquer posição) tem que ver com o facto de o som incluído nessas palavras ser parecido ao som que nos séculos XVI e XVII se escreviam com ç ou c (este, como se disse, antes de e e i). Em português, tratava-se da chamada sibilante pré-dorsal, que hoje é a maneira normal de pronunciar qualquer /s/ na maioria das variedades do português.
Um artigo do filólogo R. F. Mansur Guérios ("Transcrição portuguesa de um fonema tupi", Revista Letras, 29, 1980, p. 131) apoia o que atrás foi dito: «A representação gráfica c (ce, ci), ç apoia-se, de modo inconteste, na articulação de um fonema tupi, uma africada sibilante surda, [...]. Ora, sucede que também no português arcaico havia esse fonema, símile ao tupi, e fazia-se, portanto, distinção entre c (ce, ci), ç e s (ss).»
Note-se que, nos referidos séculos, o s de saber e os ss de assar representavam uma fricativa apical, um som sibilante que não se pronunciava do mesmo modo que o som representado pelo ç de caça ou o c de aceitar (ver Textos Relacionados).
1 No começo de palavra e seguido de a, o ou u, escreve-se sempre s, uma vez que, de acordo com os princípios da ortografia do português, não há palavra começadas por ç, mesmo que se trate de palavras proveniente do tupi (tupinismo): sabiá (ave) < sawi'a (cf. Dicionário Houaiss); socó (ave) < so'ko (cf. ibidem); sururu (molusco; confusão) < seru'ru ou suru'ru (cf. ibidem). No meio das palavras, trata-se de uma preferência, mas registam-se grafias com -ss-: pissandó, como variante de piçandó (árvore; cf. ibidem).