Aberturas - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
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Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Com o começo da primavera no hemisfério norte, coincide normalmente o Dia Mundial da Poesia, celebrado anualmente em 21 de março*. Com esta data, que foi fixada em 1999, na 30.ª Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), «pretende-se salientar a importância da poesia enquanto manifestação artística comum a toda a Humanidade», bem como celebrar «a criatividade, a pluralidade linguística e cultural e promove[r]-se o ensino e declamação da poesia» – lê-se numa das páginas do Centro de Informação Europeia Jacques Delors. Sobre o vocábulo poesia, sugere-se a leitura das respostas " A ortografia e etimologia do nome poesia", "A poesia e a música da nossa Língua" e "Nossa Língua Portuguesa, a língua da poesia. Chama-se também a atenção para os textos recolhidos na rubrica Antologia, muitos deles configurando diferentes modos de entender a poesia em português e entre os quais se destaca neste dia "Poesia Necessária", de Manuel Rui, "Crónica verdadeira da língua portuguesa", de João Melo, e "Ah! As palavras", de Vasco Graça Moura (1942-2014).

Ainda na Antologia, divulgamos com a devida vénia o poema em quadras do humorista e apresentador César Mourão, que com esta composição contribuiu para o conjunto de iniciativas e textos dedicados à língua portuguesa com que o jornal Público assinalou o seu 35.º aniversário  em 05/03/2025. É um texto, de veia popular, que apela à reflexão sobre o que pode ser a experiência emocional de um falante de crioulo quando aprende o português na escola. Na imagem, "Uma Rosa é..." (1968), de João Vieira (1934-2009), no Centro de Arte Moderna, em Lisboa.

* Em 21 de março, também se festeja, em Portugal e noutros países, o Dia da Árvore.

2. A linguista e professora universitária Teresa Brocardo (1959-2023) notabilizou-se na área da linguística histórica, com estudos sobre processos diacrónicos de gramaticalização, ilustrados pela evolução de palavras semanticamente próximas, como os verbos ser e estar ou haver e ter,  conforme ocorrem em textos medievais. Na Montra de Livros, apresenta-se o livro ...Sedia la fremosa..., um lançamento de junho de 2024 que foi organizado por Antónia CoutinhoClara Nunes Correia e Maria do Céu Cetano, e que reúne os trabalhos mais proeminentes desta destacada académica seguidos de um comentário de cada uma das organizadoras.

3. Numa semana em que a guerra continuou a estar presente na atualidade internacional e a depressão Martinho se fez sentir com particular intensidade em Portugal, os comentários televisivos em direto continuaram a dar azo a lapsos linguísticos reveladores de associações mentais curiosas. Em O Nosso Idioma, o consultor Carlos Rocha comenta a confusão entre «estar escrito na pedra» e «estar escrito nas estrelas» e as subtilezas semânticas e referenciais do par melhora-melhoria.

4. Em Portugal, o que distingue os termos reformado, aposentado e jubilado? A questão, que tem certa complexidade, faz parte do conjunto das seis novas perguntas do Consultório. São também abordadas as seguintes áreas: a sintaxe, em "O uso preposicional de fora"; a semântica lexical, em "A origem de 'dar raia'", "Sinonímia: inimigo, desafeto e rival", "A expressão «meio-dia e meia» II"; e a formação de palavras, designadamente, de gentílicos, em "Gentílicos de Estados e territórios das Caraíbas".

5. Nos vídeos Ciberdúvidas Responde, o tópico do novo episódio (n.º 27) corresponde à definição de sigla e acrónimo no contexto da gramaticografia do Brasil. Quanto a O Ciberdúvidas Vai às Escolas, no episódio n.º 22 explica-se como funciona a mesóclise em casos como dar-te-ei e dar-te-ia (agradece-se a participação do Instituto Politécnico de Lisboa).  

6. Registos vários:

– uma leitura com interesse, sobre o estatuto do português como Língua de Herança no Japão: um estudo de 2022 da linguista Tábata Q. Yonaha, intitulado "O reconhecimento do Português Língua de Herança no Japão como um direito humano linguístico" (Revista Horizontes de Linguística Aplicada, Universidade de Brasília);

– o artigo "Afinal, é IKEÁ ou IKEIA? Vento da madrugada levantou as dúvidas" (Notícias ao Minuto, 20/03/2025), o qual se refere a um estrago causado pela depressão Martinho em Portugal (ver ponto 3) e cujo título tem resposta clara numa resposta do arquivo Ciberdúvidas;

– os primeiros mestrados em História e Património e um doutoramento em Sociedade, Cultura e Desenvolvimento que a Universidade de São Tomé e Príncipe vai começar a oferecer no arquipélago com apoio da Universidade de Évora (Observatório da Língua Portuguesa, 19/03/2025).

7. Referência a dois dos programas que, na rádio pública de Portugal, são dedicados a temas da língua portuguesa:

– Em Língua de Todos (RDP África, sexta-feira, 21/03/2025, 13h20*; repetido no dia seguinte, c. 09h05*), a linguista Sandra Duarte Tavares discorre sobre pleonasmos.

– O bicentenário do nascimento de Camilo Castelo Branco é o tema do programa Páginas de Português (Antena 2, domingo, 23/03/2025, 12h30*; repetido no sábado seguinte, 28/03/2025, 15h30*), em que participa o crítico literário António Carlos Cortez. Ainda o apontamento gramatical da professora Carla Marques, esta semana sobra a pronúncia correta do termo latino incipit.

Hora oficial de Portugal continental.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A associação entre nacionalidade e língua tem sido convocada por diferentes setores da sociedade com vista a fins muito distintos. A língua como fator essencial na construção identitária tem sido também uma questão teórica abordada em várias áreas dos estudos linguísticos. No quadro destas relações, mais recentemente, tem-se colocado uma nova questão associada ao fenómeno da imigração, que tem tido bastante expressividade em Portugal: deverá o domínio da língua ser uma condição de entrada no país? As opiniões têm-se dividido: há quem recorde o passado dos imigrantes portugueses, que desconheciam as línguas dos diferentes países onde se instalaram em busca de uma vida melhor; há quem argumente com as questões de unidade e identidade cultural de um povo. Recentemente, Jorge Miranda, considerado um dos pais da Constituição portuguesa, veio defender que Portugal só deve aceitar imigrantes que dominem o português, mostrando-se, neste âmbito, favorável à entrada de imigrantes oriundos de países africanos de língua portuguesa e do Brasil. Na sua ótica, o domínio da língua é um fator de integração que deverá ser tido sempre em consideração. A relação entre um dado povo e a sua língua pode ser encarada sob o ponto de vista da história da criação das línguas, uma área para a qual investigações recentes trouxeram contributos importantes. Com efeito, embora atualmente se considere que a língua é um dos eixos de afirmação de um povo, também parece certo que as línguas humanas tiveram uma origem comum, descendendo todas de uma primeira língua, que terá começado a sofrer divisões há cerca de 135 mil anos com a mobilidade geográfica dos povos e o desenvolvimento posterior de variações genéticas. Num estudo recente publicado na revista Frontiers in Psychology (divulgado pelo jornal Público) divulgam-se estes dados, atribuindo os investigadores particular atenção não à possibilidade humana de produção de sons mas antes à capacidade de associação entre vocabulário e sintaxe, que criou um sistema assente em regras, uma gramática, que abriu caminho para o desenvolvimento do pensamento complexo e à sua partilha com os outros seres humanos. 

2. Considerando ainda a celebração do bicentenário do nascimento do escritor Camilo Castelo Branco, o consultor Carlos Rocha dedica um apontamento de natureza topológica à grafia da designação da localidade onde este viveu os últimos anos de vida: dever-se-ia grafar Ceide ou Seide (como atualmente acontece)?  

3. Poderão os termos adotados para designar as variedades do português encerrar uma natureza discriminatória? Encerrarão estruturas como «português europeu» e «português do Brasil» juízos de valor sobre os povos que falam as diferentes variedades de uma língua? Esta questão é abordada numa resposta que demonstra como os usos terminológicos científicos procuram formulações acéticas para descrever realidades linguísticas, constituindo, por vezes, os valores ideológicos que se lhes pretende associar uma ação a posteriori. Na atualização do Consultório, é possível ler ainda uma resposta sobre as possíveis significações do nome criatura e consultar três respostas sobre tópicos de natureza sintática: usos do verbo emendar; natureza da palavra junto de nome; concordância do adjetivo com dois nomes. Por fim, uma resposta de âmbito lexicológico relacionada com o regionalismo "deboeira"

4. O provérbio «Julho, debulhar. Agosto, engavelar» pode oferecer dificuldades de compreensão a um falante atual pela opacidade do verbo de âmbito agrícola engavelar. No apontamento enquadrado da Dúvida da Semana, a professora Carla Marques aborda o tema (divulgado no programa Páginas de Português, na Antena 2). 

5. Entre os acontecimentos e artigos de interesse, destacamos:

–  O artigo divulgado no jornal Público sobre a censura da palavra mulher, nos EUA,  determinada pela administração Trump;

– As questões que se apresentam como entrave ao desenvolvimento do Amália, o modelo de inteligência artificial português. 

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1. Em Portugal, assiste-se a uma nova crise política com a queda do XXIV Governo Constitucional, numa conjuntura internacional gerada pelo que já se chama «nova ordem global». Entretanto, a atividade cultural continua, e celebra-se o bicentenário de um dos maiores autores de língua portuguesa do século XIX, Camilo Castelo Branco, que, apesar de nascido em Lisboa em 16/03/1825, passou a vida no norte de Portugal, até ao seu desfecho trágico, em 1890, em São Miguel de Seide (Vila Nova de Famalicão). Além da turbulência dos enredos, com o seu quê de autobiográfico, que caracterizam muitos romances e novelas, a obra camiliana salienta-se por uma enorme mestria no uso de palavras e registos associada a uma aguda consciência do funcionamento da língua. Como sublinha a linguista Sónia Valente Rodrigues (Faculdade de Letras da Universidade do Porto): «Na obra de Camilo Castelo Branco, [...] [t]êm sido destacadas, sobretudo, a diversidade e precisão vocabular, o capital lexical e a capacidade de recriação de diálogos plenos de marcas orais vivas da fala nortenha, forte contributo para a composição de quadros de costumes.»* Várias publicações tem assinalado a efeméride, entre elas, por exemplo, o n.º 382 (12/03/2025) de  As Artes entre as Letras, dedicado à evocação de Camilo Castelo Branco e ao impacto do seu estilo, ainda hoje visto como modelo de vernacularidade. Numerosos são também os acontecimentos culturais, incluindo os académicos, que assinalam a efeméride, como é o caso de congresso internacional Camilo Castelo Branco, 200 anos depois, realizado de 14 a 16/03/2025 na Casa de Camilo, em São Miguel de Seide. Juntando-se o Ciberdúvidas à homenagem, sugere-se a leitura de dois textos da rubrica Antologia: "Obriga-se o cronista... (sobre os adjetivos substantivados)" (extrato do livro Crónicas, Textos Polémicos e Artigos Escolhidos, ed. Círculo de Leitores, com título da responsabilidade de Ciberdúvidas) e "A linguagem do padre António Vieira em Os Sermões – Génio, ironia e sarcasmo" (extrato de  Curso de Literatura Portuguesa, Lisboa, 1876, p. 104).

* "Manifestações metalinguísticas na obra de Camilo Castelo Branco: estudo preliminar", in Desafios em língua portuguesa: do olhar da linguística textual à perspetiva retórica-argumentativa). Para acesso em linha à edição de obra de Camilo Castelo Branco pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda, clicar aqui.

 2Amor de Perdição é muito provavelmente a obra mais conhecida de Camilo Castelo Banco. Por razões que muitos recordam e outros poderão desvendar, o verbo degredar e o nome degredo são palavras recorrentes no livro, com uma carga dramática que tem ponto alto numa carta de Simão Botelho a Teresa: «A vida é tudo. Posso amar‑te no degredo. Em toda a parte há céu, e flores, e Deus. Se viveres, um dia serás livre; a pedra do sepulcro é que nunca se levanta. Vive, Teresa, vive!» O verbo degredar é precisamente o motivo de uma das dúvidas da atualização do Consultório, a qual também abrange as áreas da sintaxe – A construção «cidade de Lisboa», "A sintaxe do verbo causar", "O verbo degredar com complemento oblíquo" – e do léxico – "Os verbos arder e queimar", "Despegar e desapegar", "A regência do verbo equiparar", 'A expressão «baia de estacionamento'" e "'Andar à pergunta' (regionalismo)".

3. A propósito da proibição de certas palavras na linguagem da nova administração dos EUA, divulga-se com a devida vénia, em Controvérsias, uma entrevista com a linguista Margarita Correia, professora na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, peça que integrou em 05/03/2025 o número comemorativo do 35.º aniversário do jornal Público.

4. O que significará "cartar"? Em O Nosso Idioma, o consultor João Nogueira da Costa comenta em apontamento esta deturpação de acartar, uma variante popular de acarretar.

5. Quanto aos vídeos do Ciberdúvidas, fala-se do uso de «ter de» e «ter» em Ciberdúvidas Vai às Escolas (21.º episódio, com a participação do Agrupamento de Escolas de Alfornelos, no concelho da Amadora) e indica-se o uso correto de obrigada em Ciberdúvidas Responde (26.º episódio).

6. Um registo do mundo da educação, com interesse para o ensino do Português nas escolas de Portugal: os alunos do 1.º ciclo da escolaridade obrigatória vão poder manter os respetivos manuais escolares (pormenores no jornal Público, em 11/03/2025).

7. Quanto aos temas de dois dos programas que a rádio pública de Portugal dedica à língua portuguesa:

– Em Língua de Todos, difundido na RDP África, na sexta-feira, 14/03/2025 às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), Vanessa Gomes Teixeira Anachoreta apresenta o livro Desafios e Descobertas: Perspetivas do Português como Língua Não Materna, lançado em 2024 pelo Centro de Linguística da Universidade do Porto.

– Em Páginas de Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 16/03/2025, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 29/03/2025, às 15h30*), evoca-se a figura do destacado professor e linguista Luís Filipe Lindley Cintra (1925-1991). Conta ainda com a participação da professora Carla Marques, que discorre sobre o sentido de um provérbio popular: «julho debulhar, agosto, engavelar».

Hora oficial de Portugal continental.

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1. Portugal enfrenta, uma vez mais, uma crise política que pode conduzir a um novo cenário de eleições legislativas. A 11 de março, o governo apresenta à Assembleia da República uma moção de confiança, cuja votação poderá desencadear novas eleições. O substantivo moção, palavra em destaque nesta semana, refere-se a uma «proposta formal apresentada a uma assembleia para que seja discutida e votada»1. Do ponto de vista histórico, a palavra terá entrado no português por via do termo inglês motion, que o herdou do homónimo francês motion. A palavra francesa derivou diretamente do vocábulo latino mōtĭo, ōnis, que descrevia a «ação de mover» ou o «impulso». Terá sido com este último sentido que entrou no inglês, tendo sido usado com o valor de «sugestão, proposta» e, deste modo, ajustada ao contexto político de apresentação de uma proposta a uma assembleia. Com o nome moção, vemos surgir verbos de valoração positiva, como aprovar, viabilizar, ou de valoração negativa, como rejeitar, desaprovar ou chumbar. É também usada frequentemente a estrutura «votar (des)favoravelmente». Uma moção pode ser apresentada pelo governo e tratar-se-á de uma «moção de confiança», que pede à Assembleia da República a aprovação de um voto de confiança; ou pode ser apresentada pelos partidos da oposição, assumindo-se como «moção de censura», um mecanismo de reprovação da ação governamental ou, sendo votada pela maioria, um processo que desencadeia a queda do governo. Deste modo, as palavras confiança e censura colocam-se igualmente no centro da vida política portuguesa, o que leva a consultora Inês Gama a explorar, num apontamento de fundo lexical, a sua história e significado, num dia que pode ditar um recomeço político em Portugal numa altura de densa crise mundial. O resultado da votação da moção de confiança poderá deixar, assim, espaço aberto para uma nova incursão ao campo lexical das eleições.  

 1. Infopédia

2. No Consultório, analisam-se as possibilidade de concordância da locução «poder ser» a par da possibilidade de colocação dos pronomes átonos em frases de natureza optativa. Para além destas áreas, poderão ainda ser consultadas respostas a questões relacionadas com a validação da palavra ticar, com a pronúncia de Hamurabi e com a pontuação a usar após o advérbio eis. Por fim, apresenta-se a análise sintática dos constituintes presente no grupo nominal «o mundo da arte». 

3. A expressão «cair o Carmo e a Trindade» guarda consigo momentos do terramoto que, em 1755, abalou Lisboa, tal como nos explica a consultora Inês Gama na rubrica Desafio Semanal (divulgada no programa Páginas de Português, na Antena 2).

 4. pretérito mais-que-perfeito simples do indicativo é um tempo/modo pouco usado. Mas poderá este facto significar que se trata de uma forma "morta"? É a resposta a esta questão que gera uma controvérsia no âmbito da qual o linguista brasileiro Fernando Pestana procura comprovar, por meio de exemplos, que os usos ainda asseguram a vitalidade do pretérito mais-que-perfeito (apontamento divulgado no mural Língua e Tradição e aqui partilhado com a devida vénia). 

5.  Entre as notícias relacionadas com a língua, destacamos:

– A decisão do governo timorense de aprovar mais de 155 mil dólares para promover língua portuguesa (notícia);

– A decisão do presidente americano Donald Trump de proibir, em textos institucionais, o uso de certas palavras/expressões (como mulher, «saúde mental», inclusão, sexo) ou de determinados termos relacionados com género, diversidade, inclusão e saúde.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Em Lisboa, dois colóquios realizados em 05/03/2025 deram especial projeção à língua portuguesa nas suas mais diversas dimensões. Mencione-se, em primeiro lugar, "Da minha língua vê-se o mundo", uma iniciativa do jornal Público para assinalar o seu 35.º aniversário, pretexto para uma jornada presencial que juntou jornalistas, académicos, escritores e artistas. A efeméride motivou igualmente numerosos artigos e apontamentos, por um lado, salientando a importância da unidade da língua tanto na cultura como noutras atividades e, por outro, atualizando ou retomando dados relativos à difusão do português no mundo, sem esquecer o seu ensino a imigrantes e em regiões vizinhas de Portugal, como é o caso da Galiza e da Estremadura espanhola. Quanto ao segundo evento, trata-se do colóquio e da exposição Lindley Cintra. 100 Anos, homenagem da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL) à obra e à figura de Luís Filipe Lindley Cintra (1925-1991). O encontro, que reuniu especialistas da linguística e da filologia, sublinhou o trabalho pioneiro de Lindley Cintra e a atualidade do seu legado como investigador, pedagogo e cidadão. É de realçar o contributo de Lindley Cintra para os estudos de variação linguística (além de filólogo, teve ação decisiva nos estudos de dialetologia em Portugal) e, ao mesmo tempo, para a promoção da unidade do português, como é exemplo da conhecida Nova Gramática do Português Contemporâneo, que Ivo Castro, professor emérito da Universidade de Lisboa, considera ser uma «aquisição perene» do grande mestre (cf. artigo no Público, em 02/03/2025, associado ao aniversário deste jornal). Estes dois eventos lisboetas serão sinal de novo ciclo de preocupação mais intensa com a língua portuguesa? Que o seu valor é também económico e geopolítico, é sabido, como recorda o balanço feito por Zacarias da Costa, secretário executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, ainda no contexto do 35.º aniversário Público, com a data de 04/03/2025, e transcrito com a devida vénia em Lusofonias.

* Aos dois eventos lisboetas, junte-se uma novidade vinda da Galiza, talvez surpreendente para quem desconhece o interesse que a língua portuguesa merece nesta região, apesar de enormes contrariedades: a reedição da Estilística da Língua Portuguesa, de outro grande linguista, filólogo e crítico literário, Manuel Rodrigues Lapa (1897-1989). É um lançamento da Editora Através, de Santiago de Compostela, que se assinala nas Notícias. Na imagem, capa da 1.ª edição desta obra, publicada em 1945 pela Seara Nova (fonte: Laisnova).

2. «Tinha elegido» ou «tinha eleito»? Os verbos abundantes, ou seja, os verbos que têm dois particípios, podem ser um quebra-cabeças para todos. O gramático brasileiro Fernando Pestana dá conta do "problemão" criado pelas oscilações no uso e na descrição dos duplos particípios num apontamento partilhilhado em O Nosso Idioma. Na mesma rubrica, faz-se a despedida do Carnaval com um texto da professora Carla Marques, para entrar no período tradicionalmente designado por Quaresma.

3.  Os temas da educação abrangem necessariamente questões da aprendizagem das línguas, maternas e não maternas. Na Montra de Livros, apresentam-se as atas da Conferência Internacional de Investigação, Práticas e Contextos em Educação (IPCE), realizada entre 3 e 4 de maio de 2024. Do volume agora publicado, sobressai pelo seu interesse linguístico o estudo intitulado "Aprender na Prática: Português Língua Estrangeira através de Tarefas", de Ana Barbosa e Ka I Leong, que propõe uma abordagem ao ensino de Português como Língua Estrangeira baseada em tarefas.

4. A categoria de aspeto, associada à semântica lexical e frásica, continua a suscitar dúvidas. Por exemplo, que valor aspetual se configura na frase «Frequentemente, dedicamos uma aula à leitura...»? No Consultório, dá-se resposta a esta questão e a mais outras seis, distribuídas por tópicos de semântica lexical, pronúncia e sintaxe (modificador de frase, a colocação pronominal, orações reduzidas e infinitivo passivo).      

5. Dois temas de sintaxe preenchem os dois novos vídeos do Ciberdúvidas: a distinção das funções sintáticas dos pronomes pessoais me e te no 20.º episódio de O Ciberdúvidas Vai às Escolas (com a participação de alunos e professores do Agrupamento de Escolas de Alfornelos, na Amadora); e a inversão do sujeito em frases declarativas no 25.º episódio de Ciberdúvidas Responde.

6. Uma brevíssima observação a propósito de um tema da atualidade: a saúde precária do Papa Francisco. Parece ouvir-se, embora muito esporadicamente, a expressão «Alto Pontífice» em referência ao Papa. Trata-se de um uso estranho e sem justificação, pois a forma correta e de sempre é «Sumo Pontífice».

7. Temas de dois dos programas dedicados à língua portuguesa na rádio pública de Portugal:

– Em Língua de Todos (RDP África, sexta-feira, 07/03/2025, 13h20*; repetido no dia seguinte, c. 09h05*), divulga-se um estudo à volta da forma como tem sido estudada a obra de Fernando Pessoa nas escolas portuguesas;

– Em Páginas de Português (Antena 2, domingo, 09/03/2025, às 12h30*; repetido no sábado seguinte, 15/03/2025, às 15h30*), o volume Desafios e Descobertas: Perspetivas do Português como Língua Não Materna é apresentado pelas suas organizadoras e comenta-se a expressão «cair o Carmo e a Trindade».

 Hora oficial de Portugal continental.

8. Finalmente, é de lembrar que no dia 8 de março se festeja mais um Dia Internacional da Mulher. Convém, portanto, registar a decisão do jornal desportivo A Bola de passar a empregar as formas do género feminino média e avançada para as posições em campo, no futebol feminino. Relativamente a este tema, sugere-se a leitura dos seguintes conteúdos em arquivo: "O feminino de guarda-noturno", "O feminino de palhaço", "Feminino de piloto aviador", "Juíza + a aprendiza", "Capataz ou capataza?", "Ainda o feminino de capitão", "Feminino de escanção", "Qual o feminino de bombeiro?", "A tropa no feminino", "O feminino de gramático", "O feminino de músico", "Político-mulher", "Palavras à procura de feminino", "As mulheres e o nome das atividades que exercem".

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Nos noticiários e nos programas televisivos de Portugal, a atualidade internacional leva a reativar nomes comuns e próprios que andavam esquecidos, sem projeção mediática. Outras vezes, põe em circulação neologismos, por empréstimo ou de formação potencial, à espera da primeira oportunidade para se fazerem ler e ouvir. O primeiro caso é ilustrado pelas notícias sobre as eleições federais na Alemanha em 23/02/2025, que deu a vitória aos partidos da CDU/CSU* mas confirmou a AfD*, como segunda força política – e até primeira em estados como o da Turíngia. Sobre o nome Turíngia, convém dizer que, apesar de este corónimo (nome de região) se dever a uma antiga etnia germânica, os Turingos (ou Turíngios), a pronúncia correta deste estado alemão é "turínjia", com o som "j" de Japão, e nunca "Turínguia"; e note-se que o atual gentílico dos naturais ou habitantes da região é turíngios. Falou-se também do estado da Baviera, por vezes mencionada como Bavária, o que não está errado, pois, na verdade, é esta uma forma vernácula, entretanto suplantada por Baviera, que o francês motivou mas que se utiliza hoje sem erro (ver Vocabulário da Língua Portuguesa, 1966, de Rebelo Gonçalves). Quanto a neologismos, regista-se trumposfera (NOW, 26/01/2025*), aportuguesamento do inglês Trumposphere, termo referente ao meio envolvente, político, financeiro e mediático, do atual presidente dos EUA, Donald Trump. A palavra inglesa, que terá sido cunhada há alguns anos, no período do primeiro mandato de Trump, tem sido adaptada por outros idiomas (p. ex., o francês trumposphere), nos quais, incluindo o português, já era produtivo um elemento morfológico com origem no latim sphaera, «bola», e recorrente na linguagem científica (atmosfera, biosfera, estratosfera, troposfera – cf. Dicionário Houaiss). E, como acontece noutras línguas, o morfema -sfera tem permitido criar novas palavras, com alguma intenção crítica e maior ou menor fortuna no uso: blogosfera, anglosfera, machosfera, androsfera, infosfera, entre outras.

* CDU é a sigla alemã da Christlich Demokratische Union Deutschlands («União Democrata-Cristã da Alemanha») e CSU, de Christlich-Soziale Union in Bayern («União Democrata-Cristã da Baviera»). AfD é a sigla de Alternative für Deutschland («Alternativa para a Alemanha»). Na imagem, atuação de músicos nos festejos do Carnaval de Colónia, na Alemanha (fonte: Wikipédia, 2006).

** Junta-se o registo deste uso de trumposfera (ao contrário do inglês não se mantém a maiúscula do nome próprio que é base da derivação deste termo):

 2. Noutro canal de televisão português, trocou-se erroneamente preciosismo por preciosidade, confusão que dá o mote para um apontamento do consultor Paulo J. S. Barata, recordando, na rubrica Pelourinho, que o preciosismo se caracteriza «pela afetação e requinte no falar e no escrever, à maneira do que era uso, em França, no século XVII».

3. Nos projetos em vídeo do Ciberdúvidas, dois tópicos são tratados: em Ciberdúvidas Vai às Escolas (episódio 19), refere-se a neutralização da distinção entre os fonemas /b/ e /v/, a chamada troca dos vês pelos bês (betacismo), típica do português da metade setentrional de Portugal (agradece-se a participação do Agrupamento de Escolas de Alfornelos, no concelho da Amadora); e, em Ciberdúvidas Responde (episódio 24), a consultora Edite Prada dá indicações sobre o uso correto da construção impessoal «trata-se».

4. Os estudos de onomástica e, no seu âmbito, os de toponímia definem uma área da linguística com uma forte componente extralinguística, que lança mão de muitos dados da história e da geografia, para não falar de outros domínios. No Consultório, comenta-se a origem de três topónimos do norte de Portugal, dois no concelho de Paços de Ferreira (Caçães e ) e outro, Perafita, que é recorrente em diferentes concelhos. A atualização inclui ainda questões sobre o uso do pronome lhe  e a sintaxe de três verbos:  raiar («essas atitudes raiam o excesso»), submeter («... submetendo-os a uma regra») e passar («queria passar a tarde a ver filmes»).

5. Tradicionalmente, celebra-se por estes dias o Carnaval, a que se segue o período da Quaresma. Em O Nosso Idioma, a consultora Inês Gama propõe uma reflexão sobre o campo lexical da palavra Carnaval e outras tantas que gravitam em seu torno.

6. Entre conteúdos publicados nos media, com incidência no ensino da língua portuguesa, materna e não materna, relevo para "A leitura e a escrita precisam de mais espaço nas aulas de Português", um trabalho da jornalista Cristiana Faria Moreira (Público, 26/02/2025) e "Alunos de Língua Portuguesa Não Materna: Entre dois mundos, entre duas línguas", da professora Carmo Machado (Visão, 21/02/2025).

7. Referência a dois dos programas que, na rádio pública de Portugal, são dedicados a temas da língua portuguesa.

– Para falar sobre o projeto que a Escola Superior de Educação de Coimbra desenvolve em Cabo Verde para promoção da leitura, entrevista-se Sofia Gonçalves, em Língua de Todos (RDP África, sexta-feira, 28/02/2025, às 13h20*; repetido no dia seguinte, c. 09h05*).

– Em Páginas de Português (Antena 2, domingo, 02/03/2025, às 12h30*; repetido no sábado seguinte, 08/03/2025, às 15h30*), a investigadora Andressa Jove Godoy apresenta o seu estudo sobre como era Fernando Pessoa ensinado e retratado nos manuais escolares durante o Estado Novo. Ainda o apontamento gramatical da professora Carla Marques, esta semana sobre verbos relacionados com a palavra Carnaval.

Hora oficial de Portugal continental.

8. Como em 4 de março de 2025 se festeja o Carnaval, não haverá atualização destas páginas nesse dia. Contudo, a atividade habitual é retomada logo depois, na sexta-feira, 7 de março. Entretanto, ficam três provérbios alusivos a esta época do ano, também designada pelo vocábulo Entrudo, de tradição mais rural: «Entrudo bolorento, Páscoa com bom tempo», «Entrudo papa tudo» e «Não há Entrudo sem Lua Nova, nem Páscoa sem Lua Cheia» (retirados do Livro dos Provérbios Portugueses, de José Ricardo Marques da Costa).

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A recente aproximação entre Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, e Vladimir Putin, presidente russo, colocou a Ucrânia numa difícil situação negocial, no momento em que assinala três anos da guerra com a Rússia. As intermitências de um dos seus mais importantes aliados, resultado da reviravolta da política norte-americana, motiva o uso da expressão «aliado hostil». Trata-se de uma construção antitética, própria do universo poético, mas que, desta feita, descreve uma situação real ao associar uma palavra de orientação positiva a uma de orientação negativa: aliado é um nome que refere «aquele que se liga a outro, para defender a mesma causa ou atacar o mesmo inimigo»; hostil significa «que se opõe a; adversário» (Houaiss). O sintagma ilustra bem a oscilação das posições do líder norte-americano e justifica a estupefação ucraniana perante a instabilidade que singra. Sob outra perspetiva, o facto de os Estados Unidos terem passado a referir-se à guerra como um conflito, tendo deixado de considerar a Rússia como invasor e tendo transferido o epiteto de ditador de Putin para Volodymyr Zelensky, mostra bem como a língua não é neutra e como pode denunciar as perspetivas e intenções de quem a usa. A evolução da situação política conduziu também a que se pusesse em cima da mesa a possibilidade de um acordo entre o Estados Unidos e a Ucrânia, ativando, neste contexto, o uso de «terras raras». O termo pertence à área da química e aplica-se ao conjunto dos elementos que integram determinados solos, marcados por uma presença relativamente alta de determinados minerais, como o titânio ou o urânio, os quais são essenciais para a indústria aeronáutica, espacial e de defesa (cf. Houaiss e Wikipédia). As terras raras são ainda usadas no fabrico de discos rígidos e de ecrãs de telemóveis, por exemplo. A comunicação social tem grafado a expressão ora com hífen ora sem hífen, uma indefinição que se deverá ao reduzido uso desta construção. Relativamente à sua grafia, poderemos referir que, no português do Brasil, se tem adotado dominantemente o uso do hífen, tal como está previsto no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras. Já no português europeu, tem-se verificado, como dissemos, alguma hesitação. Todavia, poderemos esclarecer que alguns dicionários de referência (como Priberam ou o Dicionário da Língua Portuguesa) integram o termo na entrada terra, registando-o sem hífen. Os textos científicos da área também parecem ter preferência por esta grafia. Desta forma, será de deixar a nota de que a variante europeia parece tender para a interpretação de «terras raras» como um sintagma, escrevendo-o portanto com duas palavras isoladas, sem hífen. 

2.  Na atualização do Consultório, deixamos como proposta de tradução da palavra inglesa transgenderism (derivada do nome transgender) o termo transgenerismo. No âmbito da tradução situa-se igualmente a resposta que apresenta a forma portuguesa equivalente ao termo francês chocolat au lait. Para além deste tema, encontramos ainda respostas relacionadas com questões sintático-semânticas: o modo da oração subordinada completiva de verbos como achar ou acreditar; a classificação de uma oração reduzida de particípio; a natureza sintática de um aposto após um adjetivo. Terminamos com a explicação de termos associados à classificação da origem etimológica da palavras no dicionário. 

3. A classificação das palavras quanto à acentuação e ao número de sílabas por vezes acarreta dificuldades, sobretudo quando se verifica a hesitação na interpretação entre a presença de um hiato ou de um ditongo. A professora Carla Marques exemplifica o caso com recurso à análise do nome próprio Sofia, na rubrica divulgada no programa Páginas de Português, na Antena 2

4. Na sua senda pela discussão em torno do conceito de norma culta, o gramático e professor brasileiro Fernando Pestana analisa um conjunto de usos presentes em jornais brasileiros para evidenciar os desvios e discutir a ideia de que o discurso jornalístico é fonte de norma. 

5. Entre os eventos dignos de realce, destacamos:

– Congresso Internacional Português Língua de Ciência e de Oportunidade, organizado pelo Centro de Linguística da Universidade do Porto, no dia 27 de fevereiro, a partir das 11h (evento online);

– Conferência "Alguns desafios globais dos sistemas educativos", dinamizada pelo professor universitário João Costa, diretor da Agência Europeia para as Necessidades Especiais e Educação Inclusiva , com lugar no dia 28 de fevereiro, pelas 15h, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto (mais informações); 

– O lançamento do livro Diálogos com Lídia Jorge, da autoria de Carlos Reis, no dia 26 de fevereiro, na Livraria Buchholz, às 18h30, no decurso do qual decorrerá uma conversa entre o professor universitário e a escritora portuguesa Lídia Jorge. 

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1. A toponímia, entendida no seu duplo sentido, de «conjunto dos nomes que identificam lugares habitados e não habitados» e «estudo dos nomes de lugar», é uma área linguística imediatamente exposta a vicissitudes extralinguísticas. É verdade que muitos nomes de lugar são criações primordiais e anónimas, mas outros nomes, em épocas já documentadas, têm resultado do arbítrio dos poderosos e são arma política – basta lembrar o caso das Malvinas vs. Falkland. A atribuição de nome por decreto a uma cidade ou a um monte, frequentemente rasurando por completo o mais antigo, é, pois, prática frequente e ganhou novo relevo, quando, como foi aqui referido, o atual presidente dos EUA, Donald Trump, deu ordem para, no uso oficial, substituir a expressão inglesa Gulf of Mexico (Golfo do México) por Gulf of America (Golfo da América). No Alasca, a montanha mais alta dos Estados Unidos passa agora a ser apenas conhecida oficialmente como Mount McKinley, descartando-se o nome ameríndio Denali; mas a voluntariosa fixação toponímica em curso nos EUA não afeta (por enquanto) o português, língua em que continuam válidos o talassónimo Golfo do México e o orónimo Monte Denali, a par de Monte McKinley. Entretanto, assinale-se que a iniciativa de Trump é inspiradora, e o político republicano Buddy White, no contexto do interesse presidencial publicamente manifestado pela anexação da Gronelândia*, propõe que se renomeie este território como Red, White and Blueland, ou seja, «Terra Vermelha, Branca e Azul», em alusão às cores da bandeira norte-americana. Na rubrica Controvérsias, disponibiliza-se a tradução de um comentário do linguista Evgeny Shokhenmayer (blogue e-Onomastics, 15/02/2025), que, a respeito desta proposta, antevê um choque entre os interesses norte-americanos e a história dos gronelandeses.

Sobre a mudança toponímica operada por decreto, leia-se "Golfo da América", um artigo de opinião do historiador João Pedro Marques (Observador, 27/01/2025). Relativamente a questões linguísticas e extralinguísticas no estudo da toponímia, sugere-se ainda a consulta de respostas e artigos do arquivo do Ciberdúvidas: "Topónimo",  "Os nomes e marcas históricas da toponímia portuguesa", "A falta de padronização da toponímia em português",  "Querem mudar os nomes das ruas e largos? Ora tentem lá outra vez", "Toponímia angolana só em língua portuguesa". Sobre Gronelândia, ver aqui. Na imagem, vista da capital gronelandesa, Nuuk, e do monte Sermitsiaq (crédito: Wikipédia).

2. A toponímia, como outras áreas de atividade linguística, levanta questões normativas nada despiciendas. Sobretudo quando o debate das fontes da norma-padrão e da sua definição tem sempre relevância no mundo de língua portuguesa, caracterizado pela sua dispersão geográfica e pela força centrífuga decorrente. Na Montra de Livros, apresenta-se o número 68 de Confluência (publicação do Instituto de Língua Portuguesa do Liceu Literário Português do Rio de Janeiro), no qual se reúnem trabalhos acerca de duas normas-padrão do português, a europeia e a brasileira, e as tensões entre estas e os usos linguísticos dos seus falantes.

3. A categoria de aspeto continua a motivar dúvidas, como é o caso de uma pergunta sobre a situação aspetual configurada pela frase «A dignidade não está naquilo que temos, mas na forma como fazemos aquilo que nos cabe». A resposta faz parte do conjunto de cinco respostas que atualizam o Consultório e abrangem outros tópicos, a saber: duas interjeições medievais; a regência de reduzir; o nome musicista; e a expressão «mil reais».

4. Para Alfredo Cameirão, presidente da Associação da Língua e Cultura Mirandesa, a língua mirandesa «devia ser ensinada na escola com a mesma dignidade com que são ensinadas as outras línguas». São declarações que preenchem uma entrevista publicada na revista digital Comunidade, Cultura e Arte (16/02/2025) e que se transcreve com a devida vénia em Diversidades.

5. Tópicos dos projetos em vídeo do Ciberdúvidas: em Ciberdúvidas Responde (episódio 23), esclarece-se a diferença entre emigrante e imigrante; e em O Ciberdúvidas Vai às Escolas (episódio 18), comenta-se a origem da palavra trabalho (com professoras e alunos do 9.º ano do Agrupamento de Escolas de Alfornelos, no concelho da Amadora, a quem muito se agradece a participação).

6. Registe-se a realização, em 5 de março, na Faculdade de Letras de Lisboa, do colóquio Lindley Cintra. 100 anos, uma homenagem à obra e à figura de Luís Filipe Lindley Cintra, iminente filólogo, linguista e coautor da conhecida Nova Gramática do Português Contemporâneo (Edições João Sá da Costa, 1984). Na mesma data, a conferência internacional Da Minha Janela Vê-se o Mundo, promovido pelo jornal Público para assinalar o 50.º aniversário da independência dos países africanos de língua oficial portuguesa e os 500 do nascimento de Camões.

7. Relativamente a programas que versam sobre temas e tópicos do português na rádio pública de Portugal:

– Em Língua de Todos, programa difundido pela RDP África, na sexta-feira, 21/02/2025, às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), Regina Duarte, comissária do Plano Nacional de Leitura (PNL), apresenta os projetos que esta entidade desenvolve com os países africanos de língua oficial portuguesa.

– Também em Páginas de Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 23/02/2025, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 01/03/2025, às 15h30*), Regina Duarte discute os projetos do PNL para 2025. O programa incluiu um apontamento gramatical da consultora do Ciberdúvidas Carla Marques.

* Hora oficial de Portugal continental.

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1. A presença nos usos quotidianos de construções como «Mãe, posso água?» tem estado no centro das atenções em Portugal, como se conclui pela reportagem divulgada pela CNN Portugal. As estruturas em questão, associadas sobretudo ao universo linguístico infantil, ocorrem em casos de complexo verbal formado pelo verbo auxiliar poder seguido de um qualquer verbo principal, o qual é elidido. A recuperação inferencial do verbo por parte do interlocutor fica, assim, dependente do contexto. Por exemplo, uma criança, dirigindo-se à mãe, aponta para uma fatia de pão e verbaliza «Posso pão?», deixando à progenitora a tarefa de recuperar o verbo comer. O fenómeno conta já com vários registos por todo o país e tem deixado pais e professores preocupados. A situação abre a possibilidade de nos encontrarmos perante uma mudança em curso. A este propósito, importa ter presente que a língua não é estática e que as alterações, entre as quais as sintáticas, ocorrem na história da evolução do português. A título de exemplo, recordemos que, entre os séculos XIII e XIV, a colocação dos clíticos em frases afirmativas ocorria tanto em posição pré-verbal como pós-verbal. Veja-se como era correta a frase, hoje inaceitável em português europeu, «E a donzela lhe disse entom (...)»* (Primeiro Livro de Linhagens, Piel e Mattoso, 1980, 28). Não esqueçamos, todavia, que os processos de evolução necessitam, antes de mais, de tempo para se fixarem na língua e para se alargarem a vários segmentos da sociedade. Nenhuma destas premissas se verifica neste momento pelo que é ainda muito cedo para falar em mudança linguística. Poderemos, sim, considerar que o fenómeno de elipse presente nas construções infantis resulta de um processo de economia linguística e que as razões que o explicam não serão alheias ao facto de estarmos perante estruturas produzidas por crianças em estado de aprendizagem e alargamento do conhecimento sintático (e não só) da língua. Falar em mudança é, assim, extemporâneo. 

*O estudo e exemplos estão presentes em Ana Maria Martins, "Mudança sintática e história da língua portuguesa", In B. Head et al. (eds.). História da Língua e História da Gramática: Actas do Encontro. Univ.do Minho, 2002, pp. 251-297)  

2. É também a defesa da língua portuguesa que move a professora e antiga consultora do Ciberdúvidas Maria Regina Rocha. Constatando a presença cada vez mais generalizada da língua inglesa, sobretudo nos meios de comunicação social, a autora recorda títulos de programas e de rubricas, designações de cadeias de televisão e muitas opções que poderiam passar ao lado do recurso aos anglicismos (artigo divulgado no jornal Público e aqui partilhado com a devida vénia). A este propósito, registe-se o neologismo inglês entrado no léxico português: looksmaxing, usado para descrever o processo de aperfeiçoar a aparência pessoal. 

3. A presença do português do Brasil nas salas de aula portuguesas e no contexto social em geral tem contribuído para a consciência mais generalizada da existência de diferenças nas regras ortográficas relativamente ao português europeu. O consultor do Ciberdúvidas e gramático Fernando Pestana elaborou uma síntese de diferenças ortográficas entre as duas variantes, que será útil conhecer para compreender a diversidade da língua portuguesa no mundo.

 4. As dúvidas de natureza ortográfica levam, por vezes, os utilizadores da língua a hesitar entre grafias, uma situação que, por vezes, também é contemplada nas próprias análises dos gramáticos. Desta feita, apresentamos uma resposta que considera os casos das grafia de Cingapura / Singapura e beringela / berinjela. Ficam ainda disponíveis respostas para as seguintes questões: «Estão incompletas as aceções do termo nabo em alguns dicionários?», «O nome retrato pode ser acompanhado tanto de complemento como de modificador?», «A palavra impacto pode ser usada com particípio do verbo impactar?», «Papel rima com chapéu no português do Brasil?», «Qual a concordância possível em orações com quem?», «Os termos tanto e quanto integram sempre uma construção aditiva?» 

5. Qual a forma correta: abaixo-assinado ou «abaixo assinado»? E em que contextos se poderá usar a expressão? Estas questões estão na base do apontamento da consultora Inês Gama para o programa Páginas de Português na Antena 2.

6. Destacamos os seguintes eventos:

– Em Portugal, o primeiro laboratório de visualização imersiva de arquivos históricos nacionais, um projeto conduzido pelo ISCTE, que pretende digitalizar e disponibilizar ao público arquivos de organizações como o Instituto da Mobilidade e Transportes, o Ministério da Defesa Nacional e do projeto Ephemera, de José Pacheco Pereira (notícia);

– A comunicação de Fabrizio Boscaglia intitulada Fernando Pessoa, Omar Khayyam e o Orientalismo em língua inglesa, no âmbito do seminário Fernando Pessoa e a Cultura Inglesa, com lugar na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, no dia 18 de fevereiro, entre as 15h e as 16h (também disponível em direto no canal Youtube).

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1. 14 de fevereiro é Dia de S. Valentim, ou Dia dos Namorados, uma celebração de origem anglo-saxónica que também se naturalizou em grande parte do mundo de língua portuguesa. Sobre como S. Valentim se tornou o padroeiro dos namorados, lê-se na Infopédia que a festa cristã se sobrepôs «ao festival pagão de Juno Februata, celebrado no dia seguinte, [e à] tradição de tirar os nomes dos namorados à sorte», o que «foi reforçado pela crença medieval de que os pássaros começavam a acasalar na festividade do santo». Se os amores se querem felizes, a verdade é que a literatura e a criação artística em geral têm especial predileção por associá-los à melancolia e à infelicidade. É o caso de Verdes Anos (na imagem ao lado*), um filme de 1963 realizado por Paulo Rocha, que vem à colação, porque o tema musical é da autoria de Carlos Paredes (1925-2004), cujo centenário se comemora em 16 de fevereiro de 2025. Paredes é um dos grandes vultos da música de Portugal, tendo sabido tirar partido do potencial de um instrumento tradicionalmente ligado ao fado: a guitarra portuguesa. Sem mencionar as diferenças que os instrumentos identificados pelo nome guitarra podem apresentar entre si e em relação a outros designados por viola e violão (cf. "Guitarra vs. viola), refira-se que é palavra de origem grega mas, ao que parece, transmitida pelo aramaico e depois pelo árabe às línguas latinas da Península Ibérica, de acordo com um esquema que se pode encontrar na entrada castelhana guitarra do dicionário da Real Academia Espanhola e que é também válido para o português: grego κιθάρα/kithára («cítara») > aramaico qiṯārā > ár. qīṯārah. Um bom exemplo, portanto, de como a história de uma palavra reflete simultaneamente o encontro de povos e a afirmação cultural de cada um deles.

* Na imagem, capa de Guitarradas Sob o Tema do Filme "Verdes Anos" (1963), de Carlos Paredes e Fernando Alvim (crédito: "Os Verdes Anos" in Memoriale Cinema Português, de Jorge Leitão Ramos). Para aprofundar a compreensão deste filme, leia-se o documento Os Verdes Anos, de Filipa Rosário, o qual faz parte da Coleção de Dossiês Pedagógicos do Plano Nacional de Cinema (PNC). Para ouvir a célebre peça musical, executada por Carlos Paredes, escutar aqui e, com poema de Pedro Támen, na voz de Teresa Paulo Brito, ouvir aqui. Finalmente, sobre a adequação dos termos guitarra e cítara para referir o instrumento musical, ler "Guitarra portuguesa: a história, a construção, a importância e o futuro", in Nascer do Sol (12/02/2025).

2. Na Montra de Livros, o tema é também o da diversidade: apresenta-se o número 2, volume 13, da revista elingUP (Universidade do Porto), que reúne textos da área da linguística computacional, tradução e variedades linguísticas.

3. «Os pronomes estão mesmo pelas ruas da amargura...», diz a escritora e editora Maria do Rosário Pedreira num texto que se divulga no Pelourinho, rubrica que inclui ainda um apontamento do consultor Carlos Rocha à volta de dois lapsos vocabulares nos noticiários de um canal de notícias português.

4. «São um perigo/ as palavras», lê-se num poema de Alice Vieira, extraído de O que dói às Aves e agora acessível na rubrica Antologia.

5. Os particípios passados do verbo secar, o significado do termo gramatical antecedente, a expressão «ir a penantes», o nome Caio, a análise de «viagem de avião» e um complemento oblíquo que inclui uma oração constituem os tópicos do conjunto de seis perguntas que atualizam o Consultório.

6. Quanto aos vídeos do Ciberdúvidas, fala-se da colocação do pronome pessoal átono em «vou-vos contar», em Ciberdúvidas Responde (episódio 17) e do uso de meia na expressão das horas, em Ciberdúvidas Vai às Escolas (episódio 22).

7. Outros tópicos relacionados com temas da língua:

– as notícias do jornal espanhol El Mundo e outras publicações, segundo as quais 55 universidades de Espanha adotaram um guia politicamente correto para usos linguísticos não binários;

– um estudo de 2018, relativo ao português como língua de herança: Maíra Candian, "Memória fonológica de falantes de português brasileiro como língua de herança" (Domínios de Lingu@gem, EDUFU – Editora da Universidade Federal de Uberlândia);

– o anúncio da realização do congresso internacional "O Português no Mundo: Unidade, Diversidade e Diálogos Culturais no Países Lusófonos", em 21 e 22/05/2025, na Faculdade de Ciências da Linguagem, Comunicação e Artes (Universidade Pedagógica), em Maputo.

8. Conteúdos de dois dos programas que a rádio pública de Portugal dedica à língua portuguesa:

– Em Língua de Todos, difundido pela RDP África, na sexta-feira, 14/02/2025, às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), a professora Rute Perdigão (Escola de Educação do Instituto Piaget) aborda a importância da imersão, da transversalidade e da diversidade linguística na formação de professores;

João Pedro Aido, presidente da Associação de Professores de Português, comenta o recentemente publicado relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) em Páginas de Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 16/02/2025, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 22/02/2025, às 15h30*). Inclui-se ainda um apontamento gramatical da consultora Inês Gama sobre a utilização do hífen em abaixo-assinado.

* Hora oficial de Portugal continental.