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Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Por proclamação da 40.ª sessão da Conferência Geral da UNESCO em 2019, festeja-se a 5 de maio o Dia Mundial da Língua Portuguesa. Recorde-se que a data já fora oficialmente estabelecida em 2009 pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), com o intuito de celebrar a língua portuguesa como traço identitário comum a vários países e culturas. Em Portugal, contam-se em 2025 diferentes iniciativas que visam dar visibilidade à efeméride, muito embora a situação política interna e externa pareça suscetível de roubar a exuberância dos eventos oficiais de anos anteriores. Em todo em caso, no contexto da constante tensão entre «forças de união» e «forças de separação» (expressões do filólogo e linguista Ivo Castro) em que vive a língua portuguesa, tensão que se faz também sentir noutras línguas pluricêntricas, o dia 5 de maio oferece mais um momento para avaliar o estado do idioma. Nesse sentido, divulga-se em O Nosso Idioma um texto do gramático brasileiro Fernando Pestana, que compara uma frase com traços típicos do português europeu com a sua variante brasileira. Sustentando que o português mantém a sua unidade fundamental, Fernando Pestana argumenta que, do ponto de vista do conceito de língua, o sistema linguístico é o mesmo em Portugal, no Brasil, em Angola ou qualquer outro país da CPLP, porque o sistema, «vasto, flexível, pleno de possibilidades», permite escolhas, isto é, dentro daquilo que se pode denominar estilo, «que varia conforme o lugar, o tempo, a intenção, a identidade de quem fala».

Na imagem, aspeto do cartaz com que a Rede de Bibliotecas Escolares (Ministério da Educação, Ciência e Inovação, Portugal) assinala em 2025 o Dia Mundial da Língua Portuguesa

2. A projeção internacional da  língua portuguesa passa pelo seu ensino como língua estrangeira. Na Montra de Livros, apresenta-se um recurso que possibilita uma programação mais rigorosa da aprendizagem do léxico no âmbito de cursos e atividades em Português como Língua Estrangeira (PLE): RefLex. Referencial Lexical para o Português Língua Estrangeira: um Recurso para Professores e Investigadores de PLE/L2 (Universidade do Porto, 2024).

3. Nas muitas palavras dos comentários televisivos à volta do falecimento, velório e funeral do Papa Francisco, detetam-se erros e usos duvidosos. No Pelourinho, o consultor Carlos Rocha aponta três casos.

4. O apagão que afetou Portugal (ver Abertura de 29/04) levou muitos portugueses a procurarem algum forma de acesso a notícias, razão por que se redescobriu um velho equipamento: o rádio que funciona com pilhas ou mais simplesmente «o rádio a pilhas» – ou «rádio de pilhas»? A pergunta é feita no Consultório, onde se incluem seis novas respostas, abrangendo outros tópicos relativos ao léxico – «máquina de rastos», «ala-arriba» –, à coesão frásica e textual – «com efeito» vs. «de facto» – e às relações entre sintaxe e semântica – o uso escrito de ou e a preposição para a introduzir uma oração consecutiva.

5. Nos projetos em vídeo do Ciberdúvidas abordam-se as seguintes questões: as grafias porque, porquê e «por que» no 27.º episódio de Ciberdúvidas Vai às Escolas (participação de alunos e professores do Instituto Politécnico de Lisboa); e o uso correto de «mais bem» em Ciberdúvidas Responde (episódio 32).

6. Registo de textos da atualidade, com interesse para questionar tendências e inovações linguísticas e culturais: o termo humanicídio incluído no artigo de opinião intitulado "O humanicídio de Gaza: extermínio, impunidade, negação do indivíduo e da humanidade" e assinado pelos políticos e académicos Cláudia Santos, Fernando Rosas e Manuel Loff (Público, 23/04/2025); à volta da imigração brasileira em Portugal e da expressão jocosa "Guiana brasileira", cabe mencionar "Guiana Brasileira” e memes como marcadores de identidade coletiva", da investigadora Ionara Silva (Público Brasil, 28/04/2025); a respeito da tendência de escrever sem maiúsculas, identificada recentemente entre os jovens, que fazem alguma tábua-rasa da própria pontuação, leia-se a crónica "A pontuação é uma arma", do escritor Miguel Esteves Cardoso (Público, 29/04/2025);

7. Relativamente a dois dos programas que a rádio pública de Portugal dedica à língua portuguesa, são temas de entrevista:

– A irofessoa Sandra Duarte Tavares fala sobre o significado de comunicação assertiva e a função do pleonasmo num texto literário em Língua de Todos (RDP África, sexta-feira, 02/05/2025, 13h20*; repetição no dia seguinte, depois do noticiário das 09h00*).

– Em Páginas de Português (Antena 2, domingo, 04/05/2025, 12h30*; com em 10/05/2025, 15h30*), entrevista-se a professora e linguista Edleise Mendes, da Universidade Federal da Bahia quanto aos desafios que se apresentam hoje a quem ensina a língua portuguesa, designadamente, no concernente à utilização da Inteligência Artificial e das novas tecnologias no processo de aprendizagem. O programa conta ainda um apontamento gramatical da professora Carla Marques sobre a função sintática do se na frase «ouviram-se os jovens».
 
* Hora oficial de Portugal continental.

 

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1. Portugal viveu no dia 28 de abril uma situação de apagão generalizado, que se estendeu a toda a Península Ibérica. Às 11h30 (hora de Lisboa), todo o sistema elétrico deixou de funcionar, gerando o caos nos transportes, nos aeroportos e colocando em risco o sistema de saúde. Anunciou-se que o abastecimento de água poderia não estar assegurado e que a reposição do sistema elétrico poderia demorar. O medo da escassez de alimentos gerou as reações mais intempestivas, levando a que nos supermercados se esgotassem os bens alimentares enlatados, papel higiénico e água engarrafada. Felizmente, o abastecimento de eletricidade foi sendo reposto gradualmente e o dia 29 já amanheceu com a promessa de regresso à normalidade. Neste evento sem precedentes, a palavra em destaque foi apagão, um termo que merece duas reflexões no plano linguístico. Por um lado, a análise feita ao léxico mobilizado na comunicação social vem mostrar que o lexema português substituiu definitivamente (pelo menos neste caso) os termos ingleses com os quais competia – blackout e shutdown. Por outro lado, importa compreender a origem e semântica da palavra apagão. Esta deriva, segundo o Dicionário Houaiss, do espanhol apagón, formado a partir da base verbal apag(ar), a que se junta o sufixo -ón (-ão, em português), que expressa o resultado de uma ação, presente em nomes como apertão, arrastão ou esticão, por exemplo. Assim, ao contrário do que poderia parecer, a palavra apagão não corresponde ao grau aumentativo de um nome cujo grau normal teria uma forma como *apaga (que não existe). Trata-se, sim, de um nome deverbal que pode ser usado coloquialmente para referir a suspensão temporária de um dado serviço (informático, de telecomunicações...) ou também a perda temporária de memória ou de consciência (Infopédia). Este acontecimento veio demonstrar a importância da rede elétrica para o estilo de vida moderno, no qual grande parte das atividades desenvolvidas e serviços disponíveis dependem da existência de eletricidade. 

2.  No Vaticano, o conclave que irá proceder à eleição do novo papa está agendado para o dia 7 de maio e prolongar-se-á até que o novo bispo de Roma tenha sido escolhido pelos seus pares, o que será sinalizado com fumo branco e a tradicional expressão latina «Habemus papam» («temos papa»), que anuncia oficialmente ao mundo católico a eleição do novo papa. Enquanto não chega esse momento, vive-se o tempo de «missas novendiais» (do latim novemdiales), expressão que designa o período de nove dias durante o qual se realizam missas de sufrágio ao papa falecido. Até à chega do novo papa, a Igreja vive o chamado período de «sede vacante» (do latim sedes vacans, "trono vazio"), expressão que designa o intervalo de tempo durante o qual se está sem papa. Nesta época, é tempo ainda de recordar o legado do Papa Francisco, que também deixou marcas na língua, como é o caso da expressão «todos, todos, todos», usada pelo papa na Jornada Mundial da Juventude, em Lisboa, no ano de 2023, para recordar que a Igreja não exclui ninguém. A este propósito, a consultora Inês Gama procede à análise linguística do lexema todos, evidenciando a sua versatilidade, neste apontamento

3. A atualização do consultório integra uma breve exposição dedicada a alguns aspetos etimológicos que podem contribuir para explicar a formação do topónimo Manho (ou Manhos). No plano lexical, reflete-se sobre aspetos relacionados com a «cor de coral» e, no plano sintático, analisa-se a correção da coocorrência dos termos «Ninguém... não» numa frase e a adequação da estrutura «ter dúvidas se». No âmbito do quadro gramatical brasileiro, propõe-se uma análise para o adjetivo na frase «Enamorou-se, jovem, de Gabriela» e esclarece-se sobre como classificar a locução «tão pouco»

4. No âmbito da rubrica dúvida da semana, a professora Carla Marques explica por que razão a construção «*Ele faz o que gosta» está incorreta e analisa possibilidades para a sua correção, num apontamento também divulgado no programa da Antena 2, Páginas de Português. Na mesma linha de correção dos usos, o consultor Paulo J. S. Barata, reflete, num texto divulgado no Pelourinho, sobre qual o termo correto: chicana ou "chincana"?

5. Cotejando o léxico usado no português do Brasil com formas do português europeu, o consultor Fernando Pestana recorda que muitas formas consideradas "brasileirismos" advêm da variedade europeia, um aspeto que por vezes as limitações da memória linguística tendem a encobrir. 

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1. Em Portugal, comemora-se o 25 de Abril de 1974, data que marca a instauração do regime democrático no país, a descolonização e uma aproximação à Europa que culminou em 1986 com a adesão à então chamada Comunidade Económica Europeia, à qual sucedeu em 1993 a União Europeia. Um aniversário é sempre ocasião para balanços e justifica-se recordar o que mais interessa nestas páginas: o impacto linguístico desse acontecimento de há 51 anos, que diz também respeito aos países africanos da Comunidade de Países de Língua Portuguesa e às normas nacionais que neles vão emergindo. Sobre a efeméride, cabe, portanto, sugerir a (re)leitura dos muitos conteúdos aqui disponíveis, referentes aos caminhos percorridos pela nossa língua comum neste meio século: "Palavras que nasceram com a década [1974-1984]"; "O 25 de Abril no léxico português"; "Revolução"; "Ponte 25 de Abril";  "Nos 30 anos do 25 de Abril"; "Palavras do 25 de Abril (1974-2014)"; 47 palavras nos 47 anos do 25 de Abril; "48 expressões e palavras nos 48 anos do 25 de Abril"; "Nomes que avivam memórias, neste outro 25 de Abril: 49 anos de vida e cultura democráticas";  "50 palavras nos 50 anos do 25 de Abril"; "Viva a liberdade!"; "O 25 de Abril e a afirmação da língua portuguesa em África" ; "As palavras e a mudança: do 25 de Abril à era tecnológica, da extensão semântica à eliminação lexical";

Como o 25 de Abril é feriado em Portugal, a próxima atualização fica agendada para 29 de abril. Na imagem, Cravos de Abril, da artista plástica Argentina Alarcão (cf. blogue O Carteiro da Saudade, "Os cravos de abril", 07/03/2019).

2. Entre os temas da atualidade, destaca-se, em 21/04/2025, a morte do Papa Francisco. Sobre o argentino Jorge Mario Bergoglio, nome de batismo do falecido papa, escreve a jornalista Inês Moreira Santos (RTP, 21/04/2025): «Sumo Pontífice desde março de 2013, Francisco iniciou uma nova era no Vaticano, marcada pela simplicidade, a humildade e um percurso de proximidade ao mundo.» Com o desaparecimento de Francisco, cujas exéquias têm lugar em 26 de abril, a comunicação mediática ativa léxico associado ao processo de escolha do novo papa. Salientem-se dois vocábulos: conclave, «reunião do sacro colégio de cardeais, convocado para eleger um novo pontífice» ou «aposento do Vaticano onde se dá tal reunião, a portas cerradas», do latim conclāve, is , na aceção de «toda a parte de uma casa fechada a chave, quarto, alcova» (Dicionário Houaiss); e camarlengo ou camerlengo, «cardeal que preside à Câmara Apostólica, e exerce a autoridade papal num interregno pontifício», termo que adapta o italiano camerlengo, que, por sua vez, tem origem no germânico kamerlinc, «inspetor da câmara» (dicionário da Academia das Ciências de Lisboa). 

Sobre palavras e expressões valorizadas ou criadas pelo Papa Francisco – «Alzheimer espiritual»,  «desertificação espiritual», «economia da exclusão», «globalização da indiferença» ou «revolução da ternura» –, mencione-se Dicionário Bergoglio: as Palavras-Chave de um Pontificado (Farol, 2022), tradução para o português da obra Dizionario Bergoglio: le Parole Chiave di un Pontificato, do filósofo e teólogo catalão Francesc Torralba (mais informação aqui e aqui). Sobre a etimologia de papa, ler aqui.

3. Dois textos entram na rubrica O Nosso Idioma: "Ainda se diz 'uma bica, se faz favor'?", da consultora Inês Gama, que se refere à origem de bica como designação do café servido numa chávena pequena (o também chamado «café expresso»); e "Colocação pronominal: português do Brasil x português europeu", apontamento em que o gramático Fernando Pestana contesta a ideia de a sintaxe pronominal estar claramente diferenciada no Brasil e em Portugal.

4. A Diálogos com Lídia Jorge (Edições Dom Quixote), da autoria de Carlos Reis, professor catedrático emérito da Universidade de Coimbra, a escritora e professora universitária Dora Nunes Gago dedica o apontamento "Da magnífica arte de dialogar ", que se inclui na rubrica Literatura. Trata-se  de «uma publicação essencial, não apenas para alargarmos o nosso conhecimento da obra de Lídia Jorge, mas sobretudo, para nos enriquecermos com a discussão de temas atuais do mundo, da sociedade portuguesa, que nos ajudam a entender o passado e o presente e a equacionarmos o futuro».

5. Na frase «Ela tem olhos brilhantes feito o Rei Sol», reconhece-se um uso de feito que é típico do português do Brasil, conforme se comenta na atualização do Consultório. São ao todo sete novas respostas que abrangem as áreas do léxico – "A expressão 'tomar estado'" e "Unção e ungir" –, da semântica – "O advérbio especificamente" e "Os valores semânticos da preposição com" –, das classes de palavras – "Como, palavra denotativa de explicação (Brasil)" – e da sintaxe – "Concordância entre pessoa e herói".

6. Voltando ao campo literário, assinala-se em 23 de abril o Dia Mundial do Livro e dos Direitos de Autor. É uma celebração proclamada em 1995, na 28.ª Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e inspirada numa tradição catalã segundo a qual os cavaleiros ofereciam às suas damas uma rosa vermelha de São Jorge (Sant Jordi) e, em troca, recebiam um livro como testemunho dos seus atos de bravura (Dia Mundial do Livro e dos Direitos de Autor 2025, Eurocid). Recorde-se que o Rio de Janeiro é, em 2025, a Capital Mundial do Livro, tornando-se assim a primeira cidade de língua portuguesa a receber este título (ibidem).

7. Refiram-se ainda dois dos programas que, na rádio pública de Portugal, divulgam e debatem temas da língua portuguesa:

Língua de Todos, na RDP África, transmitido na sexta-feira, pelas 13h20, e repetido no dia seguinte, depois do noticiário das 09h00);

Páginas de Português, na Antena 2, ao domingo, pelas 12h30, e repetido no sábado seguinte, às 15h30.

*Hora oficial de Portugal continental, ficando depois ambos os programas disponíveis aqui e aqui.

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1. Em Portugal, decorre a interrupção escolar da época da Páscoa, e também as atualizações regulares do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa fazem uma pausa até 21 de abril. Nos próximos dias, suspende-se o acesso ao formulário para envio de questões e não haverá novas respostas no Consultório, mas em 22 de abril retoma-se a atividade normal. Entretanto, continuará disponível a consulta de todos os conteúdos do Ciberdúvidas, os quais contam já com mais de 38 000 respostas, a que se juntam perto de 12 000 artigos sobre diferentes questões da língua portuguesa.

Na imagem, cerejeiras da região do Fundão (Castelo Branco, Portugal). Crédito: Notícias da Covilhã, 08/04/2021.

2. Mesmo assim, novos artigos vão dando entrada nas rubricas Na 1.ª PessoaNotícias e Montra de Livros, e, portanto, assinalam-se em:

O Nosso Idioma: "Provérbio 'Entrudo borralheiro, Páscoa soalheira'" (08/04/2025); "'Chega-m'isso' e sicofantas" (11/04/2025).

Literatura: "Ana Paula Tavares " (08/04/2025).

Pelourinho: "Mais 'mal' desaproveitada?"

3. Recordem-se ainda as emissões de dois dos programas que, na rádio pública de Portugal, são dedicados à divulgação e debate de tópicos do português em toda sua diversidade:

Língua de Todos, na RDP África, transmitido na sexta-feira, pelas 13h20, e repetido no dia seguinte, depois do noticiário das 09h00);

Páginas de Português, na Antena 2, ao domingo, pelas 12h30, e repetido no sábado seguinte, às 15h30.

*Hora oficial de Portugal continental, ficando depois ambos os programas disponíveis aqui e aqui.

O texto acima foi atualizado em 11/04/2025.

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1. A linguagem não binária é uma questão política e ora é eixo de promoção, ora alvo de ataque de governos, em função das opções ideológicas das forças que exercem o poder. Um exemplo de como a linguagem neutra suscita reações contrárias fortes vem da Itália, país onde o Ministério da Educação (em italiano, Ministero dell'Istruzione e del Merito) determinou a proibição do uso de símbolos de linguagem neutra nas escolas ("Itália proíbe símbolos de linguagem neutra nas escolas e incendeia debate cultural", Executive Digest-Sapo, 21/03/2025). A decisão do Ministério de Educação italiano foi tornada pública em 21/03/2025, através da "Nota protocollare n. 1785" (literalmente «nota protocolar»), e visa diretamente dois dos símbolos usados em italiano, para evitar a distinção binária de género gramatical: o asterisco (*) e o schwa (ə), símbolo do Alfabeto Fonético Internacional que se pode aportuguesar como xevá (Infopédia). A referida nota ministerial apoia-se em três pareceres da famosa Accademia della Crusca, instituição que intervém na norma do italiano e que já anteriormente se tinha pronunciado sobre o uso destes símbolos, tendo considerado em 2024 que «a língua jurídica e burocrática não é a sede adequada para experiências inovadoras que transmitem falta de homogeneidade e comprometem a linearidade da compreensão dos textos». Em Portugal, como noutros países de língua portuguesa, têm sido usados os símbolos @ e, por vezes, x, em situações como "tod@s" e "todxs" (= «todas e todos»), além de haver falantes que realizam fonética e morfologicamente o marcador neutro como e – "todes". Diga-se, no entanto, que, ainda em Portugal, tanto quanto é dado a observar, estes símbolos não ocorrem em textos administrativos nem se aceitam nas escolas, pelo que uma nota similar da parte do ministério homólogo português, o Ministério da Educação, Ciência e Inovação, seria muito de admirar.

Sobre este assunto, sugere-se a leitura dos vários artigos que se encontram identificados na lista do subtema "Linguagem inclusiva". Na imagem, "Mês de Abril", tela datada de 1669, da autoria de Baltazar Gomes Figueira e Josefa de Óbidos (Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa).

2. Em O Nosso Idioma, a consultora Inês Gama faz uma breve apresentação de alguns dos provérbios mais emblemáticos relacionados com o mês de abril. Na mesma rubrica, o gramático brasileiro Fernando Pestana lembra num apontamento que facto e fato são variantes legítimas da língua portuguesa, tal como registo e registro, acrescentando: «Cada norma linguística (seja no português, seja no espanhol, seja no inglês, seja no francês) tem as suas peculiaridades, pelo que, quanto mais estudamos a língua, menos sobranceiros e mais compreensivos ficamos.»

3. Continuando a surpreender confusões e velhas incorreções no que se ouve e lê nos media portugueses, o consultor Carlos Rocha regista quatro ocorrências no Pelourinho.

4. No Consultório, volta-se à Mensagem de Fernando Pessoa por causa das metáforas de um dos poemas dessa obra, "Fernão de Magalhães". Outras questões abordadas no conjunto de cinco dúvidas da presente atualização: a locução «nos idos de», o verbo frequentar, o modo associado à conjunção enquanto e a  distinção entre derivados afixais e não afixais.

5. A respeito dos projetos em vídeo do Ciberdúvidas, cabe mencionar O Ciberdúvidas Vai às Escolas*, cujo 24.º episódio é dedicado às regras do hífen em palavras derivadas e compostas, e Ciberdúvidas Responde (29.º episódio), onde o tópico é desta vez o uso das formas empregado  e empregue, particípios passados do verbo empregar.

* Com a participação dos estudantes e docentes do Instituto Politécnico de Lisboa.

6. Dois registos à volta da lusofonia: o projeto “Jovens Leitores”, que foi lançado na Guiné-Bissau e inclui uma formação para 20 jovens artistas do país, para ilustrarem uma nova coleção de contos destinada aos mais novos (in 7 Margens, 02/04/2025); e o relato do tradutor e divulgador de temas linguísticos Marco Neves, sobre a sua experiência numa Escola Oficial de Idiomas em Badajoz, capital da Estremadura espanhola, uma região em que o ensino do português tem vindo a crescer (in Pilha de Livros, 02/04/2025);

7. Em dois dos programas em que, na rádio pública de Portugal, se trata de temas da língua portuguesa, são temas em foco:

– em Língua de Todos (RDP África, sexta-feira, 04/04/2025, às 13h20*; repetido no dia seguinte, c. 09h05*), a professora Sandra Duarte Tavares aborda alguns problemas relacionadas com o funcionamento do português, nomeadamente, o uso da preposição de junto do verbo avisar, e inclui-se um comentário sobre o sentido da expressão «fizeram bicos de rouxinóis para o meu jantar», no poema "O Falso Mendigo" de Vinicius de Moraes.

– em Páginas de Português (Antena 2, domingo, 06/04/2025, às 12h30*; repetido no sábado seguinte, 12/04/2025, 15h30*), a professora universitária Helena Carvalhão Buescu (Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa) apresenta os dois volumes da obra Mundos em Português e a consultora Inês Gama esclarece o provérbio «Entrudo borralheiro, Páscoa soalheira».

8. Coincidindo com a interrupção letiva no ensino básico e secundário em Portugal, na época da Páscoa, o Ciberdúvidas faz uma pausa até 21 de abril. Durante este período, não funcionará o Consultório, mas, sempre que o interesse ou a atualidade o justifiquem, não se deixará de incluir novos conteúdos nas restantes rubricas (Na 1.ª Pessoa, Atualidades, Outros). A próxima atualização fica agendada para 22 de abril, e, até lá, ficam os votos de boas leituras sobre os temas e os problemas da nossa língua comum.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A Comissão Europeia veio recomendar a criação de um kit de sobrevivência, que permita resistir durante 72 horas numa situação de crise, como um desastre natural ou um conflito armado. O anúncio foi recebido com alguma preocupação pelos europeus, preocupados com os verdadeiros motivos por detrás deste alerta. Alguns especialistas interpretam esta ação como uma «estratégia de linguagem securitária», que visa preparar psicologicamente os cidadãos para a aceitação de determinadas decisões políticas, particularmente no campo do armamento e da defesa, áreas sensíveis no atual contexto geopolítico. Neste âmbito, destaca-se a palavra kit (com o plural kits), um empréstimo do inglês, que entrou com esta forma em várias línguas e que se encontra já dicionarizada, não tendo sofrido qualquer processo de adaptação à língua portuguesa. Embora este vocábulo tenha entrado nos usos quotidianos e o seu significado seja transparente para a maioria dos falantes, será sempre possível substituí-lo por outros termos de matriz mais portuguesa para diversificar os recursos lexicais. Assim, para referir a realidade em questão, propomos também o uso de construções como «pacote de sobrevivência» ou «jogo de sobrevivência». Registe-se, ainda, que no discurso político mundial está em voga um conjunto de palavras pertencentes ao campo lexical de crise, associada ao mundo digital e às suas consequências no cidadão comum, o que esperemos não seja sinal de anúncio de tempos (ainda) mais conturbados. Ei-las: autossuficiência, cibersegurança, ciberataque, conflito e sobrevivência

2. Alertar para o facto de uma situação estar a ser referida em «sentido figurativo» é deixar-se cair numa das armadilhas da paronímia. Esta incorreção, detetada num direto televisivo, motiva a explicação do consultor Paulo J. S. Barata, disponível na rubrica Pelourinho. 

3. Tanto a palavra grémio como a palavra guilda podem ser usadas para referir associações comerciais. No entanto, qual será o vocábulo com mais tradição de uso no português? A explicação é apresentada nesta resposta que integra a atualização do Consultório. Poderão também ser consultadas respostas no âmbito das áreas da significação lexical («A expressão numa fração de segundo»), da formação de gentílicos («Habitante de Getafe»), da sintaxe («O verbo juntar e o pronome lhe», «Faltar com oração de infinitivo», «Referir um jornal com nome em inglês») e da pragmática («Atos ilocutórios e a frase «está combinado»). 

4. A conjunção mas tem habitualmente um valor contrastivo. No entanto, assinalam-se usos nos quais surge com um valor aditivo, equivalente ao da conjunção e, tal como explica a professora Carla Marques no seu apontamento divulgado no programa Páginas de Português, na Antena 2. 

5. Ainda no quadro do bicentenário do nascimento de Camilo Castelo Branco, o jornalista e político português Alfredo Barroso evoca a rica e contraditória biografia camiliana, que sintetiza deste modo: «Camilo foi transformado, pouco a pouco, numa legenda áurea, numa lenda etérea, num verdadeiro Santo. O que bem se compreende, é mais que justo e de todo merecido. Mas a alma dele é, simultaneamente, tão negra e tão pura, desafiou o demónio tantas vezes e tais, provocou e sofreu tantas dores cá na Terra [...]», num apontamento de cariz biográfico, que se poderá ler na rubrica Literatura

6. Entre os eventos de referência, damos destaque a:

– Debate promovido pela Associação de Professores de Português, em torno do tema do português do Brasil em sala de aula em Portugal, no dia 28 de abril, entre as 17h e as 20h (evento a distância; inscrições abertas); 

Falecimento da escritora brasileira Heloisa Teixeira, que assinou muitas das suas obras como Heloisa Buarque de Hollanda, uma forte voz do feminismo brasileiro;

Dia Mundial da Conciencialização sobre o autismo, assinalado a 2 de abril;

Colóquio Internacional António Jacinto, poeta e guerrilheiro, com lugar a 4 de abril, na Biblioteca Nacional de Portugal; 

– Abertura na Academia das Ciências de Lisboa das candidaturas para o prémio Alberto Sampaio: os estudos, sobretudo no âmbito da História Social e Económica, poderão ser enviados até ao dia 31 de maio (mais informações aqui).

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A discussão já vem de longe, mas renova-se constantemente, por vezes, no tom conciliatório da esperança num futuro comum, outras vezes, com intervenções polémicas e agressivas para falar de separatismo. As questões levantadas têm modulações redutíveis às seguintes: o português está a fracionar-se e perderá em breve a unidade? Não será o português do Brasil a prova de que hoje a separação já está em curso e é imparável? Na rubrica Controvérsias, partilha-se com a devida vénia um artigo de opinião do linguista e professor universitário brasileiro Aldo Bizzocchi (Diário de uma Linguista, 24/03/2025), que contesta e refuta a argumentação de quantos favorecem a visão de  "o brasileiro" constituir já um idioma autónomo. Sustenta este autor: «Ao ouvirmos um professor brasileiro, um português e um angolano falando numa mesa-redonda sobre linguística (posso testemunhar porque já participei de muitas assim), temos clareza de estar ouvindo a mesma língua.»

2. Entretanto, o português no seu todo, sem descurar certo grau de variação, ensina-se como língua materna, não materna ou estrangeira, e para tanto é necessário haver métodos e técnicas que promovam a sua aprendizagem, configurando uma didática. Em Montra de Livros, apresenta-se o volume 15 da revista Lingvarvm Arena, dedicada aos estudos da didática da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Neste número, reúnem-se trabalhos sobre escrita manuscrita, produção escrita em português como língua materna, produção oral no português como língua estrangeira, manuais para o ensino bilingue e erros ortográficos em futuros professores.

3. No soneto camoniano "Presença bela, gentil figura", de que cor são os olhos da figura feminina retratada? Azuis ou verdes, como mandavam as convenções? A resposta encontra-se no Consultório, no conjunto de cinco da presente atualização, que abrange igualmente o seguintes títulos: "Enquanto com imperfeito do conjuntivo","Maiúsculas em títulos e o pronome relativo que"; "A conjunção subordinativa quanto"; "Alfamense e alfamista".

4. O uso do presente do conjuntivo depois de verbos que exprimem desejo e dúvida é o tópico esclarecido no 23.ª episódio de O Ciberdúvidas Vai às Escolas, que conta com a participação de estudantes do Instituto Politécnico de Lisboa. Em Ciberdúvidas Responde (28.º episódio), aborda-se a noção de merónimo, a propósito da relação da palavra pai com família.

5. Na esteira do impacto, na opinião pública, da minissérie Adolescência, mencionada na Abertura de 25/03/2025, chama-se a atenção para o artigo "Adolescence: a tragédia familiar e social", da psicóloga clínica Vera Ramalho (Público, 27/03/2025). O texto inclui uma breve lista de emojis, que, além do já aqui comentado «100», sublinhado duas vezes, contém os símbolos que se apresentam na imagem ao lado. Um neologismo que a discussão à volta de Adolescência trouxe à ribalta dos usos do português é manosfera, um decalque de manosphere, amálgama do inglês  (man, «homem» + sphere, «esfera»), com o significado de «série diversificada de páginas, blogues e fóruns em linha que promovem a masculinidade, a misoginia e a oposição ao feminismo» (cf. Luís Pedro Nunes,  "Um miúdo de 13 anos é um incel?", Expresso, 26/03/2025 + Rodrigo Guedes de Carvalho, "A pergunta do demónio", ibidem, 2703/2025 + Clara Ferreira Alves, "Manosfera, manual de combate", ibidem, 1/04/2025).

6. Outros registos: a  distinção da escritora portuguesa Lídia Jorge com a insígnia de Comendador das Artes e das Letras, a mais alta distinção cultural atribuída pelo Ministério da Cultura francês (Observatório da Língua Portuguesa, 19/03/2025); a situação em França dos certificados da rede do Ensino do Português no Estrangeiro ("Sindicalista diz que certificado do Ensino Português no Estrangeiro não tem valor", ibidem, 21/03/2025); e a chamada à participação na Rede Jacobea, conjunto de quatro bases de dados sobre investigadores vivos, instituições, atividades académicas e revistas dedicadas ao estudo do peregrinações a Santiago de Compostela.

7. Entre os programas que, na rádio pública de Portugal, versam sobre temas da língua, salientam-se:

Língua de Todos (RDP África, sexta-feira, 28/03/2025, às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), conversa-se com os professores Brain Daniel TachiuaCalton SujaiJerónimo Pascoal Balata (Universidade de Licungo, Moçambique) sobre a literacia da leitura literária dos alunos do ensino secundário deste país.

– Em Páginas de Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 30/03/2025, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 05/04/2025, às 15h30*), os professores Samuel Figueira-CardosoWeronika GrzegorczykMaria João Marçalo (Universidade de Évora) discorrem sobre as línguas minoritárias existentes em Portugal, como, por exemplo, o mirandês ou o barranquenho.  No programa também participa a professora Carla Marques, com um apontamento a respeito do valor da conjunção mas.  

Hora oficial de Portugal continental.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A presença das tecnologias na sociedade atual tem introduzido novos processos de comunicação que, com em busca de formas económicas de transmissão de mensagens, se têm socorrido de estratégias como o uso de símbolos, designados comummente emojis (um empréstimo do inglês, que, por seu turno, a recuperou do japonês). Usados inicialmente para recuperar expressões faciais (como o conhecido "boneco sorridente"), evoluíram para representar objetos, situações e mesmo conceitos. Trata-se de um fenómeno de semiose em ascensão, que foi já considerado a língua com maior crescimento no século XXI, tese que encontra os seus fundamentos no facto de 90% da população em linha utilizar emojis nos mais de 6 biliões de mensagens enviadas diariamente1. Vários têm sido os teóricos, investigadores e figuras de várias áreas da sociedade que têm analisado criticamente o recurso a esta nova forma de comunicação, alegando que, de alguma forma, ela constitui um retrocesso na conquista humana da capacidade de escrita e, eventualmente, na densidade da comunicação associada à linguagem escrita por reduzir a representação das situações a conceitos estereotipados e superficiais. A questão da utilização de emojis pelos adolescentes e jovens é um dos temas da badalada série Adolescência, produzida por Jack Thorne e Stephen Graham, disponível na Netflix. Aqui aborda-se o tema das redes sociais e da sua influência nas faixas mais jovens. No decurso da evolução da ação, a série demonstra como os adolescentes estão a converter os emojis numa espécie de língua secreta, inacessível aos adultos, o que lhes permite veicular mensagens de teor sexual, manifestações de violência ou mesmo ideológicas. A título de exemplo, veja-se o caso do emoji «100», associado a uma interpretação positiva pelos adultos (com o valor de «ser realista», «manifestar orgulho» ou «ter muita qualidade»), que, na série, é usado pelos adolescentes para expressar a teoria da comunidade dos «celibatários involuntários» (na série, designados incel) de que 80% das mulheres se sente atraída apenas por 20% dos homens, sendo, deste modo, um símbolo usado para rebaixar e discriminar os adolescentes que não são atraentes. Os emojis estão, assim, a sofrer uma evolução similar à que se verifica no léxico, onde identificamos o processo de associação de novos significados a palavras, alguns dos quais poderão ser reservados apenas a determinados grupos sociais e, portanto, inacessíveis à maioria da população. Este é, pois, um fenómeno a manter no foco da atenção. Por todas estas razões!

A este propósito, a resolução do Conselho de Educação brasileiro que aponta as diretrizes operacionais nacionais sobre o uso de telemóveis e outros dispositivos digitais em salas de aula.

 2. A utilização do apóstrofo em expressões como mãe-d'água abre caminho à dúvida relativa à possibilidade de utilização do apóstrofo noutros nomes compostos que incluam a preposição de. Nesta resposta analisa-se a questão do ponto de vista das normas ortográficas e dos usos. Na atualização do Consultório, disponibilizamos ainda respostas para as seguintes questões: «As palavras noiva e nubente são sinónimas?», «Qual a relação entre os verbos pontuar e pontoar?», «Como ocorre a concordância com a expressão "página e meia"?», «Qual a diferença entre cantiga e vilancete?», «Qual o recurso expressivo presente em "como se uma invisível cortina os separasse"?»

3. Qual a pronúncia correta da palavra latina incipit? No desafio semanal apresentado no programa Páginas de Português, na Antena 2, e apresentado no mural de Facebook, a professora Carla Marques esclarece esta questão de ortoépia

4. Cotejando expressões do português europeu com as do português do Brasil, o gramático brasileiro Fernando Pestana apresenta um apontamento onde identifica semelhanças e distinções, numa listagem que permite ver a cor das variedades do português.  

5. A professora e escritora Dora Gago apresenta uma recensão crítica do livro de poemas Guynea, de autoria de Arlinda Mártires. Uma publicação que, nas suas palavras, «revela a profundidade da sua relação com a Guiné, pois a língua é o reflexo da cultura, da essência de um país, das formas de sentir e viver das suas gentes».

6. Entre as notícias de relevo para a língua, destaque para o facto de o Diário da República passar a incluir publicações em língua mirandesa, uma decisão que confere maior dignidade à segunda língua oficial portuguesa (notícia aqui). 

 

1. Cf. Soares, A., Oliveira, H. & Costa, M. (2021) Quão sentida é a sua emoção? Efeitos das expressões faciais dos emojis no processamento emocional de mensagens de texto. 6th Iberian Conference on Information Systems and Technologies (CISTI).

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Com o começo da primavera no hemisfério norte, coincide normalmente o Dia Mundial da Poesia, celebrado anualmente em 21 de março*. Com esta data, que foi fixada em 1999, na 30.ª Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), «pretende-se salientar a importância da poesia enquanto manifestação artística comum a toda a Humanidade», bem como celebrar «a criatividade, a pluralidade linguística e cultural e promove[r]-se o ensino e declamação da poesia» – lê-se numa das páginas do Centro de Informação Europeia Jacques Delors. Sobre o vocábulo poesia, sugere-se a leitura das respostas " A ortografia e etimologia do nome poesia", "A poesia e a música da nossa Língua" e "Nossa Língua Portuguesa, a língua da poesia. Chama-se também a atenção para os textos recolhidos na rubrica Antologia, muitos deles configurando diferentes modos de entender a poesia em português e entre os quais se destaca neste dia "Poesia Necessária", de Manuel Rui, "Crónica verdadeira da língua portuguesa", de João Melo, e "Ah! As palavras", de Vasco Graça Moura (1942-2014).

Ainda na Antologia, divulgamos com a devida vénia o poema em quadras do humorista e apresentador César Mourão, que com esta composição contribuiu para o conjunto de iniciativas e textos dedicados à língua portuguesa com que o jornal Público assinalou o seu 35.º aniversário  em 05/03/2025. É um texto, de veia popular, que apela à reflexão sobre o que pode ser a experiência emocional de um falante de crioulo quando aprende o português na escola. Na imagem, "Uma Rosa é..." (1968), de João Vieira (1934-2009), no Centro de Arte Moderna, em Lisboa.

* Em 21 de março, também se festeja, em Portugal e noutros países, o Dia da Árvore.

2. A linguista e professora universitária Teresa Brocardo (1959-2023) notabilizou-se na área da linguística histórica, com estudos sobre processos diacrónicos de gramaticalização, ilustrados pela evolução de palavras semanticamente próximas, como os verbos ser e estar ou haver e ter,  conforme ocorrem em textos medievais. Na Montra de Livros, apresenta-se o livro ...Sedia la fremosa..., um lançamento de junho de 2024 que foi organizado por Antónia CoutinhoClara Nunes Correia e Maria do Céu Cetano, e que reúne os trabalhos mais proeminentes desta destacada académica seguidos de um comentário de cada uma das organizadoras.

3. Numa semana em que a guerra continuou a estar presente na atualidade internacional e a depressão Martinho se fez sentir com particular intensidade em Portugal, os comentários televisivos em direto continuaram a dar azo a lapsos linguísticos reveladores de associações mentais curiosas. Em O Nosso Idioma, o consultor Carlos Rocha comenta a confusão entre «estar escrito na pedra» e «estar escrito nas estrelas» e as subtilezas semânticas e referenciais do par melhora-melhoria.

4. Em Portugal, o que distingue os termos reformado, aposentado e jubilado? A questão, que tem certa complexidade, faz parte do conjunto das seis novas perguntas do Consultório. São também abordadas as seguintes áreas: a sintaxe, em "O uso preposicional de fora"; a semântica lexical, em "A origem de 'dar raia'", "Sinonímia: inimigo, desafeto e rival", "A expressão «meio-dia e meia» II"; e a formação de palavras, designadamente, de gentílicos, em "Gentílicos de Estados e territórios das Caraíbas".

5. Nos vídeos Ciberdúvidas Responde, o tópico do novo episódio (n.º 27) corresponde à definição de sigla e acrónimo no contexto da gramaticografia do Brasil. Quanto a O Ciberdúvidas Vai às Escolas, no episódio n.º 22 explica-se como funciona a mesóclise em casos como dar-te-ei e dar-te-ia (agradece-se a participação do Instituto Politécnico de Lisboa).  

6. Registos vários:

– uma leitura com interesse, sobre o estatuto do português como Língua de Herança no Japão: um estudo de 2022 da linguista Tábata Q. Yonaha, intitulado "O reconhecimento do Português Língua de Herança no Japão como um direito humano linguístico" (Revista Horizontes de Linguística Aplicada, Universidade de Brasília);

– o artigo "Afinal, é IKEÁ ou IKEIA? Vento da madrugada levantou as dúvidas" (Notícias ao Minuto, 20/03/2025), o qual se refere a um estrago causado pela depressão Martinho em Portugal (ver ponto 3) e cujo título tem resposta clara numa resposta do arquivo Ciberdúvidas;

– os primeiros mestrados em História e Património e um doutoramento em Sociedade, Cultura e Desenvolvimento que a Universidade de São Tomé e Príncipe vai começar a oferecer no arquipélago com apoio da Universidade de Évora (Observatório da Língua Portuguesa, 19/03/2025).

7. Referência a dois dos programas que, na rádio pública de Portugal, são dedicados a temas da língua portuguesa:

– Em Língua de Todos (RDP África, sexta-feira, 21/03/2025, 13h20*; repetido no dia seguinte, c. 09h05*), a linguista Sandra Duarte Tavares discorre sobre pleonasmos.

– O bicentenário do nascimento de Camilo Castelo Branco é o tema do programa Páginas de Português (Antena 2, domingo, 23/03/2025, 12h30*; repetido no sábado seguinte, 28/03/2025, 15h30*), em que participa o crítico literário António Carlos Cortez. Ainda o apontamento gramatical da professora Carla Marques, esta semana sobra a pronúncia correta do termo latino incipit.

Hora oficial de Portugal continental.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A associação entre nacionalidade e língua tem sido convocada por diferentes setores da sociedade com vista a fins muito distintos. A língua como fator essencial na construção identitária tem sido também uma questão teórica abordada em várias áreas dos estudos linguísticos. No quadro destas relações, mais recentemente, tem-se colocado uma nova questão associada ao fenómeno da imigração, que tem tido bastante expressividade em Portugal: deverá o domínio da língua ser uma condição de entrada no país? As opiniões têm-se dividido: há quem recorde o passado dos imigrantes portugueses, que desconheciam as línguas dos diferentes países onde se instalaram em busca de uma vida melhor; há quem argumente com as questões de unidade e identidade cultural de um povo. Recentemente, Jorge Miranda, considerado um dos pais da Constituição portuguesa, veio defender que Portugal só deve aceitar imigrantes que dominem o português, mostrando-se, neste âmbito, favorável à entrada de imigrantes oriundos de países africanos de língua portuguesa e do Brasil. Na sua ótica, o domínio da língua é um fator de integração que deverá ser tido sempre em consideração. A relação entre um dado povo e a sua língua pode ser encarada sob o ponto de vista da história da criação das línguas, uma área para a qual investigações recentes trouxeram contributos importantes. Com efeito, embora atualmente se considere que a língua é um dos eixos de afirmação de um povo, também parece certo que as línguas humanas tiveram uma origem comum, descendendo todas de uma primeira língua, que terá começado a sofrer divisões há cerca de 135 mil anos com a mobilidade geográfica dos povos e o desenvolvimento posterior de variações genéticas. Num estudo recente publicado na revista Frontiers in Psychology (divulgado pelo jornal Público) divulgam-se estes dados, atribuindo os investigadores particular atenção não à possibilidade humana de produção de sons mas antes à capacidade de associação entre vocabulário e sintaxe, que criou um sistema assente em regras, uma gramática, que abriu caminho para o desenvolvimento do pensamento complexo e à sua partilha com os outros seres humanos. 

2. Considerando ainda a celebração do bicentenário do nascimento do escritor Camilo Castelo Branco, o consultor Carlos Rocha dedica um apontamento de natureza topológica à grafia da designação da localidade onde este viveu os últimos anos de vida: dever-se-ia grafar Ceide ou Seide (como atualmente acontece)?  

3. Poderão os termos adotados para designar as variedades do português encerrar uma natureza discriminatória? Encerrarão estruturas como «português europeu» e «português do Brasil» juízos de valor sobre os povos que falam as diferentes variedades de uma língua? Esta questão é abordada numa resposta que demonstra como os usos terminológicos científicos procuram formulações acéticas para descrever realidades linguísticas, constituindo, por vezes, os valores ideológicos que se lhes pretende associar uma ação a posteriori. Na atualização do Consultório, é possível ler ainda uma resposta sobre as possíveis significações do nome criatura e consultar três respostas sobre tópicos de natureza sintática: usos do verbo emendar; natureza da palavra junto de nome; concordância do adjetivo com dois nomes. Por fim, uma resposta de âmbito lexicológico relacionada com o regionalismo "deboeira"

4. O provérbio «Julho, debulhar. Agosto, engavelar» pode oferecer dificuldades de compreensão a um falante atual pela opacidade do verbo de âmbito agrícola engavelar. No apontamento enquadrado da Dúvida da Semana, a professora Carla Marques aborda o tema (divulgado no programa Páginas de Português, na Antena 2). 

5. Entre os acontecimentos e artigos de interesse, destacamos:

–  O artigo divulgado no jornal Público sobre a censura da palavra mulher, nos EUA,  determinada pela administração Trump;

– As questões que se apresentam como entrave ao desenvolvimento do Amália, o modelo de inteligência artificial português.