Inês Gama - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Inês Gama
Inês Gama
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Licenciada em Português com Menor em Línguas Modernas – Inglês pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e mestre em Português como Língua Estrangeira e Língua Segunda (PLELS) pela mesma instituição. Fez um estágio em ensino de português como língua estrangeira na Universidade Jaguelónica em Cracóvia (Polónia). Exerce funções de apoio à edição/revisão do Ciberdúvidas e à reorganização do seu acervo.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Qual a função sintática da expressão «do mundo» em «Dando os corpos (...) a perigos incógnitos do mundo»? Modificador restritivo do nome?

Grata!

Resposta:

A expressão «do mundo» no sintagma nominal «a perigos incógnitos do mundo» desempenha de facto a função sintática de modificador restritivo do nome.

O modificador restritivo do nome tem como função principal restringir a referência do nome que modifica. Portanto, no caso apresentado pela consulente, «do mundo» está a circunscrever a entidade descrita pelo nome perigos, ou seja, os perigos mencionados no enunciado apresentado são os relativos ao mundo.

Os modificadores do nome (restritivos e apositivos) podem, por vezes, confundir-se com o complemento do nome. Contudo, enquanto os complementos do nome são selecionados por um nome, os modificadores do nome não são selecionados pelo nome, restringindo ou não a referência do nome que modificam.

Diz-se <i>imperial</i> ou <i>fino</i>?
A variação linguística na nova música de Ana Bacalhau e Cláudia Pascoal

A propósito da música "Imperial é fino", interpretada por Ana Bacalhau e Claúdia Pascoal e escrita por Capicua, a consultora Inês Gama aborda a variação linguística do português europeu, a qual gera, por vezes, uma competição linguística saudável entre alfacinhas (lisboetas) e tripeiros (portuenses).

Pergunta:

Ultimamente tem-se ouvido «vamos repercutir isso, vamos repercutir aquilo».

Quem repercute é o fato ou é a pessoa que fala sobre ele?

Obrigado.

Resposta:

O verbo repercutir tem, segundo o Dicionário da Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa (DLPACL), como aceções possíveis: i) «causar a reflexão ou repercussão de alguma coisa, som, imagem, objeto em movimento, após embate; enviar para nova direção» em frases como «As paredes repercutiam os sons»; ii) «ser, um som, uma imagem, um objeto em movimento, refletido ou reenviado para nova direção» em frases como «O eco repercutia nas montanhas»; iii) «ter, alguma coisa, projeção, influência, repercussão sobre ou em; afetar indiretamente» em frases como «A redução nos custos repercute sobre a qualidade da mercadoria produzida». Com isto, pode-se concluir que o verbo repercutir é usado frequentemente em áreas como a física e a economia, sendo o seu sujeito um constituinte com traços não animados.

Pesquisando no corpus do português, de Mark Davies, é possível verificar que o verbo repercutir tem praticamente sempre como seu sujeito um constituinte com traços não animados, como em (1), ou que descreve uma situação que resulta da ação de alguém como em (2):

(1)    «Estes estragos físicos ...

A  sinonímia do termo <i>obsoleto</i>

A sinonímia do adjetivo obsoleto é o tema do apontamento gramatical da consultora Inês Gama (divulgado no programa Páginas de Português, da Antena 2, em 10/11/2024).

Pergunta:

Numa apresentação pessoal, gostaria de saber se é correto dizer «chamo-me Jaime» ou o melhor é dizer «chamam-me Jaime».

Este último caso é uma tese defendida por alguns, alegando que, por exemplo, eu não me chamo, mas as pessoas é que me chamam, porque me deram o nome, não eu. Então, para eles não é correto dizer «chamo-me», mas sim o correto é "chamam-me"

Aguardo a resposta. Obrigado.

Resposta:

A frase «Chamo-me Jaime» está correta e é aceite pela maioria dos falantes num contexto de apresentação pessoal.

Quando o verbo surge flexionado na primeira pessoa do singular como em chamo-me, o falante indica que se está a referir a si próprio. Para além disso, de acordo com os dicionários de referência da língua portuguesa, o verbo chamar-se utiliza-se com a aceção «ter determinado nome». Portanto, dizer «chamo-me Jaime» é o mesmo que dizer «tenho como nome Jaime».

Já a expressão «Chamam-me Jaime» é estranho usá-la num contexto em que nos estamos a apresentar a nós próprios, mas não deixa de ser possível. Note-se que o uso da terceira pessoa do plural neste caso pode ter como interpretação que o nome verdadeiro de quem se está a falar não é Jaime, mas este é frequentemente referido por outros através deste nome, por exemplo, «O meu nome é António, mas chamam-me Jaime por causa do meu avô».