Um dos grandes desafios das escolas portuguesas nos últimos anos tem sido o número crescente de alunos estrangeiros, sendo que uma parte significativa é falante de uma variedade diferente do português europeu e outra nem sequer tem português como língua materna. Neste sentido, a Associação Portuguesa de Linguística (APL) lançou recentemente um número temático dedicado à variação linguística nas escolas portuguesas e que reúne investigações interdisciplinares que cruzam a área da linguística com a educação.
Este número especial da Revista da APL, designado por “N.º 12: Número Temático: Linguística e Educação – Variação nas Escolas Portuguesas”, foi organizado por Adriana Cardoso, Joana Batalha e Nélia Alexandre. Embora apresente orientações um pouco distintas, todas pretendem contribuir para a reflexão sobre vários contextos de ensino-aprendizagem e as práticas educativas desenvolvidas em salas de aula com variação linguística. Por conseguinte, os contributos que compõem este número exploram, tal como assinalam as suas organizadoras, «diversos eixos do processo educativo, com incidência no professor e no aluno, bem como nos manuais escolares e nos documentos orientadores que enquadram as práticas desenvolvidas» (página 1).
De entre os vários textos desta compilação, destacamos "A perspetiva do português como língua global na educação linguística", da autoria de Luís Filipe Barbeiro. Neste artigo, realiza-se uma análise temática conjunta de dois documentos orientadores, o Quadro de Referência para o Ensino Português no Estrangeiro e as Aprendizagens Essenciais de Português Língua Não Materna, com 22 manuais escolares. Os resultados revelam que os documentos orientadores não expressam o mesmo nível de explicitação quanto à presença do pluricentrismo do português na sala de aula, por outro lado, nos manuais existe uma presença vasta de conceitos relacionados com o português enquanto língua global e que procuraram basear-se nas vivências do aluno.
Salientamos também o estudo desenvolvido por Joana Batalha, Adriana Cardoso, Ana Luísa Costa, Sónia Rodrigues e Isabel Sebastião e que discute questões suscitadas por contextos de aprendizagem em que coexistem variedades africanas e brasileiras do português, caracterizando as perceções predominantes sobre esta temática presente em futuros professores e professores em exercício. Este trabalho, denominado por "Variação linguística em sala de aula: conceções de futuros professores e de professores em exercício", analisa respostas de 56 futuros professores e 40 professores em exercício a um questionário que explorava temas como as dimensões e o conhecimento sobre variação linguística, o impacto do uso de diferentes variedades do português em sala de aula e as práticas de ensino sobre variação. Os resultados mostraram que, em termos globais, existe uma posição favorável quanto à aceitação de diferentes variedades do português na escola e à adoção de práticas pedagógicas que favoreçam a integração dos alunos que as falam. Contudo, foram também identificadas dificuldades decorrentes da formação insuficiente dos docentes para atuar em contextos de diversidade linguística.
Por fim, realçamos o trabalho de Paulo Feytor Pinto, intitulado "Conceções sobre as variedades brasileiras e africanas do português em manuais do ensino básico", que consiste numa análise de oito manuais escolares do 7.º ano sobre as conceções acerca das variedades brasileiras e africanas. Conclui-se que os manuais contêm um grande número de imprecisões, incorreções e ambiguidades na abordagem das variedades nacionais do português, ignorando as comunidades lusofalantes e os falantes de outras línguas que falam português fora dos espaços em que a língua não é oficial e não referindo a natureza multilingue dos países africanos em que o português é falado.
Em síntese, o conjunto de textos apresentados neste número especial apresenta abordagens que, nos tempos atuais, adquirem uma enorme relevância, uma vez que há nas salas de aula portuguesas cada vez mais uma maior diversidade de línguas e variação linguística.
Este é um espaço de esclarecimento, informação, debate e promoção da língua portuguesa, numa perspetiva de afirmação dos valores culturais dos oito países de língua oficial portuguesa, fundado em 1997. Na diversidade de todos, o mesmo mar por onde navegamos e nos reconhecemos.
Se pretende receber notificações de cada vez que um conteúdo do Ciberdúvidas é atualizado, subscreva as notificações clicando no botão Subscrever notificações