Aberturas - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Início Aberturas
Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Em Portugal, a palavra escrutínio tem surgido com alguma frequência no discurso político associado ao momento de crise que emergiu em várias frentes. Diferentes intervenientes na cena política têm vindo a público defender um escrutínio sobre as instituições, no âmbito tanto das investigações promovidas pelo Ministério Público, que levaram à queda do governo, como do chamado «caso das gémeas», que poderá ter beneficiado de influência política. O termo escrutínio é também mobilizado no contexto de eleições e, no caso português, será usado com bastante frequência em 2024 atendendo a que num mesmo ano ocorrerão eleições legislativas antecipadas nos Açoresem Portugal e ainda eleições europeias. Escrutínio é, assim, um substantivo com uma diversidade de possibilidades significativas: de «votação por meio de boletins que se depositam numa urna» a «apuramento ou contagem dos votos entrados em urna» ou ainda «exame minucioso». Este último significado parece ser o mais próximo do valor originário da palavra, que, etimologicamente, vem do latim scrūtĭnĭum, ii, palavra que significava «ação de sondar, ato de pesquisar» e que tem como base scrūta, ōrum, cujo significado refere «roupas velhas, ferros velhos ou outros objetos de pouco valor». Da mesma família, são as palavras escrutinar, escrutar («sondar, remexer») e também esquadrinhar («buscar com cuidado e diligência»). Ao âmbito lexical pertencem também as duas novas entradas em A covid-19 na LínguaJN.1Pirola, que designam a nova sublinhagem do coronavírus que domina no hemisfério Norte.

2. A atualização do Consultório integra esclarecimentos a várias dúvidas recebidas pela equipa. Entre elas encontra-se a questão da natureza da partícula -se nos verbos desmoronar-se e estender-se, a construção do verbo terminar equivalente a «acabar por», a troca da terminação -am por -em, as expressões «ao largo de» e «ao longo de» e a possível diferença entre lides e lida. Por fim, trata-se a questão da abordagem didática relacionada com o uso excessivo do verbo falar, no sentido da promoção da diversidade lexical e apresentam-se formulações para indicar o destinatário no cabeçalho de uma carta formal.

3. É frequente ouvir-se a construção «*os livros que mais gostei», a qual é incorreta por não incluir a preposição de antes do pronome relativo, tal como explica a professora Carla Marques neste apontamento divulgado no programa Páginas de Português, da Antena 2. 

4. Na Montra de Livros são apresentadas duas publicações: a obra Da didática de língua(s) ao seu ensino (Pontes Editores), organizada por Luciana GraçaMatilde GonçalvesLuzia Bueno e Eliane Lousada, que compila um conjunto de estudos de homenagem ao professor Joaquim Dolz, docente na Universidade de Genebra, e a obra Ensinar Português Língua de Herança como Língua Pluricêntricaorganizada por Isabel DuarteMaria de Lurdes Gonçalves e Sónia Rita Melo, onde se pode conhecer um conjunto de propostas didáticas relacionadas com o ensino do português, tendo em consideração o seu pluricentrismo.

5. Os resultados do Relatório Pisa, divulgados na semana passada, desencadearam a discussão sobre o estado do ensino e das aprendizagens em Portugal. A professora universitária e linguista Margarita Correia aborda este assunto na perspetiva dos seus resultados internacionais, num artigo aqui partilhado com a devida vénia.

Cf. Porque pioram os alunos?

6. As subtilezas do domínio de expressões alusivas a referentes masculinos nos textos de natureza jurídica dão matéria à reflexão apresentada pela professora universitária Inês Espinhaço Gomes, na qual defende a importância da seleção das palavras (texto publicado no jornal Público e aqui partilhado com a devida vénia).

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A atualidade internacional volta a ficar marcada pela guerra em Gaza e na Ucrânia, pela crise climática e pelo decionante impasse na COP28, no Dubai, entre muitos outros focos de tensão e conflito. No mundo de língua portuguesa, as notícias dão igualmente conta de alguma agitação, pelo menos, mais declarada na Guiné-Bissau, onde o parlamento foi dissolvido, ou em Portugal, com o chamado «caso das gémas». Bem mais pacífica e estimulante é com certeza uma novidade vinda de Angola: a publicação do livro Português de Angola: Fonologia, Sintaxe e Lexicografia, uma obra coordenada por três linguistas – dois angolanos, Márcio Undolo e Gaudêncio Kimuenho, e o moçambicano Alexandre António Timbane. Trata-se de um trabalho que visa dar contributos para a elaboração da norma do português angolano, conforme se regista nas Notícias.

Na imagem, as quedas-d'água de Calandula, na província de  Malanje, em Angola (fonte: "Quedas de Calandula", Wikipédia, consultada em 05/12/2023).

2. O que se faz e não faz pela inclusão e pela linguagem que a promove continua a dar abundante matéria de reflexão. Na rubrica O Nosso Idioma, a consultora Inês Gama mostra como  as questões de género e identidade geram um debate não despiciendo – adjetivo que ganhou relevo mediático em Portugal e que é comentado pela professora Carla Marques na mesma rubrica.

3. Quando se conjuga o verbo sair no presente do indicativo, como se escreve a forma da 3.ª pessoa do plural (eles, elas)? "Saiem"? No Pelourinho, a consultora Sara Mourato recorda que a grafia correta é saem, corrigindo o que se escreveu numa notícia sobre uma plataforma de encontros.

4. Quando o nome resto ocorre, por exemplo, em expressões como «o resto», não estaremos a usar um pronome indefinido? A resposta faz parte do conjunto de nove respostas que atualizam o Consultório e abordam outros tópicos: o gentílico de Bereia, o nome Via Sacra, a relação das conjunções com os modos verbais, um caso de oração subordinada comparativa, dois verbos homónimos (decorar), o verbo sentir seguido de oração adverbial, o superlativo relativo e o termo primitivabilidade.

5. Os jovens portugueses parecem perder as denominações de relações de família e parentescos menos próximos, como sejam, bisavó, tio-avô ou genro. Nada de comparável entre os falantes de mandarim, que memorizam um sistema de termos de parentesco muito complexo – revela a professora Dora Gago nas Diversidades, em crónica transcrita, com a devida vénia, da revista digital Algarve Informativo.

6. Na rubrica Ensino, inclui-se um comentário dos investigadores brasileiros Henrique BragaMarcelo Módolo incluído no Jornal da USP, acerca dos critérios de correção (no Brasil, gabarito) da prova de Linguagens do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

7. O "brasileiro" já não faz parte da língua portuguesa? Nas Controvérsias, o gramático brasileiro Fernando Pestana contesta a ideia de «língua brasileira», defendendo a unidade do idioma, que permite a qualquer aprendente estrangeiro comunicar tanto no Brasil como em Cabo Verde, Portugal, Angola, Moçambique, Timor-Leste ou mesmo na Guiné-Bissau.

8. À medida que 2023 se aproxima do fim, aparecem os já tradicionais passatempos da «Palavra do Ano». É o caso da votação organizada pela Porto Editora, que apresentou a seguinte lista, a traduzir bem as preocupações sociais e políticas dos últimos meses em Portugal: clima, conflitos, demissão, habitação, inflação, inteligência artificial, jornada, médico, navegadoras, professor. É de lembrar que, em 2022, guerra foi a palavra escolhida pelos participantes na escolha promovida pela Porto Editora.

 Acrescente-se que, para o inglês, a Oxford University Press (OUP), a segunda editora mais antiga do mundo, já anunciou a palavra do ano: rizz , nome do registo coloquial, que significa «estilo, charme ou atratividade; a capacidade de atrair um parceiro romântico ou sexual» (cf. jornal digital brasileiro Nexo e, em inglês, página da OUP).

9. Da atividade académica relacionada com a língua portuguesa, destacam-se:

– o anúncio da 1.ª chamada de trabalhos da conferência "De cada língua se constrói o futuro – a voz da sustentabilidade no ensino e aprendizagem das línguas", promovida pelo Centro de Línguas e Cultura (CLiC) do Instituto Politécnico de Lisboa (IPL);

– a ação de curta duração "Ensino e aprendizagem do PLNM: estratégias e recursos", também do do CLiC do IPL, em parceria com a Escola Superior de Educação de Lisboa.

10. Devido ao feriado religioso de 8 de dezembro, celebrado em Portugal como noutros países, a próxima atualização do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa fica marcada para 12 de dezembro. Sobre o significado também histórico-político da data de 8 de dezembro, ler a Abertura de 27/11/2020.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. O conflito israelo-palestiniano vive uma fase de interrupção dos confrontos bélicos que tem permitido a troca de reféns detidos pelo Hamas por prisioneiros palestinianos detidos em prisões israelitas. Esta pausa facilitou a entrada de ajuda humanitária em Gaza. Mal o acordo foi tornado público, alguma comunicação social anunciou pedidos de «trégua permanente» ou de «trégua duradoura». Estas são expressões que não se ajustam à situação que se pretende descrever, pois encerram termos antitéticos. Com efeito, trégua significa «cessação temporária de hostilidades entre beligerantes» (Priberam), o que contrasta com a noção de permanente, que descreve algo «duradouro, ininterrupto», ou de duradouro, pelas mesmas razões. São, portanto, termos que se excluem: uma situação será ou transitória ou permanente. Para referir de forma mais ajustada aquilo que efetivamente é pedido será preferível recorrer a expressões como «cessar-fogo permanente», «fim nos combates» ou, não sendo possível uma situação definitiva, «prolongamento das tréguas». Acrescente-se ainda que a expressão «tréguas temporárias» também não é ajustada por ser redundante, visto que a palavra trégua já encerra a ideia de algo momentâneo.

2. «Andar à guna» é uma expressão pertencente ao registo familiar ou a um determinado tipo de gíria. É usada sobretudo na região norte, na zona do grande Porto. A consultora Inês Gama descreve o seu significado e a sua origem no apontamento divulgado no programa Páginas de Português, na Antena 2.  

3. A construção «dar ghosting» tem registos frequentes entre as gerações mais jovens. A consultora Sara Mourato explica como se formou, abordando a sua origem a partir do inglês, e esclarece os contextos de uso, num apontamento disponível na rubrica O Nosso Idioma.

4.  A presença ou ausência do artigo definido junto de um substantivo pode implicar diferenças no sentido veiculado pelos sintagmas nominais, tal como se esclarece numa das respostas incluídas na atualização do Consultório. Nesta secção podem também ser consultadas as seguintes perguntas e respetivas respostas: «A origem de Donim (Guimarães)», «A origem de Fão (Esposende, Braga)», «O significado de ressecar», «Concordância do possessivo: «as vossas esperanças e desejos»», «O nome gaultéria», «O verbo cair com modificador», «A frase "que tenha um bom dia"» e «O adjetivo influencial».

 5. O treinador do Benfica Roger Schmidt irritou-se com os jornalistas por estes lhe terem colocado questões em português, não tendo ido a uma conferência de imprensa após um jogo. Este é um episódio que motiva o apontamento disponível no Pelourinho, da autoria de José Mário Costa, cofundador do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. 

6. A confusão entre pisteiro e pistoleiro deu azo a um título equívoco num jornal televisivo, o que merece a correção e o esclarecimento de Carlos Rocha, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. 

7. Paulo J. S. Barata, consultor do Ciberdúvidas, dá conta do uso da expressão «vai na fé», que é usada como a verbalização de um ato de confiança. 

8. Uma discussão em torno dos substantivos incluídos na expressão «velho e relho» levam o jornalista e escritor Carlos Coutinho em busca de esclarecimentos relacionados com o significado destes termos.  

9. Entre os eventos de relevo para a língua damos destaque aos seguintes:

– Lançamento do Dicionário de Abreviaturas Digitais, coordenado por Raquel Amaro e disponível em linha;

– O Congresso Internacional Em Português – falar, viver, e pensar no século XXI, organizado pela Universidade Católica Portuguesa e ainda em decurso (presencial e online).

 

*Informamos os nossos leitores e consulentes que na próxima sexta-feira, 1 de dezembro, não haverá abertura do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa por ser dia feriado. A próxima atualização terá lugar em 5 de dezembro, terça-feira. 

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Pela Europa, somam-se os sintomas de mal-estar político e social, que vão do resultado das eleições nos Países Baixos a desacatos em Dublim. Por outro lado, o consumismo entrega-se ao ritual multitudinário da Black Friday (cf. "Um duplo contrassenso"). A agitação presente pode motivar a nostalgia de uma tranquilidade pretérita; mas depressa se descobre que, no passado, a ordem social e política estabelecida gerava descontentamento e era desafiada por juízos populares muito negativos, como confirmam provérbios antigos, já atestados na Idade Média. Por exemplo, «mais vale salto de mata que rogo de homens-bons», que é como quem diz «não confies nos poderosos»; ou o niilista «quem não mente não vem de boa gente». Estes e outros provérbios estão reunidos e comentados em O Essencial sobre os Provérbios Medievais Portugueses, um livrinho de 1987 que foi escrito pelo historiador português José Mattoso (1933-2023) e que se recupera numa apresentação incluída na Montra de Livros, subscrita pela escritora e professora Arlinda Mátires.

Sugere-se aqui também a consulta da base de dados Cantigas Medievais Galego-Portuguesas, na qual se disponibiliza uma lista dos provérbios que ocorrem na lírica profana trovadoresca. Crédito da imagem: NCultura, 20/01/2019.

2. Ainda na rubrica Montra de Livros, dá-se conta de duas publicações recentes que reúnem estudos linguísticos sobre o português: Gramática e Texto. Contextos, usos e propostas didáticas, volume dedicado à investigação desenvolvida no âmbito da linguística textual e discursiva; e Saberes em sociolinguística: trilha, demandas e proposições, um conjunto de nove trabalhos à volta da sociolinguística brasileira.

3. A lendária e muito avisada máxima «conhece-te a ti mesmo» contém um pleonasmo? Não, como se explica numa das seis novas respostas do Consultório, nas quais são tratados ainda os seguintes tópicos: a pronúncia do nome obreia, a estrutura da frase «estou com medo de entrar no avião», a identificação de um modificador do grupo verbal, os significados de pilrito e a construção de grau numa frase.

4. «Não é só o português que os brasileiros falam – musical, gracioso, sexy, humorístico, brincalhão, metediço, encantador – mas a maneira como eles vão construindo a língua à medida que falam» que cativam o escritor português Miguel Esteves Cardoso, que elogia a criatividade dos brasileirismos, em crónica incluída no jornal Público de 19/11/2023 e transcrita com a devida vénia nas Diversidades.

5.  «Isto da crise deixa-me confuso porque nos mexeram no vocabulário» – confidencia ironicamente o escritor Afonso Reis Cabral, a propósito da crise política em Portugal e de certa desordem vocabular decorrente, em crónica publicada no Jornal de Notícias em 22/11/2023 e devidamente atribuída em O Nosso idioma.

6. Do muito que se publica na Internet sobre a projeção mundial da língua portuguesa, dois destaques: um trabalho da jornalista brasileira Adelina Lima a respeito das 10 línguas mais faladas no mundo em 2023, elenco onde o português é o 6.º classificado; e o sucesso da tradução em inglês do romance A palavra que resta, do escritor brasileiro Stênio Gardel, que ganhou o National Book Award, um dos mais importantes prémios dos Estados Unidos da América.

7. Um registo de pesar pelo falecimento do encenador e ator Carlos Avillez, fundador do Teatro Experimental de Cascais, onde desenvolveu um trabalho notável, desenvolvendo uma dramaturgia baseada quer em obras de autores de língua portuguesa quer na tradução de textos de autores estrangeiros.

8. Os francesismos que circulam numa aldeia do distrito de Leiria dão o mote para o 3.ª episódio da série áudio Ciberdúvidas – o Podcast, que tem como anfitriãs Sara Mourato e Jessica Mendes, no âmbito da atividade do Laboratório de Competências Transversais do Iscte.

8. Quanto aos três dos programas que, na rádio pública portuguesa, são dedicados ao português:

– no Língua de Todos, difundido na RDP África, na sexta-feira, 24/11/2023 às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), fala-se do livro Migrações e Interculturalidade: Conhecer para intervir em Sala de Aula;

– no Páginas de Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 26/11/2023, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 2/12/2023 às 15h30*),  o convidado convidado é o professor Paulo Feytor Pinto (Centro de Estudos de Linguística Geral e Aplicada – CELGA-ILTEC, da U. Coimbra),  que propõe uma leitura intercultural do episódio  Chegada à Índia (canto VII, estrofes 16­-59), d'Os Lusíadas, e inclui-se um apontamento de Inês Gama, consultora do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, acerca do significado da expressão «andar à guna»;

– assinale-se, por último, Palavras Cruzadas, programa realizado por Dalila Carvalho e emitido pela Antena 2, de segunda à sexta-feira, às 09h50 e às 18h50*.

* Hora oficial de Portugal continental.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A Argentina foi a votos e elegeu como presidente o economista Javier Milei, conhecido pelas suas posições radicais. O homem que tomará a cargo o destino do povo argentino descreve-se como anarcocapitalista. A expressão, pouco corrente em Portugal, designa um tipo particular de capitalismo que se caracteriza por não ser regulado pelo Estado e pela defesa do mercado livre e do sistema de propriedade privada. Milei caracteriza-se ainda como um «liberal libertário», termo que refere uma corrente política defensora do individualismo e da liberdade económica e de mercado. A comunicação social apresenta-o como ultraliberal e ultradireitista. A curiosidade do léxico usado para definir os traços do novo presidente argentino passa pelo facto de as palavras que o integram apontarem para o campo semântico do extremismo, o que se refletirá eventualmente nas práticas políticas a encetar no novo cenário político. No âmbito da grafia das palavras em destaque, recordemos que, no quadro do Acordo Ortográfico de 1990, os termos anarcocapitalista, ultraliberal e ultradireitista deverão ser grafados como formas aglutinadas, o que significa que não levam hífen. Já a expressão «liberal libertário» deve ser escrita sem hífen a ligar as palavras que a constituem, visto que se trata de uma locução não consagrada pelo uso (cf. Base XVI, do AO90). Refira-se, por fim, que o termo ultradireita é equivalente à expressão «extrema direita» que, no português europeu, tem mais tradição de uso. 

Primeira imagem: Bandeira de Gadsden: por baixo da cascavel pode ler-se a frase «Não me pises». Esta foi uma das primeiras bandeiras adotadas pelos anarcocapitalistas. 

2. No Consultório analisa-se a forma como se pronuncia o e em palavras como mexo, fecho ou desço, para se concluir que existe oscilação nas práticas dos falantes. Esta resposta a uma dúvida colocada por um consulente do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa é acompanhada de outras nove: «Carta de prego e tradução de La Fontaine», «Se», «Mau/mal seria/era», «Pronomes átonos e os verbos esperar e morder», «O verbo significar seguido de oração subordinada», «O adjetivo desregulatório», «Costumar e a voz passiva», «Gerúndio: «qual fantasma, os olhos cintilando no escuro»» e «Tudo, antecedente do pronome relativo quanto».

3. Poderão os advérbios ter um complemento? E este complemento poderá ter uma natureza oracional? Estas questões dão mote à reflexão proposta pela professora Carla Marques (apontamento divulgado no programa Páginas de Português, na Antena 2). 

4. A diferença entre lembraste e lembras-te constitui uma dificuldade sentida por muitos falantes, tal como se assinala no Pelourinho, num apontamento do consultor Paulo J. S. Barata

5. Na sequência de uma análise sobre o uso do termo nega num texto jornalístico, José Mário Costa, cofundador do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa,  escreve sobre o uso da  informalidadevem discordar da avaliação aí proposta, num novo texto disponível na rubrica Controvérsias.

6. A professora universitária Dora Gago partilha com os seus leitores uma experiência de ensino na Faculdade de Letras da Universidade da República Oriental do Uruguai (partilhado com a devida vénia).

7. Um destaque final para a mesa-redonda Revisitar os clássicos em aulas do Ensino Básico e Secundário - III, com a presença de Adriana NogueiraAna Paula LoureiroPaulo Sérgio Ferreira, que terá lugar na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, no dia 24 de novembro de 2023, pelas 17h.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Portugal vive um período conturbado politicamente devido à demissão do primeiro-ministro António Costa e à anunciada dissolução da Assembleia da República. Esta reviravolta política foi desencadeada pela, assim designada, Operação influencer, da responsabilidade do Ministério Público, que levou a cabo uma investigação que lida com suspeitas de corrupção de vários membros do governos e de outras figuras com poder na sociedade civil, no âmbito dos negócios do hidrogénio e do lítio e dos assuntos relacionados com a empresa Start Campus. No plano da língua, observamos, uma vez mais, a preferência das entidades públicas pelas designações em inglês, selecionando palavras que, tal como em outros casos similares, têm, em língua portuguesa, um equivalente estável e já dicionarizado. Com efeito, o termo influencer é equivalente ao português influenciador, que pode ser usado ora como nome ora como adjetivo com o significado de «que ou quem influencia ou tem alguma espécie de influência sobre algo ou alguém» (Priberam), um significado que poderia ter bastado para habilitar a palavra a ser adotada para designar a operação. Aceitar o domínio excessivo da língua inglesa e ser, inclusive, cúmplice deste processo em nada contribui para a defesa da língua portuguesa e para a sua afirmação no plano internacional.

A questão do progressivo recurso ao inglês nas mais diversas áreas sociais tem sido muito discutida no Ciberdúvidas. Recordamos algumas aberturas que focaram o assunto: «Pressão anglófona em Portugal [...]», «A tradução de deepfake [...]», «A palavra media [...]», «[...], a tradução de bullying [...]», «dummy feminino [...]». 

2. O uso do substantivo nega num texto da comunicação social leva a consultora do Ciberdúvidas Sara Mourato a avaliar a adequação do recurso a um substantivo marcado pela informalidade nestes contextos, num apontamento disponível na rubrica Pelourinho.

3. A frase «Está um dia bom» tem sujeito? A questão colocada leva à análise de algumas estruturas copulativas, considerando ainda a ordem dos elementos na frase. Também de ordem sintática é a explicação do facto de o pronome átono lhe não ser precedido de preposição. A estas respostas vêm juntar-se ainda as seguintes: «O topónimo «serra da Marofa»», «A locução «de todo»», «Incómodo e inconveniente», «A expressão «a seu pedido»» e «A pronúncia de anéis».

4. Na Montra de Livros estão em destaque duas novas publicações:

Assim nasceu uma norma — pequena história da corrida linguística na Galiza entre 1970 e 1983, de José João Rodrigues (Através Editora);

– O número 10 da Revista da Associação Portuguesa de Linguística, uma edição organizada por Adelina CasteloAlexandra Fiéis e Cristina Flores

5. O Dia Nacional da Língua Gestual Portuguesa teve lugar a 15 de novembro tendo sido assinalado com inúmeros eventos de natureza muito distinta. Neste âmbito, o P3 (separata do jornal Público) divulgou uma reportagem sobre a primeira médica do Serviço Nacional de Saúde que usa língua gestual no seu consultório (partilhado com a devida vénia). 

6. Encontrar uma língua suficientemente simples e suficientemente acessível a todos os povos é um desejo muito antigo, que levou ao desenvolvimento de inúmeras ações entre as quais se conta a criação de uma língua como o esperanto. As tensões neste campo são, no entanto, inúmeras, como nos dá conta, neste texto, o advogado e interlinguista Miguel Faria de Bastos

7.  Entre os eventos de relevo para a língua, destaque para os seguintes:

Jornada dos Dicionários - Usos didáticos do dicionário, evento híbrido com lugar hoje em Lisboa e à distância (17 de novembro, na Universidade Nova de Lisboa);

– Lançamento da versão física do Dicionário Kaiowá-Português, que reúne mais de 6000 palavras do idioma indígena, organizado por Graciela Chamorro, com a chancela da editora brasileira Javali.

8. Uma referência final aos novos temas dos programas à volta da língua portuguesa transmitidos pela rádio pública de Portugal:

– Em Língua de Todos, difundido na RDP África, na sexta-feira, 17/11/2023, às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), a professora e linguista Sandra Duarte Tavares reflete sobre os processos didáticos que podem conduzir os alunos ao aperfeiçoamento da sua competência linguística;

– O projeto Pela mão da Literatura vejo o mundo, que pretende motivar alunos sobredotados para a literatura, é o tema da conversa com o professor de Português e Espanhol André Matias no programa Páginas de Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 19/11/2023, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 25/11/2023 às 15h30*);

– De 20 a 24 de novembro, as emissões de Palavras Cruzadas, programa realizado por Dalila Carvalho e transmitido na Antena 2, são dedicadas à linguagem na economia com o economista e professor na Universidade Stern de Nova Iorque, Luís Cabral (segunda a sexta, às 09h50* e às 18h50*).

*Hora oficial de Portugal continental.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Em Lisboa, de 13  a 16 de novembro, tem lugar mais uma edição da Web Summit – «apesar das controvérsias, apesar dos boicotes», como observou um visitante brasileiro, em português (ver e ouvir apontamento da RTP Notícias, em 13/11/2023). O encontro tem projeção internacional e visa a inovação tecnológica e os seus negócios, áreas cuja língua veicular é geralmente o inglês. Mas, e apesar das promessas de promoção linguística, o facto é que o idioma da cidade anfitriã, continua a primar pela discrição e até mesmo pela ausência. Basta visualizar as páginas da plataforma digital do evento.

À volta das Web Summit, realizadas em Lisboa desde 2016, sugere-se a leitura dos seguintes conteúdos: "Web Summit, start-up e feature:como usar em português?", "10 novas respostas no consultório do Ciberdúvidas, a Web Summit 2017 e (um)a Urban Beach à beira-Tejo", "Uma Web Summit que angliciza Lisboa", "Falar do futuro pós-pandemia, o termo orçamento, o conceito de língua materna e sobre a Web Summit 2021 em Lisboa", "A dinâmica do idioma no Brasil, a glotofobia, uma vírgula de Sophia, o fruto pera-melão e o pluricentrismo no ensino da língua", "A evolução de plafom, o cinema no Cuidado com a Língua!, a invasão linguística da Web Summit e os alertas de Jorge de Sena".

2. A pressão do inglês exerce-se, por exemplo, através dos falsos amigos, que mesmo falantes bilingues experientes deixam inadvertidamente escapar. No Pelourinho, ilustra-se esta situação com a tradução errónea do inglês casualty («vítima, baixa») por casualidade, nos comentários em direto sobre a guerra de Gaza num canal de televisão em Portugal. O consultor Paulo J. S. Barata regista e esclarece a confusão.

3. A frase «comprou um presente para levar para a festa» estará incorreta? Repetir palavras na mesma frase, como é o caso de para no exemplo, é erro de gramática? No Consultório, responde-se a esta dúvida e a mais sete, num total de oito novas respostas abrangendo os seguintes tópicos: as orações coordenadas copulativas, o adjetivo educativo, o uso de entender + por («entender pela prorrogação»), os nomes frei, freira e sóror, o apelido Charneco, o topónimo Timpeira e o momento da resolução num conto de  Eça de Queirós.

4. Em O Nosso Idioma, a confusão frequente mas evitável entre as preposições sob e sobre é o tema de um apontamento da professora Carla Marques. Na mesma rubrica, os tratamentos honoríficos usados no foro jurídico motivam um texto do jurista Miguel Faria de Bastos, que, no final, menciona o conceito de heterarquia; e, a propósito deste termo e da  sua transposição para os media, inclui-se um artigo de 2008, do jornalista Carlos Castilho, que define heterarquia como «uma forma de trabalho coletivo onde não há um superior e nem uma agenda ou método imposto de cima para baixo, por meio de chefias hierarquizadas».

5. Moçambique é um país multilingue, onde, além do português, coexistem muitas outras línguas predominantemente do ramo bantu da família linguística Níger-Congo. Como lidam as autoridades e as comunidades académicas com esta diversidade? Em Lusofonias, transcreve-se, com a devida vénia, o artigo que, publicado no Diário de Notícias (13/11/2023), a professora universitária e linguista Margarita Correia dedicou às políticas linguísticas de Moçambique.

6. Nas Notícias, dá-se conta do projeto FLIPP, ao qual se associa uma plataforma de ferramentas e cursos que visam a transformação digital das escolas. Trata-se de uma iniciativa com a participação de equipas académicas da Turquia, Grécia, Kosovo, Itália e Portugal, no âmbito do programa europeu Erasmus+. Entre os cursos disponíveis, destaca-se o contributo da representação portuguesa, intitulado "Introdução à sala de Aula Invertida", com coordenação de Helena Belchior-Rocha, professora auxiliar do Iscte.

7. Outros registos da atualidade, a respeito da língua portuguesa:

 – Foi reeditada a primeira revista de culinária de língua portuguesa – Annona ou Misto Curioso –, que teve 36 fascículos entre 1836 e 1837.

– Para responder às necessidade do ensino do português no seu país, o embaixador da Guiné Equatorial em Portugal pede a criação de um corpo próprio de docentes no seio do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (ver Correio da Manhã, 12/11/2023).

– Salientam-se igualmente as declarações da linguista Margarita Correia, defendendo que as crianças da Guiné-Bissau devem ser escolarizadas em crioulo e aprender o português como língua estrangeira, de modo a elevar o nível de literacia e contribuir para o desenvolvimento pessoal e social guineense (País ao Minuto, 13/11/2023).

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Em Portugal, no meio de perplexidade geral, a vida política tem uma reviravolta, com a demissão do primeiro-ministro, a dissolução da Assembleia da República (AR) e a convocação de eleições legislativas antecipadas para 10 de março (sobre a crise e o seu contexto, mais informação aquiaqui e aqui). À palavra eleição, dedicou-se nestas páginas um apontamento há menos de dois anos, nas vésperas do ato eleitoral de 2022, que deu ao Partido Socialista uma maioria absoluta que, afinal, não foi bastante para garantir estabilidade governativa. Sobre antecipada, trata-se do uso adjetival do particípio passado de antecipar, verbo originário do latim anticipare, literalmente «tomar mais cedo», que se atesta em português a partir do século XV. Antecipar aparece na lista dos usos problemáticos, quando significa «prever, antever», como respondeu o saudoso consultor Fernando Peixoto da Fonseca, observando: «Como sempre, qualquer dia tal emprego deixa de ser corrente para passar a correto [...].» Se é verdade que, no dicionário de Morais (1789), a antecipar não se associa essa aceção, no de Cândido de Figueiredo (1899) já ela faz parte da definição do verbo, embora sem abonações. Em todo o caso, a quem diga, por exemplo, «ninguém antecipou um desfecho assim» pode sugerir-se esta outra frase: «Ninguém previu um desfecho assim.» 

Na imagem, o Palácio de São Bento, sede da Assembleia da República, visto da Travessa da Arrochela, em Lisboa (fonte: Wikipédia).

2. A comunicação nas redes sociais enreda-se frequentemente em polémicas inúteis e mal-entendidos motivados por indivíduos empenhados em causar confusão. A este tipo de comportamento aplica-se trolar, verbo derivado do inglês troll, que, em O Nosso idioma, é tema de uma reflexão da consultora Inês Gama, a propósito de um programa do canal de televisão português SIC Notícias transmitido em 03/10/2023. Na mesma rubrica, transcrevem-se com a devida vénia um artigo da jornalista Dora Alexandra, sobre termos corretos e incorretos para se falar de deficiência, e uma crónica do jornalista Nuno Pacheco acerca do programa radiofónico Assim Se Faz Portugal (TSF), cujas emissões têm escalpelizado os modismos e bordões recorrentes no discurso público.

3. A frase «ele referiu que as atribuições são criteriosas» estará correta? No discurso indireto, por uma questão de congruência, não será melhor «ele referiu que as atribuições eram criteriosas», com ambos os verbos no passado («referiu» e «eram»)? Esta é uma das sete perguntas da atualização do Consultório, a qual abrange outros tópicos: as formas verbais podemos e pudemos, os particípios passados do correto do verbo adstringir, os termos enclave e vigilantismo, os predicados verbais e a frase «não sei que te diga».

4. A discussão à volta do masculino gramatical referido a mulheres também vai acalorada noutras línguas que dispõem de idêntica estratégia. Em Diversidades, traduz-se, devidamente atribuído, um trabalho publicado no jornal britânico The Guardian em 04/11/2023, a respeito do modo como têm evoluído as propostas de linguagem inclusiva quanto ao género gramatical na França, Alemanha, Espanha e Itália.

5. Faleceu em 09/11/2023 o ensaísta e poeta Manuel Gusmão (Évora, 1945), figura cimeira do meio literário e académico português. Foi galardoado com o Prémio PEN Clube Português (1997 e 2009), o Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores (2001), o Prémio de Poesia Luís Miguel Nava (2001), o Prémio Vergílio Ferreira (2005), o Prémio de Poesia António Gedeão (2014) e o Grande Prémio de Ensaio Eduardo Prado Coelho (2010). Teve ação notável como professor universitário na área dos Estudos Comparados e da Teoria da Literatura. Distinguiu-se ainda como redator das revistas O Tempo e o Modo, Letras e Artes, CríticaSeara Nova e fez parte do conselho editorial da revista Vértice (fonte da informação: Nota do Secretariado do Comité Central do PCP em 09/11/2023).

6. Da atualidade literária, destaca-se a escritora portuguesa Lídia Jorge que, com o seu romance Misericórdia, arrebatou num intervalo de poucos dias o Prémio Fernando Namora e, ex-aequo, o prémio Médicis Étranger, organizado em França. Refira-se igualmente a 12.ª Conferência de Literatura em Língua Portuguesa, que decorrerá em 17/11/2023 na Universidade de Massachusetts Boston subordinada ao tema “Interartes na Literatura Lusófona” (mais informação na página do Camões, I. P.).

7. Quanto aos três programas que a rádio pública portuguesa dedica à língua:

– Em Língua de Todos, difundido na RDP África, na sexta-feira, 10/11/2023, às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), entrevista-se Gilvan Muller de Oliveira, diretor da cátedra UNESCO em Políticas Linguísticas para o Multilinguismo, sediada na Universidade Federal de Santa Catarina (Brasil), sobre os projetos desenvolvidos por esta instituição.

– Em Páginas do Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 12 de novembro, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 17 de novembro às 15h30*), conversa-se com Regina Duarte, comissária do Plano Nacional de Leitura (PLN), a respeito da Conferência PLN 2023, que se realizou em 24/11/2023. Inclui-se ainda o apontamento gramatical da professora Carla Marques.

– Mencione-se ainda Palavras Cruzadas, programa realizado por Dalila Carvalho e transmitido na Antena 2, de segunda a sexta-feira.

*Hora oficial de Portugal continental.

8. Um registo final para o 2.º episódio do podcast do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, dirigido aos estudantes do Iscte mas também acessível a quantos se interessam por temas do idioma português.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Uma atenção particular aos textos da comunicação social permite identificar termos como OE, PIB, PRR, IVA, IUC, IRS, SNS, TAP, IPSS, entre muitos outros, um conjunto de estruturas truncadas, de significação por vezes opaca, que exigem aos falantes um esforço acrescido para acompanhar a construção da significação. Formas como estas recebem a designação de sigla ou de acrónimo, expressões que designam processos de redução de palavras, uma estratégia linguística cada vez mais frequente por permitir resolver problemas associados à comunicação atual: a falta de tempo, a falta de espaço e a profusão de novas realidades e organismos. Entre os processos de truncação, encontramos a siglação (formação de siglas), que permite abreviar uma expressão recorrendo à letra inicial ou a um conjunto de letras das palavras envolvidas. A pronúncia da sigla faz-se soletrando letra a letra, como em OE (redução de «orçamento de estado»), PRR («plano de recuperação e resiliência»), SNS («serviço nacional de saúde»), IRS («imposto sobre o rendimento acrescido») ou IPSS («instituições particulares de solidariedade social»), o que acontece porque o conjunto de letras resultante da truncação não permite uma leitura silábica, como se de uma palavra se tratasse. Já a acronímia (formação de um acrónimo) socorre-se de processos de formação de palavras similares aos das siglas, mas o resultado permite pronunciar o vocábulo obtido como uma palavra, o que se verifica em PIB («produto interno bruto»), IVA («imposto sobre o valor acrescentado») ou TAP («transportadora aérea portuguesa»). As siglas e os acrónimos escrevem-se em maiúsculas e sem pontos (ver aqui). Todavia, em certos casos, estas palavras vulgarizam-se e adquirem um estatuto de palavra autónoma e, como tal, passam a grafar-se com letras minúsculas, como aconteceu com covid (acrónimo formado a partir do inglês "coronavirus disease"), laser (do inglês "light amplification by stimulated emission of radiation"), Nasa (do inglês "National Aeronautics and Space Administration") ou sida (de "Síndrome da Imunodeficiência Adquirida»). 

2.  A atualização do Consultório abre com a análise dos sentidos do adjetivo jesuítico e da possibilidade de este vocábulo ter surgido no contexto da perseguição aos jesuítas na época pombalina. Poderão ainda ser consultadas respostas relacionadas com a toponímia («O topónimo Leitões e o seu gentílico»), com questões lexicais («Botocúndia botocudo», «Envolvência e envolvimento») e com aspetos sintático-semânticos («Regência: «namorar com»», «Sentido correlativo e conectivos correlativos», «Continuo a fazer a viagem como sempre fiz», «Modalidades epistémica e deôntica: «Podemos contactar com vários animais»»).

3. O substantivo bazar e o verbo bazar terão a mesma etimologia? Neste apontamento divulgado no programa da Antena 2, Páginas de Português, a professora Carla Marques apresenta uma resposta. 

4. A vinda de Salikoko S. Mufwene, linguista e professor da Universidade de Chicago, a Portugal motiva uma reflexão que envolve a questão das metáforas conceptuais e a ecologia da língua, num artigo da também linguista e professora universitária portuguesa Margarita Correia (aqui partilhado com a devida vénia).

5. A definição de metas para a promoção da influência e do prestígio do Instituto Cervantes contrasta com a forma de encarar a situação do lado português. Este é um estado de coisas que urge alterar, explorando, por exemplo, o potencial da proximidade entre o espanhol e o português, tal como se propõe no artigo do jornalista Leonídio Paulo Ferreira (partilhado com a devida vénia).

6. Entre eventos e notícias relevantes, destacamos os seguintes:

– A atribuição do Prémio de Literatura dstangola/Camões ao escritor angolano João Melo, pela obra Diário do Medo  (mais informação em Ver Angola, 06/11/2023).

IX JORNADAS DE LÍNGUA PORTUGUESA - Investigação e Ensino, Educação Linguística e Literária para a Juventude e a Sustentabilidade em Cabo Verde, organizadas pela Cátedra Eugénio Tavares de Língua Portuguesa, a decorrer entre os dias 06 e 10 de novembro;

– 16º ENCONTRO MENSAL sobre DISCURSO ACADÉMICO (EMDA), com lugar a 13 de novembro (sessão zoom); 

– Jornadas dos dicionários 2023 (4.ª edição) - "Usos didáticos do dicionário", evento híbrido a realizar na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa, campus de Campolide, no dia 17 de novembro de 2023.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Na sequência da Abertura de 31/11/2023, faz-se referência neste dia à situação linguística do Estado da Palestina, onde o idioma maioritário e oficial é o árabe, que, como se sabe, é língua de grande diversidade interna. Além da modalidade do Alcorão e da literatura clássica, existe a variedade padrão moderna – a chamada Fuṣḥā al-ʻAṣr (فصحى العصر ) –, a qual permite aos palestinianos comunicar com os arabófonos de outros países, do Magrebe ao Maxerreque. Entre outras línguas faladas no país, contam-se, além do hebraico, o árabe beduíno (badawī, em árabe) e o aramaico. Contudo, coloquialmente, os palestinianos expressam-se em variedades do ramo dialetal levantino, nem sempre inteligíveis para falantes de outras regiões árabes. Acrescente-se que as notícias a respeito do quotidiano dramático do povo palestiniano têm popularizado o nome árabe Nakba (النكبة), «desastre, catástrofe», em contraponto à Shoa da memória judaica.

Para mais informação, consulte-se no Ciberdúvidas o trabalho intitulado "Um árabe para todos", do jornalista Akram Belkaïd, e assista-se ao vídeo "Existem várias línguas árabes?", do tradutor e divulgador Marco Neves. Para uma descrição da situação linguística do estado da Palestina, recomenda-se o Ethnologue (em inglês).

2. As declarações do secretário geral da ONU, António Guterres, em 24/10/2023 – donde se destaca a frase «é importante reconhecer que os ataques do Hamas não aconteceram num vácuo» – causaram grande crispação no meio diplomático de Israel. Em Controvérsias, a consultora Inês Gama propõe uma reflexão sobre a semântica da linguagem e do discurso político.

3. Em O Nosso Idioma, dois apontamentos: a respeito de um erro («"vão" haver novidades»), supostamente proferido na série televisiva portuguesa Morangos com Açúcar, um comentário da consultora Sara Mourato; e, novamente acerca de palavras quase só presentes em expressões idiomáticas, uma breve lista do linguista brasileiro Aldo Bizzocchi.

4. Que significado tem ao certo o verbo dever num texto jurídico? É esta uma das questões recebidas no Consultório, onde igualmente se abordam os seguintes tópicos: o topónimo belga Spa; os sinónimos viver e morar; a diferença entre aposto e predicativo do sujeito; os tritongos na fonética do português; e as vírgulas associadas à locução «ou antes».

5. Escrever à mão e ter a chamada «letra bonita» envolvem competências não despiciendas na aprendizagem da leitura e da escrita. Na rubrica Ensino, disponibiliza-se um artigo de opinião da pedagoga Inês Ferraz, que sublinha (Público, 06/10/2023): «Caligrafar não é apenas desenhar, já que existe uma intenção linguística, ou seja, pretende-se deixar uma mensagem no papel.»

No âmbito da psicologia e da pedagogia, escute-se o episódio de 02/11/2023 que o programa 90 Segundos de Ciência (Antena 1) dedicou ao desenvolvimento de um projeto da Universidade do Minho para perceber a evolução da linguagem das crianças durante a pandemia.

6. O que é um afropolitano? A palavra é decalque do inglês afropolitan, termo cunhado pela escritora afro-americana Taiye Selasi para designar o africano negro globalizado e cosmopolita. Em artigo incluído no jornal Público (01/11/2023)  e transcrito com a devida vénia nas Diversidades, o ensaísta e programador cultural António Pinto Ribeiro menciona esta palavra numa reflexão sobre o significado de uma exposição de fotografia africana contemporânea que está patente na Tate Modern, em Londres, até 14/01/2023. 

7. Registos diversos com interesse cultural e linguístico: até 12 de novembro, em Braga, o Festival Literário Utopia (mais informação aqui); o trabalho que o professor universitário e ensaísta Onésimo Teotónio de Almeida escreveu sobre o uso dos vocábulos descobrimento e achamento na historiografia da colonização portuguesa do Brasil (cf. Observatório da Língua Portuguesa); e um comentário do linguista Fernando Venâncio sobre a contaminação semântica do português eventualmente pelo inglês eventually (cf. ibidem).

Cf. «E um verso em branco à espera de futuro»

8. Entre os programas que a rádio pública de Portugal dedica à língua portuguesa, salientam-se:

– Em Língua de Todos, difundido na RDP África, na sexta-feira, 03/10/202 às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*) conclui-se a emissão da entrevista com Ana Paula Fernandes, presidente do Camões, I. P., sobre a cooperação entre Portugal e os países africanos de língua oficial portuguesa, bem como acerca da promoção e difusão do português nestes países.

– Os projetos da Cátedra UNESCO em Políticas Linguísticas para o Multilinguismo, sediada na Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil, são o tema da conversa com o seu diretor, Gilvan Müller de Oliveira, transmitida em Páginas do Português, na Antena 2, no domingo, 05/10/2023, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 11/10/2023 às 15h30*).

– Em Palavras Cruzadas, realizado por Dalila Carvalho e transmitido igualmente na Antena 2 (de segunda a sexta-feira, às 09h50* e às 18h50*), o tema das emissões de 6 a 10/11/2023 é a comunicação com pessoas com deficiência, a propósito da publicação de Como (e quando) falar de deficiência? Um guia para profissionais de comunicação cultural e jornalistas pela associação cultural Acesso Cultura.


*Hora oficial de Portugal continental.