Com A História Global da Literatura Portuguesa, um lançamento da editora Temas e Debates no final de 2024, propõe-se uma visão diferente e aberta da literatura portuguesa, na perspetiva das trocas culturais com outros espaços, da Idade Média à contemporaneidade.
Como se assinala na sinopse da contracapa, são «[c]em capítulos escritos por cem especialistas [que] fazem nesta obra uma síntese abrangente da herança literária portuguesa na perspetiva do novo ideário da história global, aqui aplicado pela primeira vez à história da literatura portuguesa.» Duas equipas, numa relação de hierarquia, orientaram a elaboração do livro: a da direção, composta por Annabela Rita, Isabel Ponce de Leão, José Eduardo Franco e Miguel Real; e a da coordenação, que coube a Carlos F. Clamote Carreto, Isabel Morujão, Micaela Ramón, Maria Lusía Malato, Luísa Paolinelli, Dionísio Vila Maior e Maria do Carmo Cardoso Mendes.
O prefácio (pp. 15-19) é de José Carlos Seabra Pereira (Centro Interuniversitário de Estudos Camonianos da Universidade de Coimbra), que realça a «estrutura inabitual» desta obra, «qualificadamente insólita, que nem teme afastar-se do regime tradicional de narrativa e anotação contínuas, nem o ignora no palimpsesto do seu horizonte de inscrição». Na Introdução Geral (pp. 21-25), os quatro diretores do projeto na origem do livro realçam que a história da literatura só tem a beneficiar com a «emergência de uma nova historiografia que assume o "global" como chave hermenêutica para revisitar e repensar a história dos vários campos da produção humana»; defendem que esta perspetiva «implica superar um método de conhecimento "nacionalista" e fechado através de um outro que tenha por foco o global». Consideram, no entanto, que uma história global não é uma história totalizante, e veem o presente trabalho como uma proposta "possibilitante", que «[t]em como fito primordial abrir caminhos novos para explorar uma imensidão de análises», capaz de dar acesso «[à] riqueza do campo literário como área de excelência da criação humana e a mais reveladora das múltiplas dimensões da sua dimensão». Para tanto, os verbetes reunidos na História Global da Literatura Portuguesa, cada qual incluindo uma breve bibliografia, têm «sempre em conta a desejada harmonia entre o local e o global (incidência da obra/autor no vasto território da literatura/traduções comentários globais)» (p. 24).
As 719 páginas do volume agora publicado repartem-se por sete secções, ou melhor, "idades", conforme propõe a direção (p. 24) do projeto, as quais configuram uma proposta de periodização a história internacionalmente integrada da literatura portuguesa, a que subjaz uma cronologia, de perfil mais tradicional, por períodos culturais: "Ressurgências", relativa à Idade Média, desde os primórdios literários e não literários em galego-português aos textos que definem uma fase linguística e literária já claramente portuguesa (pp. 27-114); "Humaniores litterae", coincidente como o Renascimento e a afirmação do português como língua de cultura capaz de ombrear com outras no plano literário (pp. 115-200); "Entre as sombras e o esplendor", secção dedicada ao Maneirismo e ao Barroco, num período que vai de finais do século XVI aos começos do século XVIII (pp. 201- 286); "O espírito das Luzes", que dá conta das produções literárias do século XVIII e de começos do século XIX (pp. 287-378)); "Decadência e regeneração", referente ao Romantismo e ao Realismo (pp. 379-472); "Com golpe de asa", que cobre os movimentos literários que marcam o século XX (pp. pp. 473-582); e "Primavera fulgurante", onde se abordam os movimentos e as produções literárias que marcaram em Portugal os últimos 50 anos, iniciados com a revolução do 25 de Abril de 1974 (pp. 583-708). Um índice remissivo e a lista de nomes da Comissão Científica Internacional fecham o livro.
Perante a diversidade das épocas abordadas e das intertextualidades identificadas, a que se associam estilos muito diferentes na abordagem dos temas, esta História Global pode afigurar-se surpreendemente acessível à consulta de um público minimamente familiarizado com os estudos literários e com a história da cultura. Por convidar a abrir fronteiras, é também um empreendimento louvável, quando se pensa que nos últimos anos as sociedades e os Estados parecem retomar visões nacionalistas e maniqueístas da vida humana.
Este é um espaço de esclarecimento, informação, debate e promoção da língua portuguesa, numa perspetiva de afirmação dos valores culturais dos oito países de língua oficial portuguesa, fundado em 1997. Na diversidade de todos, o mesmo mar por onde navegamos e nos reconhecemos.
Se pretende receber notificações de cada vez que um conteúdo do Ciberdúvidas é atualizado, subscreva as notificações clicando no botão Subscrever notificações