Fernando Pestana - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Fernando Pestana
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Fernando Pestana é um gramático e professor de Língua Portuguesa formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e mestre em Linguística pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Atua há duas décadas no ensino de gramática voltado para concursos públicos e, atualmente, em um curso de formação para professores de Português.

 
Textos publicados pelo autor
Língua brasileira: existe mesmo?
Em defesa do contínuo da língua portuguesa

«Se o critério central é a ininteligibilidade mútua por razões estruturais, falha o linguista que defende serem o PB e o PE sistemas linguísticos autônomos ainda mais dramaticamente ao cruzar os séculos do que ao atravessar o Atlântico» – sustenta o gramático brasileiro Fernando Pestana nesta defesa da unidade da língua portuguesa, apesar das diferenças entre a variedade do Brasil e a de Portugal.

A influência tupi no português do Brasil
A visão do linguista Glastone Chaves de Melo

«O linguista [Glastone Chaves de Melo] critica tanto os estudiosos portugueses, que ignoravam os avanços da filologia brasileira, quanto os brasileiros que, movidos por lusofobia, desejavam (desejam?) repudiar o legado europeu e advogar uma independência linguística impossível» – sublinha o gramático Fernando Pestana neste artigo em que resume e comenta a posição do referido linguista brasileiro relativamente ao impacto das línguas do grupo tupi na evolução do português do Brasil. Texto incluído em 20/10/2020 no mural Língua e Tradição (Facebook) e aqui transcrito com a devida vénia.

Pergunta:

Na frase «Ser amado e ser egoísta são coisas diferentes»:

1) Quantas orações há frase?

2) Os termos «ser amado e ser egoísta» são orações subordinadas substantivas subjetivas?

3) Caso sejam subjetivas, por que o verbo da oração principal está na terceira pessoa do plural são?

Obrigado.

Resposta:

Respondendo-se objetivamente à pergunta do consulente*, temos:

1) Há três orações: «ser amado», «ser egoísta», «são coisas diferentes».

2) Sim, é um sujeito composto (oracional) formado por duas orações subordinadas substantivas subjetivas reduzidas de infinitivo.

3) O verbo ser tem uma concordância especial, podendo concordar com o núcleo do predicativo do sujeito quando este é um nome plural (no caso, a palavra coisas), por isso a construção trazida pelo consulente está correta.

Sempre às ordens!

 

*Por ser brasileiro o consulente, foi empregada a nomenclatura gramatical tradicional do Brasil. 

Pergunta:

1. «Ela é linda, linda.»

2. «Ela é uma senhora diretora.»

3. «Ela é linda de morrer.»

Nas frases acima, há superlativo absoluto? Caso haja, ele é sintético? Ou analítico? Ou qual grau está?

Obrigado.

Resposta:

No caso dos adjetivos, o grau superlativo absoluto analítico é uma das formas de expressar a intensidade máxima de uma característica atribuída a um substantivo – isto é, ele indica que algo tem a característica em elevado grau, sem comparação com outros seres. Formalmente, isso se dá por meio do uso de uma palavra (normalmente um advérbio de intensidade) antes do adjetivo: muito bonito, bem chateado, totalmente triste, etc.

No entanto, existem formas estilísticas para constituir o grau superlativo absoluto analítico: seja pela repetição do adjetivo: Ela é linda, linda; seja por símile: Ela é branca como neve; seja por expressão idiomática: Ele é feio que dói, Ele é bonito à beça, Ela é podre de rica, Ela é linda de morrer.

Quanto à expressão «um(a) senhor(a)» para intensificar o sentido de um substantivo («Ela é uma senhora diretora», no sentido de «Ela é uma excelente diretora»), esta seria uma forma estilística de grau aumentativo do substantivo. Para usarmos esse mesmo recurso de gradação com um verdadeiro adjetivo, poderíamos propor a seguinte frase: «Hoje está um senhor frio, não é?», que equivaleria a «Hoje está muito frio, não é?»

Sempre às ordens!

Pergunta:

Li diversos textos sobre o assunto (inclusive um dos Senhores) e, com a leitura dos textos, fica claro que o entendimento é: neologismo é uma coisa, e estrangeirismo é outra.

Porém... bate uma dúvida cruel: quando aportuguesamos uma palavra, não estamos diante de um neologismo?

Não dá para entender xampu, que é da gente como estrangeirismo.

O gramático Fernando Pestana cita que alguns gramáticos consideram os estrangeirismos como neologismos:

«Além disso, muitos gramáticos entendem que os estrangeirismos são neologismos, uma vez que palavras novas (mesmo que estrangeiras) podem ser incorporadas à nossa língua.»

Entretanto eu nunca vi esses gramáticos! Na gramática do autor citado, ele também faz a distinção de um termo para outro e cita também que o estrangeirismo também pode ser adaptado, ou seja, ele parece ser contrário a minha "estranha" visão.

Obs.: Até a palavra estrangeira, quando passa a ser usada de maneira inédita pelos falantes de português, eu acho que pode ser uma espécie de neologismo.

Podem me ajudar? 

Resposta:

Quando uma palavra estrangeira é (ou não) aportuguesada (ex.: xampu < shampoo; xou < show), só deixa de ser sentida como um neologismo quando já realmente incorporada ao nosso vernáculo, cuja verificação se faz em consulta aos dicionários de referência.

Para a plena resposta à dúvida do consulente, que exigiria extensa explanação, sugerimos consulta ao tópico "17.6 Neologia", da Gramática Houaiss da Língua Portuguesa (2008), de José Carlos de Azeredo, que diz: «A neologia compreende criações vernáculas e empréstimos a outras línguas, os estrangeirismos.» 

Além dessa fonte, são estes alguns estudiosos aludidos por Fernando Pestana que consideram estarem os estrangeirismos (empréstimos linguísticos) na categoria de neologismos – o ano entre parênteses corresponde à edição consultada de suas obras-primas:

– Manuel Pacheco da Silva Jr. (1878)
– João Ribeiro (1889) 
– Alfredo Gomes (1913) 
– Maximino Maciel (1914) 
– Mário Barreto (1922) 
– Eduardo Carlos Pereira (1945...