1. O dia de Santo António, santo de devoção popular e por muitos considerado padroeiro da cidade de Lisboa, é celebrado a 13 de junho, dia do feriado da capital portuguesa, marcado por festividades populares. Tradicionalmente, Santo António é conhecido como casamenteiro, fama que a tradição perpetuou burilando frases e quadras alusivas aos seus poderes no campo amoroso. Recordamos aqui algumas delas:
«Santo António, meu querido, o que peço em segredo é um marido.»
ou
«Não precisa de altar
O nosso Santo Antoninho
No coração pode ficar
Fazer dele o seu cantinho.
Oh, manjerico bem cheiroso
Pelo regar e pôr ao luar
Dá-lhe um rapaz bem jeitoso
Para com ela se casar.»
Primeira imagem: Santo António de Pádua, de Kessler (1650/60)
A influência deste santo manifesta-se também na literatura portuguesa. O bem conhecido "Sermão de Santo António aos peixes", de Padre António Vieira, celebra as aclamadas qualidades oratórias do santo, que são apresentadas como modelo de pureza e retidão. O dia dedicado a Santo António é também motivo para reler algumas das respostas que passaram pelo Ciberdúvidas relacionadas com a temática: "Frase sobre Santo António de Lisboa", "Santo / São / Sã", "Abreviatura de santo: Sto, Sto. e S.to".
Devido ao feriado de 13 de junho, dedicado a Santo António, em Lisboa, a próxima atualização do Ciberdúvidas fica marcada para dia 17 de junho de 2019.
2. A história de uma língua desenha-se num percurso ancorado na construção de novas palavras e no alargamento dos seus sentidos. O ensaio intitulado "Quando a Língua Portuguesa encontrou Homero e a Ilíada", da autoria da investigadora brasileira Tâmara Kovacs Rocha, dá-nos a conhecer a importância da ação dos poetas na introdução de termos que estes cunharam a partir do latim e do grego, fazendo uso de processos linguísticos nem sempre bem recebidos pelos defensores do conceito de "língua pura". Neste percurso de construção da língua, as primeiras traduções dos textos do poeta grego Homero mostram claramente o contributo criativo dos poetas para o enriquecimento e maturidade da língua portuguesa. Também a professora e investigadora brasileira Adrienne Morelato, num ensaio sobre a língua portuguesa, percorre o caminho da evolução do português, desde a sua origem galega até à aventura marítima, demonstrando como esta língua se fez e cresceu às mãos dos poetas que a aprofundaram para dizer os seus sentimentos e desejos, o fado e a descoberta de novos mundos.
3. A história de uma língua acompanha também o percurso do seu povo e a sua própria ação. Nesta linha, João Miguel Tavares, presidente da Comissão Organizadora do 10 de Junho, veio, num discurso que gerou alguma polémica, defender que Portugal tem responsabilidade histórica para com os habitantes das antigas colónias, muitos dos quais têm como língua materna o crioulo. Este facto, associado à ideia de que estamos perante uma classe social desprotegida, levou-o a defender o ensino em crioulo cabo-verdiano nos primeiros anos de escolaridade em Portugal e em Cabo Verde. O Presidente da República português, Marcelo Rebelo de Sousa, em reação a esta posição, assumiu a defesa da língua portuguesa, recordando que «a língua portuguesa é um instrumento universal fundamental» e um «trunfo essencial» no plano internacional (ver notícias aqui e aqui).
4. A tessitura desta língua que se construiu ao longo de séculos envolve vários planos que se materializam numa rede complexa de camadas que envolvem fonética, morfologia, sintaxe, semântica e pragmática, entre outros domínios. Todos estes planos são mobilizados pelos falantes, que se apropriam da língua e a atualizam quase automaticamente. Todavia, é frequente que a própria língua exija uma atitude de reflexão, motivada pelas dificuldades que oferece aos seus falantes. Estes fenómenos relacionados com a consciência metalinguística justificam muitas das questões que os consulentes colocam ao Ciberdúvidas. Na presente atualização do Consultório, dúvidas relacionadas com a ortoépia (Como se pronuncia acrobata?), com as regências verbais (Quais as regências do verbo transferir? e do verbo mirar?), com a correção sintática (Como usar o advérbio eis com pronomes pessoais?) e com a classificação de funções sintáticas (Qual a função sintática do constituinte preposicionado que acompanha o verbo desembarcar? E de dia na frase «Já é dia»?).
5. A importância do contributo de alguns escritores para o enriquecimento de uma língua leva, não raro, a que estes sejam considerados "génios". É exatamente a atribuição deste epíteto à escritora Agustina Bessa-Luís, recentemente falecida, que conduz o jornalista Luís M. Faria a uma reflexão sobre a evolução do conceito de génio. Uma análise que conclui que a banalização de uma palavra pode retirar prestígio não só à própria palavra como também, e sobretudo, à pessoa que se procura elogiar (texto divulgado originalmente no semanário Expresso e aqui transcrito com a devida vénia).
6. As dúvidas que a grafia suscita, nomeadamente no âmbito das alterações introduzidas pelo Acordo Ortográfico de 1990, motivaram a obra Manual do Bom Português Atual, da autoria da professora Lúcia Vaz Pedro (Editora Calendário das Letras, 2016), que se apresenta na Montra de Livros. Como aí assinala Sara Mourato, com tanta bibliografia hoje disponível e tantas ferramentas acessíveis a um simples clique, só o desleixo explica uma errada aplicação da nova reforma ortográfica. E, pior ainda, quando essas grafias incorretas nada têm que ver com o AO90. Um exemplo recente é o da grafia de Rúben, que surge em diversos meios de comunicação social grafado como "Ruben", a propósito do falecimento do jornalista e membro do Comité Central do Partido Comunista Português Rúben de Carvalho (notícia aqui e aqui). O antropónimo Rúben, sendo uma palavra paroxítona (grave) terminada em n, sempre foi acentuada para não se pronunciar como uma palavra oxítona (aguda).
7. Temas dos programas produzidos pelo Ciberdúvidas para a rádio pública portuguesa, da presente semana: no Língua de Todos, Carlos Rocha, coordenador executivo do Ciberdúvidas, comenta e analisa a prova de aferição, português segunda língua do 8.º ano (programa transmitido pela RDP África, na sexta-feira, dia 14 de junho, depois do noticiário das 13h00*; com repetição no dia seguinte, pelas 9h15*); e no Páginas de Português, difundido pela Antena 2, é dado destaque ao Portal dos Corpus Ibero-Românicos, um projeto que pretende ser um instrumento informático que procura oferecer aos seus utilizadores a lista de corpora históricos em línguas ibero-românicas atualmente disponíveis na Internet. Nele, passa também uma entrevista com a professora Cristina Sobral, do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, responsável pelo corpus de textos antigos em português até 1525. Ainda neste programa, a consultora permanente do Ciberdúvidas, Carla Marques, faz um comentário crítico à prova de aferição de português do 8.º ano (domingo, 16 de junho, às 12h30*, com repetição no sábado seguinte, dia 22 de junho, às 15h30*).