Olha pro céu, meu amor
Vê como ele está lindo
Olha pra aquele balão multicor
Como no céu vai sumindo
Esta estrofe representa uma das grandes pérolas do cancioneiro brasileiro nordestino. “Olha pro céu”, de autoria de Luiz Gonzaga, imortalizado como o Rei do Baião, talvez seja a canção mais reproduzida nas festas, praças e arraiais juninos do Brasil. Ela representa o espírito do povo nordestino, alegre, festeiro e orgulhoso da sua cultura e tradição, ainda que traga em sua história as memórias e mazelas da seca e das dificuldades enfrentadas na dura vida no sertão. Nas festas juninas, o céu estrelado, colorido por fogos e balões, é a imagem do renascimento desse povo que, ao embalar os seus corpos e cantos ao som do forró, espanta os males e renova as esperanças ao redor da fogueira.
O universo das festas juninas é marcado pelas cores vibrantes, presentes nas camisas quadriculadas dos homens e nos vestidos floridos e ornados com rendas das mulheres e meninas. Mas as cores e sabores também estão presentes na mesa farta de produtos de época, como o milho, a laranja, o amendoim, o aipim, a batata doce e a tapioca, e de pratos típicos como a canjica, o mugunzá e os bolos de milho, aipim e carimã, além dos variados licores, de jenipapo, cajá, maracujá, jaboticaba, somente para destacar os mais desejados. A festança, como se vê, agrada aos olhos, aos apetites e a todos os sentidos.
Nesse rico universo, a diversidade da língua portuguesa desfila nas letras das canções de forró, que trazem estrutura musical descomplicada e rimas simples, pois o seu propósito é espalhar a alegria e embalar o «arrasta pé», expressão que significa dançar até não mais poder. O universo temático dessas canções é variado, mas quase sempre valorizam a paisagem rural e sertaneja, a saudade ou a alegria do amor, a natureza forte, resiliente e cheia de esperança do povo nordestino. Dominguinhos, que ao lado de Luiz Gonzaga é um dos maiores expoentes do forró, lamenta:
Que falta eu sinto de um bem
Que falta me faz um xodó
Mas como eu não tenho ninguém
Eu levo a vida assim tão só
Mas ainda que estejamos sofrendo por amor ou pelas duras batalhas da vida, o universo das festas juninas traz com mais força a fé, a esperança e a alegria, como nos diz a canção de Flávio José:
Se avexe não
Amanhã pode acontecer tudo, inclusive nada
Se avexe não
A lagarta rasteja até o dia em que cria asas
Se avexe não
Que a burrinha da felicidade nunca se atrasa
Se avexe não
Amanhã ela para na porta da sua casa.
Viva São João!
1 Luiz Gonzaga. "Olha pro céu". Disponível em: Olha Pro Céu – Luiz Gonzaga – LETRAS.MUS.BR. Acesso em: 14 jun.2023.
2 Dominguinhos. "Eu só quero um xodó". Disponível em: https://www.letras.mus.br/dominguinhos/357861/. Acesso em: 15. Jun.2023.
3 Flávio José. "A natureza das coisas". Disponível em: https://www.letras.mus.br/flavio-jose/200188/. Acesso em: 15. Junho.2023.
Áudio disponível aqui:
[AUDIO: Edleise Mendes – O forró e as festas juninas brasileiras]
Na imagem, "Forró sertanejo" (2011), xilogravura de J. Borges, nome artístico de José Francisco Borges (Bezerros, Pernambuco, 1935).
Apontamento da professora universitária e linguista brasileira Edleise Mendes emitido no programa Páginas de Português, em 25 de junho de 2023, na Antena 2.