«Aprender uma segunda língua melhora a autoestima, faz-nos capazes, mais capazes [...].»
Aprender uma segunda língua requer a aprendizagem de novo vocabulário, a compreensão da gramática sem esquecer a pronúncia a dançar de acordo com a localização geográfica, e tudo isto contribui para o desenvolvimento da memória.
A isto acrescentemos a melhoria da capacidade de resolução de problemas quando se está constantemente a pensar numa segunda, ou terceira, língua mais a ginástica de quem incessantemente procura uma outra palavra, uma nova palavra, uma nova expressão, uma nova piada e o mundo mais rico, e quem diz o mundo diz a vida a encher-se de cor. O contrário é assinar de cruz diante de um novo dialeto ou a sentença da iliteracia quando se chega a uma terra estranha, e porque não aprender uma segunda língua se a oportunidade está ali todos os dias na escola à espera de nós?
Aprender uma segunda língua melhora a autoestima, faz-nos capazes, mais capazes, somos capazes, mesmo se não nativos, e apesar de tudo com a aprendizagem coloquial tantas vezes olvidada pelos mesmos nativos, e portanto [é] um ponto a nosso favor e estamos em vantagem num repente a corrigir o outro se preciso for, e ensinar é preciso quando o professor aprende para ensinar.
E se calhar é isto, esta humilhação para não dizer vergonha diante do terceiro a vir de lá longe no único intuito de nos corrigir, ou assim pensam eles, e portanto a reação e a defesa inata, inconsciente, visceral para não dizer agressiva como se a aprendizagem fosse um ataque, um insulto ou então a certeza da nossa ignorância e aqui o problema, meus amigos, é pessoal.
É pessoal quando se acorda todos os dias e o império acabou, não mais subjugado a uma vontade, a uma cultura, a uma língua e o mundo já não é nosso, um imenso parque de diversões para deleite do invasor onde o invadido se desdobra em salamaleques e servilismos e o saudosismo é em tudo imenso.
Por isso, a soberba e a altivez, os tais mecanismos de defesa mais o eliminar propositado do currículo escolar da aprendizagem de uma segunda língua, porque se pode, porque se quer, porque se manda, e é como se estivéssemos de volta àqueles tempos, aos verdadeiros tempos, e estamos todos a brincar com o futuro das crianças enquanto memórias e sonhos colonialistas preenchem a alma e matam a fome. E na ausência de uma segunda língua o consequente défice de atenção, a incapacidade de concentração, a distração, o impulso, a incapacidade de esperar, a falta de organização e planeamento, o esquecimento, a imaturidade infantil ainda presente no corpo de jovens quase adultos e ainda crianças, perfeitamente inábeis diante dos seus pares de outras origens e outras distâncias e mais uma vez a agressão quando a ignorância é o único reflexo no espelho.
Perde-se curiosidade, e as crianças são naturalmente curiosas e o contrário é mentir, e quem diz curiosidade diz a criatividade e a plasticidade cerebral num mundo cada vez mais a preto e branco, onde os tons de cinza são a única novidade do dia a dia.
E o declínio mental mais a demência como inevitáveis para não dizer precoces na ausência da tal ginástica fulcral num mundo global onde o próprio umbigo é o nosso pior inimigo.
A falta de empatia e compreensão mútua gera discórdia e a discórdia gera guerra e este é o legado quando se negam às crianças as aprendizagens fundamentais para a vida.
No mundo contamos mais de 7000 línguas e dialetos e a 10000 palavras por língua cerca de 70 milhões de palavras por aprender, 70 milhões de maneiras de ver o mundo, 70 milhões de experiências e origens e outras tantas histórias e eu não peço senão a aprendizagem de uma segunda língua só.
Só não, acompanhada e de mão dada contra este orgulho inexplicável, incongruente para não dizer teimoso, de quem insiste em falar uma língua só. Só, isolada, frágil, vulnerável, dependente, à deriva no imenso oceano.
Apontamento publicado em 11 de maio de 2025 no mural que o autor mantém no Facebook.