Com o fim de mais um ano letivo, muitos estudantes portugueses preparam-se para a época de exames nacionais que se inicia esta terça-feira, 17 de junho. Uma das provas que muitos alunos do ensino secundário terão de realizar é a de português, exame fulcral para o ingresso em muitos cursos do ensino superior, como, por exemplo, direito. Neste sentido, o jornal Público dedicou, na sua edição de 15 de junho, um artigo* sobre as principais dificuldades dos estudantes na disciplina de português.
Um dos grandes obstáculos que muitos estudantes têm enfrentado é na leitura e interpretação de obras mais complexas, como os romances. Os professores e especialistas ouvidos pelo Público assinalam justamente que existem turmas inteiras em que nenhum aluno se deu ao trabalho de ler uma das obras de estudo obrigatório, verificando-se isto até naqueles que são mais dedicados. Mas porque será que os nossos jovens estão cada vez mais com dificuldades em ler e analisar obras de grande complexidade? Ora, uma das razões apontadas prende-se com as dificuldades de concentração. Devido à exposição precoce e de longas horas aos ecrãs de telemóveis e aos conteúdos produzidos, de informação e entretenimento, que visam uma compreensão rápida e simplificada do mundo, muitas crianças e jovens têm sido diagnosticados com problemas de concentração, sendo que esta é essencial numa atividade como a leitura. Para além disso, um cérebro leitor cria redes neuronais que permitem uma melhor capacidade de entendimento de assuntos complexos, o que muitos não têm. Daí, quando questionados sobre o que consideram ser o conteúdo mais difícil que pode sair no exame, muitos estudantes respondam Os Lusíadas, obra que exige um raciocínio complexo bem como conhecimentos sobre a língua e cultura portuguesa que muitos jovens entre os 16 e os 17 anos têm demonstrado não ter.
As dificuldades que uma grande parte dos alunos do ensino secundário apresenta, com a leitura e interpretação de obras de estudo obrigatório, são bastante preocupantes, sobretudo se se tiver em conta que o programa atual privilegia os estudos literários. Contudo, não é só na leitura e interpretação de textos complexos que os estudantes portugueses demonstram problemas, a ortografia e a morfossintaxe são outras das áreas em que uma grande maioria tem apresentado dificuldades. Os professores entrevistados pelo jornal Público explicam que os grandes problemas residem sobretudo em questões de concordância e na utilização adequada das formas pronominais lhe e lhos.
A forma lhe constitui um pronome clítico pessoal átono, usado como complemento direto e correspondente à terceira pessoa; por outro lado, lhos é a contração de dois tipos de pronomes clíticos da terceira pessoa, o pronome os, usado como complemento direto, contraído com o pronome lhe. No âmbito dos estudos sobre a aquisição de português como língua materna, uma das áreas críticas diagnosticadas é precisamente o uso correto dos pronomes clíticos. Estratégias como a omissão, reduplicação do clítico ou substituição pelas formas “le” ou “les” são as preferenciais de crianças até aos 5 anos de idade, o que não seria de esperar é que estes problemas permanecessem em idades mais avançadas. Não obstante, investigações recentes, como, por exemplo o estudo da autoria de José António Costa, Inês Oliveira, Joana Querido e Ana Sofia Lopes, publicado no volume 15 da revista Lingvarvm Arena, têm vindo a dar conta de que alguns dos erros que, em anos anteriores, eram apenas encontrados em crianças do primeiro ciclo ou em idades pré-escolar, são cada vez mais frequentemente identificados em jovens que frequentam o ensino secundário e até mesmo superior.
No fundo, é importante sinalizar que a escrita e a leitura são ferramentas essenciais para aprender. Por isso, é imprescindível que dados como estes nos façam refletir sobre o futuro da disciplina de Português em todos os níveis de ensino e que novas metodologias de ensino comecem a ser adotadas, de modo a dar resposta aos desafios que as novas gerações têm levado muitos professores a enfrentar.
* Cristina Faria Moreira, "Prova de Português obrigatória. O que muda este ano nos exames nacionais?", Público, 15/06/2025.