Controvérsias - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
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Polémicas em torno de questões linguísticas.

 

Neste texto publicado no jornal Público de 2 de julho de 2012, a escritora Teolinda Gersão apresenta as críticas dos seus netos ao Programa de Português do Ensino Básico e ao Dicionário Terminológico, sob a forma de uma redação dirigida a uma professora de Português.

 

 

Esta é uma controvérsia sobre a função sintática do pronome se.

Surgiu a propósito da seguinte pergunta chegada ao consultório do Ciberdúvidas: no segmento «Diz-se que o João é bom aluno?» — quis saber a professora Isabel Santiago —, a oração subordinada substantiva completiva desempenha a função de sujeito, ou de complemento direto?

A propósito dos diferentes pontos à volta da questão apresentada pela professora Isabel Santiago sobre a função sintática do pronome se na frase «Diz-se que o João é bom aluno?», fica em linha também este texto de Maria Regina Rocha.

 

Na oração «Diz-se que o João é bom aluno», o «se» é uma partícula apassivante (nomenclatura tradicional), também chamado «clítico se passivo», e, portanto, a oração «que o João é bom aluno» desempenha a função sintática de sujeito.

Réplica do autor à discordância do consulente Fernando Bueno, sobre a resposta A construção impessoal reflexa.

E ainda bem que discorda, Sr. Engenheiro! Nem precisa de pedir licença. Sempre que discordar, faça favor de o dizer, que da discussão pode nascer mais luz. Eu gosto de ser entendido!

Em consulta de Isabel Santiago, respondida em 19/4/2012, o Prof. Virgílio Catarino Dias afirma que:

«[O] se pode ser sujeito em orações reduzidas» – e, nesse caso, terá de admitir predicativos. Será verdade? Tentemos: «João declarou-se capaz de falar em público.» Representemos graficamente: – «O João declarou [-se capaz de falar em público]»: «o João declarou [que ele mesmo era capaz de falar em público].» Notemos a oração entre...

Réplica do autor à divergência do consulente João de Brito, O predicativo do sujeito, os modificadores e o «se.

 

Li muito atentamente os seus reparos, e eu vou reparar bem neles, de início, a partir do nº.3 e, mesmo no final, não descurarei o nº.1.

E reparei, antes de mais, na sua afirmação inicial:

«Tal como se conhece, o predicativo do sujeito integra sempre o predicado».

Não deveria ter escrito «como se conhece», mas «como eu o conheço» — o que faz uma diferença muito grande.

Na frase «Não se embarca tirania neste batel divinal», o termo tirania é o sujeito.

Trata-se da realização da voz passiva em português com a partícula apassivante se. No Dicionário Terminológico, é referido o emprego da partícula se como «marcador de uma estratégia de passivização (valor passivo – ocorrendo exclusivamente na terceira pessoa)», sendo dado o seguinte exemplo: «Dizem-se coisas estranhas neste país.»

Por Virgílio Dias

[Sobre a reposta de Sandra Duarte Tavares, A função sintática de tirania:]

Não há justificação nenhuma para imaginar que, na frase «não se embarca tirania neste batel divinal», «tirania» seja complemento directo.

O «se» só pode ser sujeito em orações reduzidas. Bem sei que há uma gramática de referência que autoriza tal interpretação. Mas… aliquando dormitat Homerus.

A propósito desta controvérsia [sobre a função sintática da palavra tirania na frase de Gil Vicente «Não se embarca tirania neste batel»] mantenho-me firme na minha convicção de que estamos perante um caso de ambiguidade entre a função de sujeito e a de complemento direto, dependendo da interpretação do se.

Os argumentos aduzidos por Maria Regina Rocha têm muita validade e eu não discordo de nenhum deles. Mas…

Se os analisarmos com atenção, todos os exemplos dados estão no plural:

A consulente Sofia Carreira perguntou ao Ciberdúvidas:

«Na frase de Gil Vicente "Não se embarca tirania neste batel divinal», a palavra tirania parece-me óbvio ser um complemento direto. Mas há quem defenda que se trata do sujeito (que eu consideraria nulo indeterminado). Será que nos poderiam esclarecer?»