Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Questiono se devemos dizer «em Marco de Canaveses» ou «no Marco de Canaveses» quando nos referimos ao local “onde” nos diversos contextos e qual a regra.

Obrigada.

Resposta:

De acordo com a tendência gramatical do português europeu e com os estudos etimológicos sobre o topónimo, a forma correta é «no Marco de Canaveses».

De facto, não existe uma regra absoluta que permita prever infalivelmente o uso do artigo definido com topónimos. No entanto, há critérios históricos e linguísticos que ajudam a orientar esse uso. Um dos principais é a origem do topónimo: quando este deriva de um nome comum, é frequente que se use o artigo definido – como acontece com «o Porto», «a Póvoa de Varzim» ou «a Fuzeta» (com provável origem em “foz”). Ainda assim, há exceções que devem ser consideradas caso a caso.

No caso concreto de Marco de Canaveses, o nome Marco tem origem numa demarcação de pedra, muitas vezes de forma oblonga, que assinalava a divisão entre freguesias, e, como nome comum masculino, exige o uso do artigo definido o. Já Canaveses refere-se a terrenos de cultivo de cânhamo, funcionando como complemento do nome principal (Associação de Municípios Douro e Tâmega).

Por conseguinte, a forma correta é «no Marco de Canaveses», com a preposição em combinada com o artigo definido o.

Ainda assim, é comum encontrarmos a forma «em Marco de Canaveses», sem artigo definido antes de Marco, sobretudo em registos mais formais: «Câmara Municipal de Marco de Canaveses».

O peso da palavra <i>genocídio</i>
Etimologia, definição e disputa semântica

Neste texto, a consultora Sara Mourato analisa o termo genocídio, destacando a sua carga semântica e histórica, bem como o seu uso controverso em contextos políticos e jurídicos.

Pergunta:

Existe alguma relação etimológica entre os nomes da pimenta-de-caiena, caiena, e da capital franco-guianense (da Guiana Francesa), Caiena?

Qual relação será essa e qual das duas recebeu o nome antes da outra. Estão ligados?

Muitíssimo obrigado e um grande abraço!

Resposta:

Embora seja comum afirmar-se – como faz a Wikipédia – que o nome pimenta-de-caiena deriva da cidade de Caiena (em francês, Cayenne), capital da Guiana Francesa, essa explicação não é etimologicamente segura.

Segundo fontes como o Etymonline, o Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa de José Pedro Machado, o Dicionário Houaiss e o Oxford Reference, o termo caiena tem origem provável na língua tupi, na palavra kyynha, que significa «pimenta» ou «pimentão». Essa raiz indígena pode ter influenciado tanto o nome da especiaria quanto o nome da cidade – mas sem que haja uma relação direta comprovada entre os dois.

Portanto, temos duas hipóteses:

1. Hipótese comercial/geográfica: A pimenta era exportada através do porto de Caiena, o que levou à associação do nome com a cidade.

2. Hipótese etimológica, em língua ameríndia: o nome caiena vem do tupi kyynha, e essa palavra pode ter influenciado o nome da cidade e da pimenta, mas não é certo que o nome da pimenta venha do nome da cidade.

Pergunta:

Qual o feminino de pica significando «fiscal de bilhetes nos transportes públicos»?

Resposta:

O termo pica, segundo o Dicionário da Academia das Ciências, é um substantivo comum de dois géneros, o que significa que pode ser usado tanto no masculino como no feminino, sem alteração da forma. Assim, diz-se «o pica» para o masculino e «a pica» para o feminino, mantendo o nome a mesma estrutura morfológica.

Este substantivo é utilizado informalmente para designar a pessoa que, nos transportes públicos, fiscaliza ou pica os bilhetes dos passageiros. A sua origem está numa derivação regressiva do verbo picar, ou seja, trata-se de um processo de formação de palavras em que se obtém um substantivo pela eliminação da terminação verbal (como -ar, -er, -ir). Neste caso, ao retirar a terminação -ar do verbo picar, forma-se o substantivo pica, que passou a designar a função associada à ação de picar bilhetes.

Pergunta:

Recentemente usei a expressão «taxas aduaneiras», tendo sido corrigido para utilizar «direitos aduaneiros».

Poderão esclarecer-me, por favor?

Agradecido pela atenção.

Resposta:

Ambas as expressões estão corretas, mas são usadas em contextos diferentes. Por isso, a correção só deve ocorrer se a expressão for aplicada de forma inadequada.

«Taxas aduaneiras» referem-se a encargos cobrados pelas autoridades aduaneiras durante o processo de importação ou exportação de mercadorias. Já «direitos aduaneiros» (ou «direito aduaneiro») são impostos sobre mercadorias importadas, calculados com base na pauta aduaneira comum da União Europeia e no valor das mercadorias, incluindo transporte, seguro e outras despesas associadas, constituindo uma fonte de receita para a UE (ver informação completa, aqui).

Resumindo, enquanto as «taxas aduaneiras» abrangem custos administrativos e operacionais do desalfandegamento, os «direitos aduaneiros» são impostos específicos aplicados às mercadorias importadas.