Inês Gama - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Inês Gama
Inês Gama
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Licenciada em Português com Menor em Línguas Modernas – Inglês pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e mestre em Português como Língua Estrangeira e Língua Segunda (PLELS) pela mesma instituição. Fez um estágio em ensino de português como língua estrangeira na Universidade Jaguelónica em Cracóvia (Polónia). Exerce funções de apoio à edição/revisão do Ciberdúvidas e à reorganização do seu acervo.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Por que razão a Wikipédia e Wikcionário insistem em colocar "português europeu" para poderem diferenciar do "português brasileiro"?

Vou explicar: o português não é idioma popular na Europa, assim como o espanhol não o é também!

Basta botarem "português lusitano", "português peninsular" ou "português ibérico", assim como "espanhol hispânico", "espanhol peninsular" ou "espanhol ibérico", para poderem diferenciar do "espanhol americano".

Ninguém fala: "inglês europeu" em contraste com "inglês americano", mas sim "inglês britânico"!

Estão ligados?

Ou, então, vamos trocar "português brasileiro", no caso, para "português sul-americano"! Podem crer aí?

E, aliás, já tem múltiplos usuários se queixando desse lance de usarem o termo de "português europeu" para além de mim mesmo! Que tal essa aí?

Muitíssimo obrigado e um grande abraço!

Resposta:

As designações «norma europeia», «português europeu» ou «variedade europeia» não pretendem constituir qualquer tipo de discriminação, pois correspondem a conceitos terminológicos utilizados nos estudos linguísticos e no ensino do português, nomeadamente no que diz respeito à variação geográfica. 

Esta terminologia é adotada por obras de referência dos estudos linguísticos e do ensino de língua portuguesa, como, por exemplo, a Nova Gramática do Português Contemporâneo (consultada a edição de 2015), de Celso Cunha (destacado linguista brasileiro) e Lindley Cintra (destacado linguista português), onde se distingue dentro das variedades do português, «dialetos do português europeu», a par dos «dialetos das ilhas atlânticas» e dos «dialetos brasileiros». Também na Gramática da Língua Portuguesa (2023), organizada por Maria Helena Mira Mateus e outros, Isabel Hub Faria assinala que «em línguas com larga história de expansão mundial e de mobilidade dos seus falantes nativos, observa-se a existência de variedades que se vão progressivamente fixando e autonomizando até ser possível caracterizá-las como variedades locais ou mesmo nacionais. É ne...

Pergunta:

Na frase «Acabou por ser degredado para a Índia», «para a Índia» desempenha que função sintática: c oblíquo ou c. do adjetivo. Percebi que o verbo degredar é transitivo, mas fico com dúvidas nesta formulação. Obrigada.

Resposta:

Na frase apresentada pela consulente, o constituinte «para a Índia» desempenha a função sintática de complemento oblíquo.

Na frase em questão, a oração que integra o constituinte em análise, «ser degredado para a Índia» é uma estrutura passiva e, por conseguinte, degredado é, neste caso, a forma do particípio passado do verbo degredar. Note-se que alguns verbos do português partilham, por razões históricas, a forma do particípio passado com a forma do adjetivo. Vários autores defendem que quando a forma do particípio é a mesma do adjetivo, mas está integrada num complexo verbal, como acontece em frases passivas, este tem sobretudo propriedades verbais, ou seja, deve ser tratado como um verbo.

Para perceber melhor a análise sintática da oração em estudo, o melhor será analisá-la na sua forma ativa, como exemplificado em (1). 

(1) «O juiz degredou o condenado para a Índia.»

Aplicando o teste da pergunta-resposta à frase para determinar se o constituinte «para a Índia» é um complemento ou um modificador, verificamos que este não pode ser afastado do verbo, uma vez que as frases geradas pelo seu afastamento são agramaticais.

i) Teste da pergunta-resposta

(2) «*O que fez o juiz ao condenado para a Índia?»

      «*Degredou.»

(3) «O que fez o juiz ao condenado?»

     «Degredou para a Índia.»

Aplicando mais um outro teste que procura separar o verbo do seu complemento, observamos pela agramaticalidade das frases que o constituinte em análise é de facto um complemento.

(4) «*O que fez o juiz para a Índia?»

     «Degredou o condenado.»

Resumind...

<i>Censura</i> e <i>confiança</i> nas luzes da ribalta
Algumas considerações sobre estes termos

A propósito da nova crise política que ameaça Portugal e da perspetiva de novas eleições legislativas, a consultora Inês Gama apresenta algumas considerações sobre os termos censura e confiança, bastante utilizados no espaço mediático a respeito deste tema da atualidade portuguesa.

«Cair o Carmo e a Trindade»
Qual o sentido desta expressão?

Apontamento da consultora Inês Gama sobre o sentido da expressão «cair o Carmo e a Trindade». Incluído no programa Páginas de Português, na Antena 2, no dia 9 de março de 2025.

Pergunta:

No segmento frásico «Uma versão que, segundo o encenador, não contém todo o original do autor romântico», a expressão «segundo o encenador» desempenha a função sintática de modificador do grupo verbal?

A expressão está inserida dentro de um modificador restritivo, mas é "secundarizado" pelas vírgulas, o que lhe pode atribuir uma função diferente.

Obrigada pela atenção.

Resposta:

Na frase apresentada pela consulente, o constituinte «segundo o encenado» desempenha a função sintática de modificador da frase.

O modificador da frase distingue-se do modificador verbal, porque não pode ser interrogado nem negado. Veja-se a aplicação do teste da negação à frase:

(1) «*Uma versão que, não segundo o encenador, não contém todo o original do autor romântico».

Neste caso, «segundo o encenador» não pode ser negado, pois a frase que se gera é agramatical. Por conseguinte, conclui-se que o constituinte «segundo o encenador» funciona como modificador da frase. Note-se que este tipo de modificadores têm uma maior independência prosódica do que os modificadores verbais e, por isso, são demarcados por vírgula.

Relativamente aos modificadores do grupo verbal, observe-se que estes «contribuem para o significado do sintagma verbal, quantificando, qualificando ou localizando (temporal ou espacialmente) a situação que se descreve, mas não representam participantes na situação ou no evento descrito pelo verbo.» (Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, p. 1161). Veja-se a seguinte frase:

(2) «O autor r...