Edite Prada - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Edite Prada
Edite Prada
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Edite Prada é consultora do Ciberdúvidas. Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Português/Francês, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa; mestrado interdisciplinar em Estudos Portugueses, defendido na Universidade Aberta de Lisboa. Autora de A Produção do Contraste no Português Europeu.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Pergunto-vos se o verbo suplicar admite esta ocorrência:

«Ele suplica QUE queria ver a pessoa DE QUEM ele estaria gostando.»

Aproveito, ainda, para se a expressão «de quem» está correta.

Obrigado.

Resposta:

O verbo suplicar pertence ao grupo de verbos que podem construir-se com uma frase completiva. É um verbo diretivo, que integra atos de fala veiculando um pedido ou uma ordem.

Por seu lado, o verbo querer integra também o grupo de verbos que se constroem com uma frase completiva e pertence ao grupo dos verbos volitivos, que veiculam um desejo ou uma vontade.

Na frase em apreço, o sentido veiculado pelos verbos suplicar e querer impede a construção em que o verbo suplicar, associado a um pedido, seja completado com uma frase ou oração completiva cujo núcleo seja um verbo que transmite uma ideia de vontade.

Assim a sequencia inicial da frase, que repetimos abaixo como (1) não é, a nosso ver, correta:

1 – ?Ele suplica QUE queria ver a pessoa DE QUEM ele estaria gostando.

Parece-nos que o verbo suplicar se pode eliminar:

(1.1) Ele queria ver a pessoa DE QUEM ele estaria gostando.

Por outro lado, poderia manter-se um verbo que veicule uma ideia de pedido que se enquadre melhor no sentido da frase, mas nunca associado ao verbo querer:

(1.2) Ele pediu para ver a pessoa DE QUEM ele estaria gostando.

Embora tenha encontrado no corpus Cetempúblico uma frase em que o verbo suplicar se completa com um complemento oblíquo introduzido por para, não nos parece a melhor opção:

(1.3) ?Ele suplicou para ver a pessoa DE QUEM ele estaria gostando.

Relativamente à expressão «de quem», ela está correta. Quem é um pronome relativo que substitui na frase a expressão «a pessoa...

Pergunta:

Cumprimentos, antes de mais, à equipa do Ciberdúvidas e os votos dum feliz Ano Novo!

Num dos programas de rádio ouvi: "...Carlos Magno (...) colaborou reunificar boa parte do Ocidente Cristão ..." e tropecei em 'colaborar' completando-se directamente com um infinitivo.

Uma pesquisa na internet trouxe mais um exemplo: "quem não colaborou fazer parte, que colabore".

A dúvida é se o verbo 'colaborar' permite reger um infinitivo à maneira de combinar. acordar, etc. ou sempre se exige uma preposição (sic) 'para'? Caso se admita, qual será a função sintáctica desse e quais são, tecnicamente, locuções verbais cultas com o uso de 'colaborar'?

Agradeço.

Resposta:

Gratos pelos votos.

Consultando diversos dicionários de regência verbal, o verbo colaborar surge como transitivo indireto, completando-se com um complemento oblíquo e regendo as preposições:

Com – «O jornalista colabora com duas revistas.»
Em – «O investigador colabora em diversos projetos.»
Para – «O aumento de impostos colaborou para o mau desempenho das empresas» (in Dicionário Gramatical de Verbos Portugueses).

Surge também como intransitivo

(1) «Só a Câmara Municipal é que ainda não colaborou directamente, mas existem promessas nesse sentido» Cetempúblico

No corpus do Cetempúblico, o verbo surge sempre ou como transitivo indireto com recurso a uma das preposições indicadas acima, ou como intransitivo. Nesta qualidade ocorre por vezes seguido de um verbo no gerúndio:

(2) «…e a PSP da cidade colaborou controlando o trânsito existente nas artérias próximas da ocorrência.» Cetempúblico

Não encontramos nada que nos dê indicação de que o verbo possa ser usado com um infinitivo. Analisando os exemplos que o consulente indica e que repetimos, parece que o verbo está a assumir o significado de decidir que lhe não é, habitualmente, atribuído:

(3) «...Carlos Magno (...) colaborou reunificar boa parte do Ocidente Cristão...»
(3.1) «...Carlos Magno (...) decidiu reunificar boa parte do Ocidente Cristão...»
(4) «…quem não colaborou fazer parte, que colabore…»
((4.1) «…quem decidiu não fazer parte, que colabore…»

Pergunta:

Esta frase está correta?

«Estas t-shirts, que julgo que já estão expostas, são incentivadas pelo Sr. Diretor para uso em saídas ao exterior.»

Resposta:

Tendo em conta o conhecimento que temos do mundo que nos rodeia, não se pode considerar correta a fase em apreço, embora do ponto de vista meramente sintático a sua estrutura corresponda às características do verbo. Mais ajustada é a seguinte formulação:

«O uso destas t-shirts, que julgo que já estão expostas, é incentivado pelo Sr. Diretor para em saídas ao exterior.»

O verbo incentivar pode ser transitivo direto e, por essa razão, admite uma construção passiva. Exemplificamos:

(1) O professor incentiva os alunos.
(1.1) Os alunos são incentivados pelo professor.

A frase (1) ilustra, do ponto de vista semântico, a estrutura básica do verbo incentivar. Pelo seu significado, espera-se que o verbo tenha como sujeito uma entidade passível de decidir, agir e como complemento direto também. Porém, sobretudo em posição de sujeito, não têm que ser exatamente entidades humanas. Podem ser também outras entidades que pressupõem a ação humana como: programa, projeto, uso, participação, empresa.

(2) O programa visa incentivar os jovens criadores.
(3) A empresa incentiva a poupança de energia.

Na frase em apreço, que repetimos como (4) a entidade «t-shirt», que ocupa a posição de sujeito da passiva, não é uma entidade com capacidade de decisão, ou ação, pelo que não pode ser usada como complemento direto de incentivar e, consequentemente, não lhe pode servir de sujeito na passiva.

(4) «Estas t-shirts, que julgo que já estão expostas, são incentivadas pelo Sr. Diretor para uso em saídas ao exterior.»

Para que uma frase possa ser considerada correta, importa que cumpra as características sintáticas – mais orientadas para a estrutura frásica – mas também as semânticas, que remetem para o conhecimento que temos do mundo.

Salvaguardam-s...

Pergunta:

No sentido de abrir caminho, ouvi algumas vezes a expressão «abrir alas». No entanto, não sei se será muito correto. Se o for, rege-se por alguma preposição?

Ou seja, na frase: «A temperatura estival parecia abrir alas para a multidão de pessoas que se aglomerou no Palácio de Cristal.»

Desconheço se faz ou não sentido, contudo, poderia substituir-se por: «A temperatura estival parecia abrir alas à multidão de pessoas que se aglomerou no Palácio de Cristal.»

Uma vez mais, quero reiterar os meus genuínos parabéns a toda a equipa que nos ajuda a aperfeiçoar este tão belo idioma de Camões.

Resposta:

Para analisar a expressão «abrir alas», embora tenha uma utilização fixa, importa ter em conta a regência exigida pelo verbo abrir, que, na longa descrição dos dicionários, ocorre, também, como transitivo direto e indireto e intransitivo.

Analisemos as frases em apreço, que se repetem numeradas, e com ordem diversa:

(1) «A temperatura estival parecia abrir alas à multidão de pessoas que se aglomerou no Palácio de Cristal.»

(2) «A temperatura estival parecia abrir alas para a multidão de pessoas que se aglomerou no Palácio de Cristal.»

Ambas as frases são corretas e ambas veiculam o mesmo sentido.

Do ponto de vista sintático, na frase (1) temos:

Sujeito – A temperatura estival
Predicado – parecia abrir alas à multidão de pessoas que se aglomerou no Palácio de Cristal.

Verbo composto que modaliza a mensagem – parecia abrir

C. direto – alas
C indireto – à multidão de pessoas que se aglomerou no Palácio de Cristal.

Nota: por não ser relevante para o tema em análise, não vamos desdobrar os sintagmas nominais, pelo que se não faz a análise da frase relativa «que se aglomerou no Palácio de Cristal.»

Para muitos, a frase (2) tem uma estrutura igual à frase (1), com a diferença de que o C. indireto é introduzido pela preposição para.

Porém, muitos investigadores não aceitam a...

Pergunta:

Na frase apresentada, perguntava se a mesma é aceitável.

«Os livros fazem perceberMOS a nossa cultura.»

Não se deveria ter optado pelo infinitivo impessoal («fazem perceber...»)?

Aproveito ainda para perguntar se a reformulação não poderia ficar nestes termos: «Os livros fazem-NOS PERCEBER a nossa cultura»?

Obrigado.

Resposta:

Para analisar a frase em apreço importa ter em conta a existência de diversos registos, desde o formal, mais associado à norma-padrão, às mais diversas ocorrências mais ou menos informais, em contextos específicos.

Num registo formal, sobretudo se for escrito, dificilmente se poderá considerar que «Os livros fazem percebermos a nossa cultura.» seja adequado à situação, sendo claramente preferível a sugestão que apresenta: «Os livros fazem-nos perceber a nossa cultura».

Num contexto menos formal, a frase poderá ser considerada adequada à situação.

Se tivermos em conta alguns aspetos da regência do verbo fazer, poderemos verificar que ele pode ter como complemento uma frase finita ou infinita (os exemplos apresentados são retirados do Dicionário Gramatical de Verbos Portugueses, da Texto Editores:

(1) - A confiança depositada neles faz os rapazes serem mais responsáveis.
(2) - Esta vitória faz com que a equipa passe para o primeiro lugar.

Em (1) o verbo fazer completa-se com um complemento direto e em (2) com um complemento oblíquo.

A frase (2), com o sentido próximo de «atingir um objetivo» aproxima-se da mensagem veiculada pela frase em apreço. Por outro lado, o sentido desta mesma frase, sem grandes alterações, pode ser veiculado pela seguinte hipótese:

(2.1) Esta vitória faz a equipa passar para o primeiro lugar.

Em (2.1), por ser uma terceira pessoa do singular, o verbo passar pode ser interpretado como infinitivo quer pessoal, quer impessoal. Porém, se alterarmos a pessoa verbal, verificamos que é mais provável tratar-se, como no exemplo em apreço, de um infinitivo pessoal.

(2.2) Esta vitória faz as equipas passarem para o primeiro lugar.

Concentrando-nos no exemplo (2.2) e comparando-o com...