1. A catástrofe que se abateu sobre a Líbia, incluindo a devastação da cidade de Derna, tem claro destaque nas notícias. Referir a cidadania da Líbia não oferece dificuldade especial, pois o gentílico respetivo dispensa a junção de sufixos derivacionais como -ês ou -ano, que estão entre os mais correntes (chinês, angolano). Na verdade, basta empregar as formas líbia e líbio, um par em que a forma do género feminino é homónima do nome do país, e a forma do masculino se obtém por simples substituição dos índices temáticos (-a por -o). Na Lista dos Estados, territórios e moedas do Código de Redação Interinstituicional para uso do português na União Europeia, pertencem a este tipo os gentílicos de vários outros países: Argentina, Arménia, Eritreia*, Estónia, Indonésia, Macedónia (do Norte), Síria e Suíça. Contam-se ainda os casos de Filipinas e Maldivas, cujos gentílicos perdem o -s final nas formas de singular – filipina/filipino e maldiva/maldivo, respetivamente –, bem como o da República Dominicana, cujo gentílico é igual ao constituinte adjetival do topónimo: dominicana/dominicano. Finalmente, mencione-se a Bósnia-Herzegovina, cujos cidadãos podem ser referidos pelo termo bósnia/bósnio. Muitos mais exemplos haverá a mencionar estendendo a pesquisa a regiões e estados antigos ou territórios sem autonomia política: ática, ático (Ática, Grécia), úmbria, úmbrio (Úmbria, Itália), abissínia/abissínio (Abissínia, atual Etiópia), trácia/trácia (Trácia, hoje dividida entre a Grécia, a Turquia e a Bulgária).
* Neste caso, o feminino tem a mesma forma, mas o masculino eritreu parece fugir ao padrão de formação do masculino.
2. A propósito ainda do sismo ocorrido no sul de Marrocos em 8 de setembro p.p., lamenta-se que se ouçam ou leiam novamente frases como «[a prioridade é] a manutenção das vias de comunicação [...] para se poder transportar os bens essenciais e evacuar as populações» (cf. "Nenhum país está preparado a 100% para responder a uma catástrofe como a de Marrocos", Diário de Notícias, 13/09/2023; consultado em 15/09/2023). Como tem sido sublinhado nestas páginas, o verbo evacuar, na aceção de «esvaziar», só pode referir-se a espaços ou lugares. Diga-se e escreva-se, portanto, «... para evacuar aldeias/vilas/cidades/localidades».
3. Outra palavra da atualidade, recorrente na cobertura noticiosa da guerra russo-ucraniana, é drone, cuja pronúncia é descrita no Consultório. A atualização integra mais nove respostas a respeito de outros tantos tópicos: a regência de compulsão, uma oração relativa introduzida por quando, os usos de abada e de contracenante, os diminutivos de aventureiro, o nome Barba-Azul, a concordância com a expressão «número de...», o verbo estampar e a locução verbal «vai andando».
4. Num plano não menos conflituoso, fala-se do anglicismo woke, frequente nas colunas de opinião da comunicação social. Nas Controvérsias, um apontamento de Sara Mourato dá conta da dicionarização do estrangeirismo, a qual, até à data, parece limitada a um único dicionário em Portugal.
5. Acerca do ensino das literaturas de língua portuguesa, apresenta-se em Montra de Livros o número especial da revista PLCS 38/39 (Portuguese Literary & Cultural Studies, Tagus Press, Universidade de Massachusetts Dartmouth).
6. Em Portugal, a abertura do ano letivo nos ensinos básico e secundário traz novamente para a ribalta informativa ações e preocupações no setor da educação. Notícias e trabalhos jornalísticos assinalados nos Destaques dos últimos dias (ver mais abaixo): "Próximo ano letivo arranca com mais salas e onze novas escolas" (Jornal de Notícias – JN, 07/09); "Professores obrigados a viver em quartos alugados em condições indignas" (Diário de Notícias – DN, 10/09); "Fenprof diz que mais de 100 mil alunos estariam sem aulas se arrancassem hoje" (DN, 11/09); "Manuais do 3.º e 4.º anos deixam de ser reutilizados" (JN, 14/09). Problema generalizado mundialmente é o analisado em "Escola: a luta inglória contra o celular" (Outras Mídias, 14/09).
7. Dois registos que envolvem criadores de língua portuguesa:
– O Guiões – Festival do Roteiro de Língua Portuguesa, dedicado à escrita de argumentos fílmicos em português, realiza-se em Lisboa até 17 de setembro;
– O músico e poeta Caetano Veloso foi condecorado em Lisboa com a Medalha de Mérito Cultural de Portugal. Pormenores sobre a cerimónia aqui.
8. Refiram-se ainda os temas principais de três dos programas dedicados ao português na rádio pública de Portugal:
– a expressão «bicos de rouxinóis», que figura no poema "O Falso Mendigo", de Vinicius de Moraes, e a utilização da vírgula em Língua de Todos, difundido na RDP África, na sexta-feira, 15/09/2023, às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*);
– em Páginas de Português, transmitido pela Antena 2, no domingo, 17 de setembro, às 12h30* (repetido no sábado seguinte, 23 de setembro, às 15h30*), a futura formação de professores no domínio da escrita conforme foi discutida no 3.º Encontro Nacional sobre Discurso Académico, que decorreu em Lisboa em 7 e 8 de setembro;
– e a linguagem da alimentação e o seu cruzamento com o território, nas emissões de 18 a 22 de setembro do programa Palavras Cruzadas, realizado por Dalila Carvalho e transmitido na Antena 2 (de segunda a sexta, às 09h50 e às 18h50).