O hífen é um sinal de escrita de difícil aplicação, pois algumas das suas regras são complexas e contraditórias. No entanto, o Novo Acordo Ortográfico (que nesta data ainda não foi ratificado) tentará reduzir essas contradições; enquanto não for ratificado continuarão em vigor as regras do Acordo de 1945.
Em relação à questão do emprego do hífen, este não levanta grandes divergências entre a norma ortográfica do português do Brasil (PB) e o português europeu (PE). Existem, no entanto, algumas oscilações e formações com dupla ortografia (com e sem hífen) em dicionários, revistas e jornais tanto portugueses como brasileiros nas formações por prefixação ou com pseudoprefixos de origem grega ou latina. Alguns exemplos são: ante-rosto (PB) e anterrosto (PE), co-educação (PB) e coeducação (PE), sobre-saia (PB) e sobressaia (PE), agro-industrial (PE) e agroindustrial (PB), agro-pecuária (dicionário da Academia das Ciências de Lisboa – PE) e agropecuária (Dicionário Houaiss – PB – e Grande Dicionário da Porto Editora – PE), micro-onda e microonda (ambas no Grande Dicionário da Porto Editora – PE).
Em relação à sua questão sobre as excepções existentes, indico-lhe abaixo algumas considerações:
grã-, grão-, vice-, vizo- e pára-
Emprega-se sempre o hífen nas palavras com as formas grã-, grão- (cf. Rebelo Gonçalves, Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa, 1947, pág. 211), vice- e vizo- (idem, pág. 225). Para estes não há excepções.
Nos compostos formados por justaposição de palavras, cujos elementos, mantendo a acentuação respectiva, constituem uma unidade quanto ao significado emprega-se o hífen, como pára-quedas. Nos compostos que já evoluíram por aglutinação, como pontapé, não se aplica o hífen. No entanto, segundo o novo acordo ortográfico, estas palavras não são ligadas por hífen: “paraquedas”, “paraquedista” (D’Silvas Filho, Prontuário Universal. Erros Corrigidos de Português, Lisboa, Texto Editora, 2003, pág. 74, n. 422).
Note-se que o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001) classifica pára- como elemento de composição e não como prefixo. Rebelo Gonçalves, no Vocabulário da Língua Portuguesa (1966), não o regista nem como prefixo, nem como elemento de composição.
Cf. VICE
inter-, hiper-, super- e nuper-
Com estes prefixos (ou pseudoprefixos), emprega-se o hífen quando o segundo elemento começa por h ou r.
No entanto, alguns dicionários nem sempre respeitam esta convenção, já que, por vezes, apresentam algumas excepções como super-alma (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa1) e inter-ético (Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa2).
além-, aquém- e recém-
Emprega-se hífen nos compostos em que o primeiro elemento é oxítono (ou agudo), com acento gráfico, como além-, aquém- e recém-, e não há excepções (cf. Rebelo Gonçalves, Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa, 1947, pág. 225). No novo acordo também é assim.
Observe-se que a forma “Aquentejo”, referida como estando em uso pelo consulente, não está atestada nos dicionários portugueses e brasileiros consultados. Dado que não refere uma unidade geográfica como Alentejo (esta, sim, forma perfeitamente lexicalizada), dever-se-á empregar aquém-Tejo.
Cf. ALÉM/AQUÉM- + RECÉM-
bel-
Os compostos com o prefixo bel- apresentam sempre hífen. No entanto, temos belverde e Belmonte (cf. dicionário HO).
bem-
Emprega-se hífen nos compostos com os advérbios bem e mal quando estes formam com o segundo elemento uma unidade sintagmática e semântica e tal elemento começa por vogal ou h (Gonçalves, op. cit., págs. 223/224). Contudo, ao contrário de mal, o advérbio bem pode não se aglutinar a palavras com consoante, que tenham perfeita «evidência de sentido» (ibidem): bem-criado, bem-ditoso, bem-falante, bem-mandado, bem-nascido, bem-soante, bem-visto (ao lado de bemposta, bendizente, bendizer, benfazejo, benfazente, benfazer, benfeito, benfeitor, benfeitoria, benfeitorização, benfeitorizado, benfeitorizante, benfeitorizar, benquerença, benquerente, benquerer, benquerido).
co-
Usa-se hífen com o prefixo co- quando este tem o sentido de «a par» e o segundo elemento tem vida autónoma (ex., co-proprietário; cf. idem, pág. 223). Há, porém excepções, visto este prefixo se aglutinar por vezes com o segundo elemento iniciado por vogal (cooperativa; cf. HO e AC). Com efeito, Rebelo Gonçalves, no Vocabulário da Língua Portuguesa (1966), explicava que, por redução operada no latim, este prefixo podia ligar-se ao elemento seguinte, até mesmo aos que começassem por vogal ou h: coadjuvar, coabitar, coonestar (a par de co-acusado, co-administrador, co-administrar, co-administração, co-aluno, co-arrendar, co-arrendatário, co-associado, co-autor, co-autoria, co-eleitor, co-esposa, co-eternidade, co-eterno, co-igual, co-incinerar, co-inquilino, co-interessado, co-ocorrência, co-ocupante, co-opositor).
A este respeito, o dicionário HO observa o seguinte (itálico do original a negro): «tanto a regra bras[ileira] quanto a port[uguesa] recomendam que, com relação a co-, seja escrito com hífen, se a pal[avra] seg[uinte] tiver existência autônoma e o sentido de co- for de 'a par de' (regra que, diga-se criticamente, cria muito embaraço, freqüentemente, ao usuário).»
Segundo o novo acordo ortográfico, o prefixo co- aglutina-se sempre com o segundo elemento.
ex-, soto-, sota-
Nas formações com os prefixos soto- e sota- aplica-se sempre o hífen (Gonçalves, Tratado de Ortografia..., pág. 225).
Existem no entanto excepções (cf. MorDebe): sotavento, sotaventar, sotaventeado e sotaventino; sotopor, sotoposição, sotopositivo, sotopositivo e sotoposto. O HO esclarece que «[...] em sotavento, a omissão do hífen é por conta do catalanismo de orig[em]; em sotopor, a omissão é por harmonia com todos os der[ivados] prefixais de pôr.
No caso do prefixo ex- utiliza-se sempre o hífen nos casos que indicam estado anterior ou cessamento (cf. ex-director). O novo acordo indica que todas as palavras derivadas pelo prefixo ex- apresentam hífen.
pós-, pré- e pró-
Nas formações com os prefixos tónicos acentuados graficamente pós-, pré- e pró-, quando o segundo elemento tem vida à parte utiliza-se o hífen (cf. Gonçalves, op. cit., pág. 225/226), ao contrário do que acontece com as correspondentes formas átonas que se aglutinam com o elemento seguinte: pospor, poscéfalo, poscênio, posfaçador, posfaçar, posfácio, posfaço, poslimínico, postorbital, proactivo, prever, promover.
Cf. PÓS/PRÉ
sem-
Emprega-se hífen nos compostos com o elemento sem- quando este tem pronuncia própria e o segundo elemento tem vida à parte (idem, pág. 224). Excepções: senfilista, sensaboria.
1 De agora em diante HO.
2 De agora em diante AC.
N.E. – (12/08/2017) Sobre as novas regras do uso do hífen, conforme já o Acordo Ortográfico de 1980 – além dos esclarecimentos e informação mais recentes nesta matéria, assinalados nos Textos Relacionado, ao lado –, veja-se, em complemento, a ilustrativa explicação do professor brasileiro Matheus Gustavo do sítio Português Eficiente, neste vídeo.