DÚVIDAS

Modificadores, complementos oblíquos, complementos indiretos

Tendo em conta as diversas explicações avançadas pelas diversas gramáticas existentes no mercado e pelos recursos fornecidos pelas editoras, continua a haver exemplos de frases que suscitam dúvidas quanto à classificação dos constituintes que tanto podem ser modificadores, como complementos oblíquos ou até complementos indiretos.

É o caso das frases:

«A Joana trabalha em Lisboa.» («em Lisboa» – é modificador ou c. oblíquo?)

«O que aconteceu deve-se à tua falta de trabalho.» («à tua falta de trabalho» – é complemento oblíquo ou complemento indireto?)

E se fosse «O que aconteceu deve-se à tua mãe»? (à tua mãe» – não seria complemento indireto – deve-se-lhe?)

Obrigada.

Resposta

Nas frases apresentadas, «em Lisboa» tem a função de modificador do grupo verbal, e «à tua falta de trabalho / à tua mãe», de complemento oblíquo.

Para distinguir um constituinte com função de complemento oblíquo de um com função de modificador do grupo verbal, podem usar-se dois testes, que aplicaremos à frase aqui transcrita em (1):

(1) «A Joana trabalha em Lisboa.»

(i) Teste pergunta-resposta:

               (1a) P: «O que é que a Joana faz em Lisboa?»

                 R: «Trabalha.»

(ii) Teste de clivagem:

               (1b) «?É trabalhar em Lisboa que a Joana faz?»

               (1c) «É trabalhar que a Joana faz em Lisboa?»

Ambos os testes pretendem verificar se é possível afastar o constituinte do verbo ou se este afastamento determina uma construção agramatical. No caso da frase (1), os testes mostram que o constituinte «em Lisboa» pode ser afastado do verbo trabalhar, o que indica que o constituinte não é complemento do verbo (ou seja, não é complemento oblíquo, mas antes modificador do grupo verbal.)

Relativamente à segunda e terceira frases, é importante recordar que o complemento indireto é um complemento preposicional, introduzido por a, que é substituível pelo pronome lhe, no que se distingue do complemento oblíquo. É importante recordar que há constituintes introduzidos pela preposição a que não desempenham a função sintática de complemento indireto, como acontece em (2), caso em que estamos perante uma preposição regida pelo verbo: «ir a».

(2) «Eu vou a casa do Rui.»

Se atentarmos nas frases aqui transcritas como (3) e (4), veremos que a substituição do constituinte introduzido pela preposição a por lhe parece pouco aceitável, sendo mais natural a sua substituição por preposição seguida do pronome tónico isto/ela1:

(3) «O que aconteceu deve-se à tua falta de trabalho

(3a) «?O que aconteceu deve-se-lhe.»

(3b) «O que aconteceu deve-se a isto.»

(4) «O que aconteceu deve-se à tua mãe

(4a) «?O que aconteceu deve-se-lhe.»

(4b) «O que aconteceu deve-se a ela.»

Disponha sempre!

 

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1. Note-se, no entanto, que, caso se considere aceitável a substituição do constituinte por lhe, isso não impedirá que se trate de um complemento oblíquo (ver aqui).

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