Pergunta:
Já vi o tema «meio-dia e meio» debatido noutros sítios, inclusive pelo Sr. José Neves Henriques e pela Sra. Carla Marques, mas não fiquei convencido com os argumentos usados.
Vou tentar expor a minha visão da melhor maneira.
Meio-dia designa uma hora específica: 12h00. A «hora 12» é feminino, o «meio-dia» é masculino; são sinónimos. Não é o único exemplo na língua portuguesa de uma palavra masculina composta por justaposição que designa algo feminino.
Eis outros exemplos: um amor-perfeito é uma planta/flor, um bate-boca é uma discussão, um ano-luz é uma distância, um pé-de-cabra é uma ferramenta. Pegando neste último, se se tiver uma quantidade de x,5 unidades (x objetos inteiros + metade de outro) o correto é dizer-se «um pé-de-cabra e meio» e não «um pé-de-cabra e meia [ferramenta]».
Existe concordância em género e a mesma verifica-se para termos femininos; «quatro sextas-feiras e meia» é correto, «quatro sextas-feiras e meio [dia]» é incorreto.
Ora, tendo em conta os exemplo anteriores, por que motivo dizer que «meio-dia e meio», quando se está a referir claramente a uma hora concreta + metade dessa própria hora (a hora 12 + 30 minutos, 12h30), é considerado gramaticalmente incorreto?
Não se criou uma exceção ao não se aceitar que meio está relacionado com o substantivo masculino «meio-dia», e se está a interpretar erradamente que alguém está a querer dizer “meio-dia e meio hora”? Não será este caso único onde o género implícito do objeto/conceito (neste caso, a hora) se sobrepõe ao género da palavra que o designa («o meio-dia»)?
Obrigado
Resposta:
Mantemos a posição de que a formulação correta é a forma «meio-dia e meia».
Antes de mais recordemos que os fenómenos de concordância ocorrem em função do género gramatical da palavra independentemente de ela designar uma realidade extralinguística com um género masculino ou feminino (o que só se aplicará com seres vivos, e mesmo assim nem todos). Deste modo, diremos «um papagaio simpático», fazendo a concordância no masculino, independentemente do seu género natural (neste caso, macho ou fêmea).
A relações de sinonímia, hiponímia, meronímia ou outras que a palavra mantenha com outras também não afeta concordância: diremos sempre «um amor-perfeito maravilhoso», independente de estarmos que pensar que estamos a referir uma planta ou uma flor.
De igual modo, e pegando num dos exemplos apresentados pelo consulente, um «pé-de-cabra» é, de facto uma ferramenta, mas também poderá ser um instrumento. Todavia, não é esta relação de hiperónimo-hipónimo (classe-elemento) que vai determinar a concordância de meio na expressão «pé-de-cabra e meio». Esta concordância é determinada pelo elemento que está omitido, o qual não decidido individualmente por cada falante. Deste modo, em «pé-de-cabra e meio», a concordância de meio é feita com «pé-de-cabra», que é um nome masculino, sendo a expressão completa «pé-de-cabra e meio pé-de-cabra»1. É este facto que justifica o aparecimento do género masculino.
No caso da construção «meio-dia e meia», comecemos por recordar que «meio-dia» é um nome masculino que refere «a décima segunda hora, a que divide o dia em duas partes iguais»2. Repare-se que a palavra meio que segue este nome composto não é uma redução de «meio-dia». Trata-se, antes, de um adjetivo que incide s...