No caso em apreço, à luz do Dicionário Terminológico1, o constituinte «para atravessar o Atlântico» desempenha a função de modificador do grupo verbal.
Para distinguir a função de complemento da função de modificador, podemos usar o teste pergunta-resposta. À frase em análise, coloca-se uma questão com a estrutura «O que é que SU fez OBL?»2 Os constituintes que são complementos do verbo não podem ocorrer nesta interrogativa, sendo a resposta mínima não redundante constituída pelo verbo e seus complementos. Assim tomando a frase (1), a aplicação do teste evidencia o constituinte que pode aparecer na pergunta e que não aparece numa resposta redundante:
(1) P: «O que é que eles fazem para atravessar o Atlântico?»
R: «Eles usam o vapor.»
Recordemos, adicionalmente, que o constituinte «para atravessar o Atlântico» pode ser suprimido da frase sem provocar agramaticalidade e é móvel, como se observa em (2) e (3), respetivamente:
(2) «Eles usam o vapor.»
(3) «Para atravessar o Atlântico, eles usam o vapor.»
Assim, observando os testes aplicados e seguindo os critérios definidos no Dicionário Terminológico, conclui-se que o constituinte «para atravessar o Atlântico» desempenha a função de modificador do grupo verbal.
Não obstante, indo para além do que se prevê no Dicionário Terminológico, há que ter consciência de que existem situações em que, por vezes, a distinção das funções de complemento oblíquo e modificador do grupo verbal envolve ambiguidades. A frase apresentada pode incluir-se nestas situações, porque, por um lado, o verbo usar pode surgir como verbo transitivo direto e indireto. No entanto, tal como se regista em Celso Luft3, o complemento oblíquo poderá não ser obrigatório. Tal como se explica nesta resposta, há situações em que o verbo pede um argumento que não é obrigatório. Este será um caso de complemento opcional. Ora, esta interpretação pode ser aplicada ao constituinte «para atravessar o Atlântico», que poderia, neste caso, ser classificado como um complemento oblíquo opcional.
Recorde-se que esta não é uma situação prevista no Dicionário Terminológico, pelo que esta abordagem não é possível no ensino não universitário.
Disponha sempre!
1. Apresenta o referencial gramatical para o ensino não universitário em Portugal.
2. Teste proposto em Mateus et al., Gramática da Língua Portuguesa. Ed. Caminho, p. 295. SU = sujeito e OBL = complemento oblíquo.
3. Celso Luft, Dicionário prático de regência verbal. Ática.