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1. A presença nos usos quotidianos de construções como «Mãe, posso água?» tem estado no centro das atenções em Portugal, como se conclui pela reportagem divulgada pela CNN Portugal. As estruturas em questão, associadas sobretudo ao universo linguístico infantil, ocorrem em casos de complexo verbal formado pelo verbo auxiliar poder seguido de um qualquer verbo principal, o qual é elidido. A recuperação inferencial do verbo por parte do interlocutor fica, assim, dependente do contexto. Por exemplo, uma criança, dirigindo-se à mãe, aponta para uma fatia de pão e verbaliza «Posso pão?», deixando à progenitora a tarefa de recuperar o verbo comer. O fenómeno conta já com vários registos por todo o país e tem deixado pais e professores preocupados. A situação abre a possibilidade de nos encontrarmos perante uma mudança em curso. A este propósito, importa ter presente que a língua não é estática e que as alterações, entre as quais as sintáticas, ocorrem na história da evolução do português. A título de exemplo, recordemos que, entre os séculos XIII e XIV, a colocação dos clíticos em frases afirmativas ocorria tanto em posição pré-verbal como pós-verbal. Veja-se como era correta a frase, hoje inaceitável em português europeu, «E a donzela lhe disse entom (...)»* (Primeiro Livro de Linhagens, Piel e Mattoso, 1980, 28). Não esqueçamos, todavia, que os processos de evolução necessitam, antes de mais, de tempo para se fixarem na língua e para se alargarem a vários segmentos da sociedade. Nenhuma destas premissas se verifica neste momento pelo que é ainda muito cedo para falar em mudança linguística. Poderemos, sim, considerar que o fenómeno de elipse presente nas construções infantis resulta de um processo de economia linguística e que as razões que o explicam não serão alheias ao facto de estarmos perante estruturas produzidas por crianças em estado de aprendizagem e alargamento do conhecimento sintático (e não só) da língua. Falar em mudança é, assim, extemporâneo.
*O estudo e exemplos estão presentes em Ana Maria Martins, "Mudança sintática e história da língua portuguesa", In B. Head et al. (eds.). História da Língua e História da Gramática: Actas do Encontro. Univ.do Minho, 2002, pp. 251-297)
2. É também a defesa da língua portuguesa que move a professora e antiga consultora do Ciberdúvidas Maria Regina Rocha. Constatando a presença cada vez mais generalizada da língua inglesa, sobretudo nos meios de comunicação social, a autora recorda títulos de programas e de rubricas, designações de cadeias de televisão e muitas opções que poderiam passar ao lado do recurso aos anglicismos (artigo divulgado no jornal Público e aqui partilhado com a devida vénia). A este propósito, registe-se o neologismo inglês entrado no léxico português: looksmaxing, usado para descrever o processo de aperfeiçoar a aparência pessoal.
3. A presença do português do Brasil nas salas de aula portuguesas e no contexto social em geral tem contribuído para a consciência mais generalizada da existência de diferenças nas regras ortográficas relativamente ao português europeu. O consultor do Ciberdúvidas e gramático Fernando Pestana elaborou uma síntese de diferenças ortográficas entre as duas variantes, que será útil conhecer para compreender a diversidade da língua portuguesa no mundo.
4. As dúvidas de natureza ortográfica levam, por vezes, os utilizadores da língua a hesitar entre grafias, uma situação que, por vezes, também é contemplada nas próprias análises dos gramáticos. Desta feita, apresentamos uma resposta que considera os casos das grafia de Cingapura / Singapura e beringela / berinjela. Ficam ainda disponíveis respostas para as seguintes questões: «Estão incompletas as aceções do termo nabo em alguns dicionários?», «O nome retrato pode ser acompanhado tanto de complemento como de modificador?», «A palavra impacto pode ser usada com particípio do verbo impactar?», «Papel rima com chapéu no português do Brasil?», «Qual a concordância possível em orações com quem?», «Os termos tanto e quanto integram sempre uma construção aditiva?»
5. Qual a forma correta: abaixo-assinado ou «abaixo assinado»? E em que contextos se poderá usar a expressão? Estas questões estão na base do apontamento da consultora Inês Gama para o programa Páginas de Português na Antena 2.
6. Destacamos os seguintes eventos:
– Em Portugal, o primeiro laboratório de visualização imersiva de arquivos históricos nacionais, um projeto conduzido pelo ISCTE, que pretende digitalizar e disponibilizar ao público arquivos de organizações como o Instituto da Mobilidade e Transportes, o Ministério da Defesa Nacional e do projeto Ephemera, de José Pacheco Pereira (notícia);
– A comunicação de Fabrizio Boscaglia intitulada Fernando Pessoa, Omar Khayyam e o Orientalismo em língua inglesa, no âmbito do seminário Fernando Pessoa e a Cultura Inglesa, com lugar na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, no dia 18 de fevereiro, entre as 15h e as 16h (também disponível em direto no canal Youtube).