♦ No dealbar do ano de 2017 – e enquanto as atualizações regulares do Ciberdúvidas não retomam o seu curso normal, em 9 de janeiro –, os festejos do Dia de Reis no mundo católico justificam uma chamada de atenção para alguns dos muitos textos em arquivo ligados ao tema dos Reis Magos*. Por exemplo: "A grafia de Melchior e Baltasar", "As variantes Belchior e Melchior", "Plural de bolo-rei: bolos-reis", "Cantar os/dos Reis", "História da língua em dia de Reis".
* No caso particular de Espanha, onde é fortíssima a tradição da celebração da festa dos Reis Magos, a 6 de janeiro, recomendamos a leitura do artigo "O dia mais feliz para todos os espanhóis", da autoria da correspondente em Lisboa da Cadena Cope e de La Voz de Galicia, Begoña Iñiguez, publicado no "Diário de Notícias" de 09/01/2017.
♦ Entretanto, a rubrica Correio acolhe um texto do consulente João Pimentel Ferreira, inspirado no apontamento satírico que Luís Carlos Patraquim publicou no Pelourinho, a respeito da profusão de anglicismos no Natal lisboeta. Ainda no Pelourinho, deixamos também disponível um apontamento da autoria do constitucionalista português Vital Moreira, transcrito do blogue Causa Nossa sobre um erro cada vez mais vulgar na imprensa portuguesa: a contração da preposição "de" ou das locuções prepositivas compostas por "de" com o artigo subsequente antes de verbos no infinitivo.
♦ Em Portugal, conforme dados do Instiituto dos Registos e do Notariado – e que registamos na rubrica Notícias –, Santiago foi o nome mais escolhido no ano transato para os meninos, enquanto para as meninas o preferido continua a ser o de Maria. Finalmente, na rubrica Diversidades, deixamos disponível o artigo "Como as expressões 'sqn' e 'tá serto' ajudam a entender a ironia" – publicado em dezembro de 2016 na revista “Linha D’Água”, do Programa de Pós-Graduação em Filologia e Língua Portuguesa da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, da USP (Universidade de São Paulo), sobre o uso de novas formas ortográficas na internet para expressar o que se circunscreve à oralidade. Transcrito, com a devida vénia, do jornal digital brasileiro Nexo.
♦ Neste tempo de balanços, voltam os passatempos promovidos pelas editoras que, em Portugal, mantêm dicionários eletrónicos, hoje muito procurados. É o caso da Priberam, cujo sítio eletrónico dá acesso à lista das palavras mais consultadas pelos seus utilizadores em 2016. Outro exemplo é a Palavra do Ano 2016, uma iniciativa da Porto Editora, que culmina em 4 de janeiro p. f. com o anúncio do vocábulo votado como o mais marcante do ano transato*. Já em Espanha, a Fundación para el Español Urgente (Fundéu BBVA) acaba de escolher a sua palavra do ano: trata-se de populismo, termo que assinala bem o momento político mundial, cujo equivalente português, populismo, tem também sido recorrente na atualidade publicada no espaço lusófono. Sobre a palavra do ano da Fundéu, leia-se o artigo que lhe dedicou o jornal andaluz Ideal. Por último, recorde-se que, para o inglês, o famoso Oxford English Dictionary selecionou como palavra do ano o vocábulo post-truth, a que fizemos referência aqui e que equivalem a formas como pós-verdade e pós-factual, as quais entraram também em rápida circulação em textos informativos e de opinião.
* Como anunciado, a Porto Editora revelou em 4 de janeiro que, neste passatempo, entre as dez palavras mais votadas, geringonça venceu, com 8750 votos, seguindo-se o vocábulo campeão, que ficou em 2.º lugar (29%), e Brexit em terceiro (com 8% de votos). Outros resultados: parentalidade (6%), presidente (6%), turismo (4%), racismo (4%), humanista (4%), empoderamento (3%) e microcefalia (1%). Observe-se que a palavra vencedora tem o sentido depreciativo de «coisa malfeita ou construção com pouca solidez», sendo sinónima de caranguejola ou « aparelho ou máquina considerada complicada; engenhoca»; em sentido figurado, o vocábulo também se aplica a uma «sociedade ou empresa de estrutura complexa e pouco credível », a que se junta ainda outra a aceção, talvez mais antiga que os anteriores significados, como o mesmo «linguagem vulgar, informal; calão, gíria» (cf. dicionário da Academia das Ciências de Lisboa). É por esta última aceção que parece poder compreender-se a origem desta palavra. Segundo nota etimológica do Dicionário Houaiss, geringonça tem origem «no castelhano jerigonza (c1350 sob a forma girgonz) "linguagem especial, difícil de compreender", do occitano antigo (ou se preferirmos do provençal antigo) gergons "idem", este derivado do francês antigo jargon ou gergon, originariamente "gorjeio dos pássaros", derivado da raiz onomatopaica garg-, que expressa as idéias de "tragar, engolir, falar confusamente" [...].» Refira-se que o Dicionário Houaiss dá como atestação mais antiga da palavra a sua ocorrência na Comédia Eufrosina ou Eufrósina de Jorge Ferreira de Vasconcelos, obra que terá sido concluída em 1543. Geringonça vem a ser, afinal, uma palavra com estreito parentesco com jargão. Quanto ao uso que geringonça tem tido ultimamente no discurso político em Portugal – em alusão ao governo minoritário do Partido Socialista, com o apoio parlamentar do PCP e do Bloco de Esquerda – a palavra marca ela própria uma posição ideológica de cariz depreciativo. Resultou de uma crónica do historiador Vasco Pulido Valente e, posteriormente, de uma intervenção no parlamento do então vice-ministro do anterior Governo PSD/CDS, Paulo Portas. [Sobre o tema, vide a notícia Quase nove mil portugueses votaram na "geringonça" (na palavra do ano, bem entendido), da autoria da jornalista Rita Pimenta, in jornal Público de 4/1/2017 + "475 anos de geringonça", artigo do jornalista Henrique Monteiro, no Expresso digital de 4/1/2017 + "Geringonça, a palavra que deu a volta ao texto", crónica do jornalista Ferreira Fernandes, no Diário de Notícias de 5/1/2017 + "A Geringonça, mas a da "Esopaida" de António José da Silva", crónica do jornalista João Paulo Guerra na Antena 1, 6/1/2017. E ainda: A geringonça vocabular do ano + O bom e mau uso do léxico político no jornalismo].
♦ Sobre os programas que o Ciberdúvidas produz para rádio pública portuguesa:
– O Língua de Todos de sexta-feira, 6 de janeiro (às 13h15*, na RDP África, com repetição no sábado, 7 de janeiro, depois do noticiário das 9h00*), entrevista o professor Lourenço do Rosário, reitor da Universidade Politécnica de Maputo, sobre as transformações que a língua de Camões, Craveirinha, Machado de Assis ou Mia Couto está a sofrer em Moçambique.
– Aprender a língua portuguesa não depende apenas de aprender as regras gramaticais ou a conjugação dos verbos. A aprendizagem da língua de Camões exige que haja um contacto precoce com as culturas veiculadas pelo idioma, sobretudo com a literatura e os seus clássicos. Se para muitos que têm a língua portuguesa como língua materna a leitura das obras de autores como Camilo Castelo Branco, Eça de Queirós, Aquilino Ribeiro, ou outros, pode ser difícil, para um estrangeiro, essa aventura pode tornar-se quase impossível. O Páginas de Português de domingo, 8 de janeiro (na Antena 2, às 12h30*, com repetição no sábado seguinte, às 15h30*), fala com Ana Sousa Martins, professora e coordenadora da Ciberescola da Língua Portuguesa, que adaptou Peregrinação de Fernão Mendes Pinto, Amor de Perdição de Camilo Castelo Branco e A Cidade e as Serras de Eça de Queirós, versões destinadas a aprendentes de Português Língua Estrangeira.
* Hora oficial de Portugal continental.