1. A realidade criada pela chegada do novo coronavírus desencadeou uma atividade linguística assinalável. Entre os fenómenos dignos de atenção, alguns dos quais tratados no Ciberdúvidas em diferentes momentos, encontra-se a produção de metáforas, entendidas como um processo cognitivo que procura compreender a realidade associando-a a domínios conceptuais já conhecidos. Já aqui foram abordadas metáforas nas áreas da guerra e dos fenómenos naturais, do caminho que se percorre e das doenças, da casa e das suas portas que abrem e fecham. A consultora permanente do Ciberdúvidas Carla Marques fecha agora este ciclo dedicado às metáforas da covid-19 com um apontamento sobre as metáforas do domínio cinematográfico, que recordam que neste filme que todos vivemos há monstros e heróis (que usam não capa mas máscara).
2. O dinamismo linguístico continua também a trazer novas palavras para A covid-19 na língua. Este glossário vai, assim, dando conta da evolução da situação e das realidades que vão ganhando realce, convocando novas palavras e expressões. Desta feita, destacamos ATL, alergologia, crise económica, dança, depressão, desigualdade, férias, fotografia, obrigado, perdigotos, poesia, respiradores e robotização.
3. Palavras como mouro, bárbaro, judiaria ou chinesice são sinais da linguagem de cariz racista e xenófofo plasmado na língua, como bem o atestam expressões como «trabalhar que nem um mouro» ou «rir que nem um preto», que remetem para fases pretéritas da história e da língua. Esta é a reflexão que partilhou connosco a professora universitária e presidente do Conselho Científico do IILP Margarita Correia na crónica apresentada no programa radiofónico Páginas de Português, da Antena 2 (áudio disponível aqui). De racismo também falou a professora Carla Marques ao refletir sobre as palavras respirar e joelho numa breve crónica divulgada no mesmo programa (que se pode ler aqui e ouvir aqui). Sobre o tema, vide, ainda: 10 expressões racistas que deveríamos tirar do nosso vocabulário + A linguagem do racismo, histórias antigas de preconceito e discriminação e o Carnaval contra o assédio sexual no Brasil.
Ilustrativo destas marcas estereotipadas no léxico do português é este divertido video:
4. O registo popular caracteriza-se por adaptar palavras e construções. Nestes processos, a modalidade oral assume uma responsabilidade maior ao contribuir para a alteração ou para a erosão das palavras, o que muitas vezes se fica a dever a uma questão de economia linguística. Foi assim que curiosidade terá evoluído para curgidade, como se explica nesta resposta divulgada na nova atualização do Consultório. Poderão ainda ser consultadas respostas de âmbito lexical («Andar em bando», «Office boy = contínuo e paquete» e «Procedimento cautelar e providência cautelar») e outras do foro sintático («Patente de produtos», «Levar uma surra, levar e ser levado» e «A porta abriu-se» vs. «a loja abriu»).
5. A lei portuguesa é bem clara quanto à obrigatoriedade da apresentação de texto em português em guias, rótulos, livros de instruções e outros elementos que acompanhem produtos vendidos em Portugal. Todavia, continuamos a identificar inúmeras situações em que a língua portuguesa é simplesmente ignorada, como se pode confirmar pelo apontamento de José Mário Costa, cofundador do Ciberdúvidas.
6. A expressão inglesa off the record é frequentemente utilizada, em particular pela comunicação social. Não obstante, a sua substituição por uma palavra portuguesa não só é possível como funciona de forma perfeita, como demonstra a professora Sara Mourato neste apontamento.
7. O professor universitário e tradutor Marco Neves continua a partilhar com os seus leitores apontamentos linguísticos relacionados com a atualidade. Desta feita, apresenta uma crónica sobre as línguas oficiais de União Europeia e uma outra sobre como se diz bilão em português, tema também já muito analisado no Ciberdúvidas (aqui, aqui e aqui, por exemplo).
8. Dia 15 de junho é dia de alargamento de algumas das medidas da terceira fase de desconfinamento na região de Lisboa. Abrirão assim centros comerciais, espaços com mais de 400 m2 , lojas do cidadão, entre outros. Passarão a estar abertos também centros de explicação e os ATL*
*Vale a pena lembrar que esta como todas as siglas não levam -s-, ainda que refiram uma entidade plural – ao contrário do recorrente uso errado no espaço público..
9. Alguns setores da sociedade não regressaram, todavia, à normalidade. É o caso do ensino que mantém a maioria dos alunos numa situação de ensino à distância, o que se verifica no ensino obrigatório, mas também, em muitos casos, no ensino superior. Esta situação tem levantado a possibilidade de um sistema de ensino assente em meios tecnológicos, o que tem gerado inúmeras reações oriundas de diferentes setores da sociedade, muitas discordantes, como acontece neste artigo de opinião do jornal Público.