Sendo eu professor de Português como Língua Estrangeira, começo por confessar que a questão da determinação dos nomes é uma das áreas mais problemáticas não só para quem aprende esta língua mas também para quem a ensina. Acrescento que não foi por acaso que o consulente não achou nenhuma regra clara. Na verdade, este aspeto do funcionamento da língua portuguesa está dependente de múltiplos fatores, não apenas linguísticos, o que faz com que seja difícil ir além de algumas generalizações pouco aprofundadas, com base em eventuais regularidades, muitas vezes em função de exemplos concretos, o que não permite o estabelecimento de uma regra que ajude os falantes com menos intuição a sentirem segurança absoluta na comunicação. Sendo esta uma área tão difusa, não caberia aqui uma explicação cabal do assunto, pelo que me limito a avançar com algumas considerações tendo em vista o tipo de exemplos apresentados na pergunta.
Em termos gerais, em português, a tendência é para associar a presença do artigo definido à designação de uma entidade particular (ou conjunto de entidades), atribuindo-se ao nome um valor referencial e perspetivando-se uma realidade definida em concreto. Por seu turno, a ausência de determinante traduz-se numa designação mais genérica, mais focada no valor denotativo da realidade referida, numa perspetiva mais indefinida sobre o nome, enquanto conceito.
Recorrendo à classificação usada na Gramática do Português (Fundação Calouste Gulbenkian, 2013), a dúvida colocada prende-se com o uso de sintagmas preposicionais completos (SPc), ou seja, que têm como complemento sintagmas nominais completos (SNc), com especificador (neste caso o determinante artigo definido), em alternativa ao uso de sintagmas preposicionais reduzidos (SPr), aqueles que têm como complemento sintagmas nominais reduzidos (SNr), ou seja, sem especificador.
Há, neste contexto, algumas situações que levantam menos dúvidas, exemplo disso são aquelas em que preferencialmente temos um SPc, quando o SP implica posse, como «O livro (é) do Marco». Paralelamente, existem casos em que é mais natural o recurso a um SPr, nomeadamente quando o SP designa matéria-prima, ilustrados por «O livro (é) de papel». Para além destes casos mais regulares, há muitos outros para os quais é difícil encontrar regras claras, já que a utilização ou omissão do artigo definido depende em grande medida do contexto, da intenção comunicativa e/ou da perspetiva do enunciador, ou ainda de opções de estilo, entre outros possíveis fatores. Ainda assim, nem sempre são evidentes as diferenças de significado, como se constata na seguinte passagem, retirada da Gramática do Português (Fundação Calouste Gulbenkian, 2013: 1071):
«um artigo sobre os adjetivos qualificativos tem o mesmo significado de um artigo sobre adjetivos qualificativos. […] na primeira expressão o sintagma nominal os adjetivos qualificativos denota uma espécie, enquanto classe natural de entidades, ao passo que, na segunda, o SN reduzido adjetivos qualificativos denota o tipo, ou seja, o conceito abstrato que representa a espécie. Neste contexto, essa diferença é subtil e não parece ter efeitos relevantes no significado das expressões.»
Posto isto, os exemplos constantes na pergunta do consulente têm múltiplas possibilidades de realização, dependendo do contexto ou de outros fatores anteriormente referidos. A observação do segundo par de exemplos, ambos SN, é suficiente para ilustrar o que foi dito acima:
a) «O consumo de antibióticos» vs. b) «O consumo dos antibióticos»
No SN em a) temos um SPr, o que pressupõe uma perspetiva mais genérica sobre «antibióticos». Deste modo, é mais provável a ocorrência deste SN num título de um texto sobre este tema. Por outro lado, numa conversa entre médico e paciente, poderá naturalmente ser produzido o SN em b), numa frase como: «O senhor deve controlar o consumo dos antibióticos com mais atenção.»
Apesar desta possibilidade de variação, há, na pergunta, dois SP que não são aceitáveis. Refiro-me aos seguintes, sublinhados e marcados com *:
c) «A etapa de/da retirada *de ingresso» e d) «Uso de/dos equipamentos *da proteção individual».
Em c), a opção por um SPr («de ingresso») sugere uma leitura indefinida, todavia, o SNr nele contido («ingresso») não a permite dado que, de acordo com a Gramática do Português (Fundação Calouste Gulbenkian, 2013: 857), os SNr podem ter uma interpretação indefinida com um nome contável no plural ou com um nome massivo no singular. Tendo em conta que ingresso é um nome contável, dentro de um SPr ele deve estar no plural. Assim, são aceitáveis as seguintes estruturas: «retirada de/dos ingressos» ou «retirada do ingresso».
Em d), conforme a Gramática do Português (Fundação Calouste Gulbenkian, 2013: 1067) o segmento sublinhado corresponde a um SP classificador, que é a subclasse mais produtiva dos SPr, no interior dos SN. Neste caso, o grupo nominal («proteção individual») não tem qualquer valor referencial, mas representa um conceito em abstrato, o que faz com que não seja muito lógica a opção por um SPc, com a inclusão de artigo definido. Então, a formulação mais natural será «Uso de/dos equipamentos de proteção individual».
Por último, para aprofundar o seu conhecimento sobre o tema, sugiro a consulta de outras respostas já publicadas aqui no Ciberdúvidas (ver Textos Relacionados).
Uma leitura também útil é o estudo de Joaquim Ramos (2012), Presença ou ausência de artigo nos sintagmas preposicionais complementos e/ou modificadores de nome.