O passado e o futuro do ensino de chinês em Portugal - Diversidades - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
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O passado e o futuro do ensino de chinês em Portugal
O passado e o futuro do ensino de chinês em Portugal
30 anos de ensino e desafios futuros

« (...) Durante mais de 30 anos, com os caminhos de Portugal e da China a cruzar-se continuamente nesta "aldeia global", verificou-se um interesse crescente de aprendizagem mútua da língua entre os dois povos. Hoje em dia, os cursos de chinês estão espalhados como cogumelos em todo o território português e em todos os níveis de ensino. E na China, de norte a sul e de leste a oeste, existem cerca de 60 universidades que ensinam português (...)»

 

Há dias passei pela Avenida 5 de Outubro, 115, sede da Delegação Económica e Comercial de Macau, antiga Missão de Macau em Lisboa. Surgiu-me de repente na mente a imagem antiga de uma fila longa que contornava a esquina com a Pastelaria Tim-Tim, logo de manhã cedo. Eram as pessoas que estavam à espera da abertura da Instituição às 9h, para a inscrição no Curso de Chinês. A cena repetiu-se anualmente, durante muitos anos, à porta da Instituição, pioneira de ensino de mandarim em Portugal.

Convém recuarmos um pouco na História. Durante vários séculos da administração portuguesa em Macau não foram promovidos no território nem o ensino de português a chineses nem o ensino de chinês a portugueses, situação essa que só foi alterada quando os dois governos assinaram a Declaração Conjunta sobre a Questão de Macau. Surgiram então duas enormes ondas de entusiasmo na aprendizagem de línguas, português pelos chineses de Macau e chinês pelos habitantes locais em Portugal.

Depois de ter trabalhado mais de dez anos numa universidade de Xangai e dois anos em Macau, a lecionar português, vim para Portugal no início dos anos 90, acolhendo de braços abertos essas duas ondas. Fomos, eu e o meu marido, Lu Yanbin, convidados pela Missão, primeiro para dar aulas de apoio, em português, aos bolseiros de Macau inscritos em diversos cursos em Portugal e depois também aulas de chinês, destinadas aos habitantes locais. Os dois cursos tiveram grandes sucessos, sendo o de português alargado para toda a comunidade chinesa em Lisboa e o de chinês, desdobrado no curso da Delegação e no curso do Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM).

Durante mais de 30 anos, com os caminhos de Portugal e da China a cruzar-se continuamente nesta "aldeia global", verificou-se um interesse crescente de aprendizagem mútua da língua entre os dois povos. Hoje em dia, os cursos de chinês estão espalhados como cogumelos em todo o território português e em todos os níveis de ensino. E na China, de norte a sul e de leste a oeste, existem cerca de 60 universidades que ensinam português com diplomados a trabalhar entre a China e o mundo lusófono, em contraste com apenas duas licenciaturas, uma em Pequim e a outra em Xangai, quando comecei a ensinar português em 1977.  

Ser uma pessoa bilingue chinês/português é fantástico! São duas das línguas mais faladas no mundo e o número dos seus falantes supera um quinto da população mundial! Por saber falar português, nunca me senti estrangeira desde o primeiro dia em solo português. «O relacionamento entre os países consiste na amizade entre os povos e esta consiste na sintonia das suas ideias.» A língua é sem dúvida o instrumento mais eficaz para alcançar essa amizade e sintonia.

Por isso, num colóquio sobre A Língua de Camões, ao responder à pergunta Quem vai falar português no futuro, intervim: «Serão incluídos, sem dúvida, os chineses que vão trabalhar com a língua portuguesa e a grande comunidade chinesa espalhada pelo mundo lusófono.» Num outro colóquio sobre o ensino de mandarim e patuá, defendemos, eu e Lu Yang, meu filho, na nossa intervenção: para melhor promover o ensino de chinês em Portugal é primordial formar docentes locais, com medidas concretas de formação e qualificação, pois não é qualquer chinês nem qualquer português que tenha estudado chinês que pode lecionar a língua chinesa.

Tendo percorrido três décadas, o ensino de chinês em Portugal aplaudirá o 1.º Fórum sobre o Ensino de Chinês como Língua Estrangeira em Portugal, que terá lugar no CCCM, dia 14 e 15 de outubro, com transmissão via Zoom.

No 1.º dia será a sessão de abertura, com a exposição Êxitos de Ensino de Chinês em Portugal. No 2.º dia destacam-se as palestras em chinês dos três especialistas convidados: Prof. Federico Masini, sinólogo, linguista e tradutor italiano, vice-reitor da Universidade de Roma e vice-presidente de International Society for Chinese Language Teaching (ISCLT); Juan Alférez, sinólogo, linguista e tradutor espanhol e Diretor Espanhol do Instituto Confúcio da Universidade de Granada; e Liu Lening, linguista, diretor do Núcleo de Estudos Chineses da Universidade de Columbia (EUA) e membro do Conselho Permanente de ISCLT.

Não me são estranhos esses três nomes, pois é famosa a fluência com que o italiano e o espanhol falam chinês. Estou ansiosa por ouvir o Prof. Masini falar sobre o programa local de ensino de chinês em mais de 80 universidades e 300 escolas secundárias públicas italianas e respetiva elaboração de manuais de ensino, para comparar com os nossos livros editados pelo CCCM, ouvir o Prof. Liu falar sobre métodos de ensino-aprendizagem e o Prof. Alférez sobre o desafio de ensino de chinês perante a distância entre línguas, escritas e culturas.

Encontram-se hoje tantos chineses e portugueses a lecionar português na China e chinês em Portugal. Espero ver no futuro, entre eles, alguns sinólogos portugueses comparáveis com o Prof. Masini e Prof. Alférez, para honrar o intercâmbio multissecular entre a China e Portugal! A tarefa é dura e o caminho a percorrer é longo. Mas vamos trabalhar duro para alcançar a meta!

 

Cf. Catálogo de autores portugueses publicados na China – edição 2022

Fonte

Artigo publicado no Diário de Notícias, de 14 de outubro de 2022.

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