Consultámos F. V. P. da Fonseca, que considera: «Só é legítimo empregar crianças-soldados, com hífen e ambos os elementos no plural.»
Com efeito, apesar dos muitos problemas que o hífen levanta, o seu uso é necessário e coerente em compostos constituídos por dois substantivos [operação-relâmpago, actor-encenador], por uma forma verbal e um nome (lava-loiças) e por uma preposição e um nome (sem-abrigo). É que observam Margarita Correia e Lúcia San Payo de Lemos, em Inovação Lexical em Português (Lisboa, Edições Colibri/Associação de Professores de Português, 2005, pág. 42).
Sobre o plural dos compostos formados por dois substantivos, estas investigadoras identificam dois tipos que correspondem a duas estruturas semânticas diferentes, os quais são, aliás, os que andam identificados nas gramáticas tradicionais:
1. Compostos que denominam um hipónimo do seu núcleo
O composto é globalmente um termo mais específico do que a palavra que ocupa o lugar da esquerda nesse mesmo composto: por exemplo, comboio-fantasma é um tipo de comboio. Desta maneira, no composto, é a palavra à direita — neste caso, fantasma — que faz tal especificação.
2. Compostos copulativos ou por coordenação
«[...] são compostos que permitem denominar uma entidade através da coordenação de duas das suas propriedades. É o caso de actor-encenador, surdo-mudo ou cirurgião-dentista» (ibidem).
Como se forma então o plural destes compostos? Nos de tipo 1, apenas o substantivo à esquerda passa ao plural: turista-caracol/turistas-caracol. Já os compostos do tipo 2 vêem ambos os elementos tomarem a marca de plural: cirurgião-dentista/cirurgiões-dentistas (idem, págs. 41/42).
Em relação a criança-soldado, parece-me tratar-se de um composto de dois substantivos do tipo 2, porque com ele não se refere um tipo de criança, mas, sim, uma criança que é ao mesmo tempo um soldado. Sendo assim, o plural mais correcto é crianças-soldados.
Dito isto, parece-me, apesar de tudo, que estamos num terreno um tanto instável, porque há quem possa argumentar que as crianças-soldados constituem um subconjunto das crianças em geral; como tal, são um tipo de criança, e, por isso, o composto criança-soldado pode também ter o plural crianças-soldado. Sugiro que tudo dependerá do contexto em que se use o composto em apreço. Se estivermos a identificar tipos de criança (as crianças-génio, as crianças-problema), pode fazer sentido o plural crianças-soldado.