Esta sua pergunta é muito pertinente. O plural dos substantivos compostos não é um assunto consensual, havendo a necessidade de uma sistematização clara.
A adopção por parte de dicionários do plural dos dois componentes da palavra residirá talvez no facto de esse segundo elemento ("cama") não ser sentido como tipo ou finalidade do sofá, mas como elemento intrínseco: trata-se de um sofá que é simultaneamente cama. Cama não designaria apenas a função ou o tipo. Não é só um sofá que desempenha a função de cama, que é do tipo de uma cama, mas, sim, um sofá que é realmente uma cama, que se transforma fisicamente numa cama (não está só a fazer as vezes dela). Assim sendo, o termo teria a flexão normal dos compostos formados por dois substantivos que designam a dupla essência do novo ser, objecto, etc., indo para o plural ambos os elementos de composição.
Estou a tentar explicar aquilo que considero inexplicável. Efectivamente, caro consulente, diz muito bem: de acordo com as normas gramaticais, nas palavras compostas por dois substantivos, na formação do plural, o segundo elemento permanece invariável, quando se trata de termo que designa a função, o tipo, a finalidade, elemento que funciona como aposto do outro, esclarecendo de que tipo é, que é uma espécie de, que serve para ou de, que desempenha a função de, que tem a forma de.
Assim, rigorosamente, o plural de "sofá-cama" como o apresentou não segue a norma. Se algum dos dicionários actuais quer fazer o registo do que se diz, é da sua responsabilidade. Não é por um grupo de pessoas ou até, eventualmente, um grande número utilizar uma expressão incorrecta que ela passa a correcta. Claro que é mais fácil pôr tudo no plural, sem se estar a pensar sobre o termo, mas esse desleixo não deve ser seguido pelos que têm responsabilidades a nível do ensino e divulgação da língua.
Os dicionários, que eu saiba, não são a bíblia do léxico nem, muito menos, da gramática da língua.
Aliás, nos dicionários nem sequer, por vezes, se vislumbra o critério seguido. Veja-se, por exemplo, o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa (Abril 2001), que apresenta correctamente os plurais carruagens-cama, cartões-pedra, escolas-piloto, filhos-família, mas já apresenta as duas hipóteses de plural em navios-escola/navios-escolas, navios-tanque/navios-tanques, peixes-aranha/peixes-aranhas, peixes-espada/peixes-espadas, e, nas palavras seguintes, só regista este plural: carruagens-bares, carruagens-restaurantes, pombos-correios! São apenas alguns exemplos de palavras que, no plural, segundo a norma linguística, não devem flexionar o segundo elemento.