O que é exposto pelo consulente constitui uma excelente fundamentação para o uso do hífen em associações lexicais que incluam menina e menino. Contudo, à luz da ortografia em vigor e dos atuais registos dicionarísticos1, não se pode dizer que o hífen seja estritamente obrigatório nestas associações lexicais.
É verdade que, a reforçar a necessidade de um hífen, existe a noção de determinante específico, que tem aceitação na lexicografia brasileira e abrange, por exemplo, o uso de mãe como segundo elemento na formação de compostos. Leia-se, a propósito desta palavra, a nota de gramática e uso que lhe dedica o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (1.ª edição, 2001, s. v. mãe):
«vindo após outro substantivo, ao qual se liga por hífen, [mãe] é um determinante específico e significa "fonte", "origem" (navio-mãe, idéia-mãe, célula-mãe), "geratriz" (rainha-mãe), "principal", "mais importante" (agulha-mãe, nave-mãe); anteposto, significa "que é mãe" ("a mãe-leoa defende até a morte seus filhotes"), "origem", "lar" (mãe-pátria, mãe-Terra)»
Ainda segundo o Dicionário Houaiss, também o vocábulo mulher se emprega como determinante específico, mas, neste caso,nem sempre com hífen:
«empregado também apositivamente (determinante específico que significa "relativo à feminilidade, às qualidades ou aos atributos femininos, ou o aspecto ou os elementos femininos da personalidade") em: a) locuções: menina mulher; filha mulher; b) composições eventuais, ligando-se por hífen à primeira palavra: gerente-mulher, tenente-mulher, anestesista-mulher etc.»
Assinale-se, porém, que noutras fontes se dispensa a hifenização com outros itens, como sejam macho e fêmea – cf. Nova Gramática do Português Contemporâneo (1984, p. 196) de Celso Cunha e Lindley Cintra, e Gramática do Português (Fundação Calouste Gulbenkian, 2020, p. 2909, n. 88) – que se juntam a nomes sobrecomuns (que denotem entidades humanas) e epicenos (que denotem entidades não humanas, ou seja, animais) em resultado da sua recategorização como adjetivos, podendo o mesmo acontecer a homem e mulher (ex., «carrasco mulher»).
Tampouco é consensual que os compostos decorrentes da justaposição de macho/fêmea ou homem/mulher constituam unidades com sentido próprio, distinto dos associados destes constituintes. Na realidade, mantendo-se a composicionalidade do composto (isto é, a possibilidade de interpretar o composto pela interpretação semântica dos seus elementos), o uso ortográfico em Portugal – que não o do Brasil, como se pode confirmar pelo Dicionário Houaiss, s.v. macho – é o de não hifenizar estes casos.
Em suma, a hifenização dos casos mencionados é facultativa quando se trata de marcar analiticamente o contraste de género, pelo menos, em Portugal, e pode generalizar-se à associação do nome sobrecomum bebé com menino e menina usados como marcadores dessa distinção. A opção pelo hífen ou a sua omissão dependem, portanto, de uma decisão editorial explicitada, por exemplo, num livro de estilo.
1 Ver Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 (Base XV, 1), bem como o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa e o Dicionário Infopédia. É de realçar que, no quadro da norma ortográfica de1945, vigente em Portugal até 2009, também não era claro o procedimento a adotar na escrita das associações vocabulares em apreço.