Um livro que bem pode classificar-se como um antidicionário de dificuldades da língua. Depois de 12 Segredos da Língua Portuguesa, o professor universitário e tradutor português Marco Neves faz nova incursão no mundo do prescritivismo gramatical, para, ao modo dos muitos guias publicados na última década em Portugal, acabar por contrariar uma a uma várias ideias feitas sobre o português e outras línguas naturais.
Trata-se de uma obra na sua maior parte preenchida por um conjunto de 41 secções, cada qual dedicada a uma expressão ou construção supostamente incorreta, como seriam os casos de «beijinhos grandes», «o comer», «fazer a barba», «já agora», «mal e porcamente», entre outros. Configura-se, assim, um reportório de erros, afinal, inventados deliberada ou inconscientemente – os «erros falsos» do título –, em cujo comentário por vezes se intercala a desmontagem de 12 mitos sobre a linguagem e os seus estudos. Uma introdução e um glossário precedem esta lista, seguida ainda de um epílogo que revela como os pseudoerros, sem serem um exclusivo do contexto português, têm igualmente levantado barreiras sociais noutros domínios linguísticos – o do inglês não é exceção. As notas facultam de forma concisa informação bibliográfica útil, que permite aceder ao essencial da discussão em torno da natureza do fenómeno linguístico e da sua regulação em sociedade; o índice remissivo final facilita a consulta. É deste modo que, ao longo de mais de duzentas páginas, o autor vai tomando posição contra os «cultores da tal norma curta», quando declara, por exemplo, na p. 50: «No fundo, o que estou aqui a defender é que sejamos mais abertos à língua toda, menos insistentes num uso limitado e pouco arriscado da mesma, mais decentes na forma como encaramos os outros. A língua, a literatura e os nossos dias só têm a ganhar.»
Dicionário de Erros Falsos e Mitos do Português (editora Guerra & Paz) é um livro estimulante – e também bem-sucedido no intuito de divulgar junto dos seus leitores o que hoje se sabe sobre o funcionamento das línguas, assim contribuindo para um uso crítico, mais consciente, do português oral e escrito.
Cf. O português é uma língua estranha? + «Volta à França» é erro de português? + O estranho caso do português que pensava que sabia inglês + Expansão, papiar e bué
N. E. – Sobre esta obra, leia-se também o texto intitulado "Queria um copo de água, depois vou fazer a barba", que o jornalista português Nuno Pacheco assinou no Público de 23/11/2018. E, ainda, do próprio autor, o apontamento O que é um erro falso de português?
Este é um espaço de esclarecimento, informação, debate e promoção da língua portuguesa, numa perspetiva de afirmação dos valores culturais dos oito países de língua oficial portuguesa, fundado em 1997. Na diversidade de todos, o mesmo mar por onde navegamos e nos reconhecemos.
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