Depois de abordar a língua em diferentes áreas, Marco Neves aceitou o desafio de lançar no mercado uma gramática. A Gramática para todos – o português na ponta da língua, da editora Guerra & Paz, é uma obra que dá continuidade ao estilo informal a que o autor já habituou os seus leitores.
A opção pela coloquialidade fica patente na organização da própria obra, que, mitigando as tradicionais partes da gramática, recorre a metáforas que ilustram o funcionamento gramatical, sendo suscetíveis de simplificar o conteúdo de cada capítulo aos olhos de um leitor não especializado: a secção «Armazém das palavras» aborda a morfologia («Peças para construir palavras») e as classes de palavras, distinguidas entre «Armazéns de porta aberta» (as classes abertas) e os «Parafusos da gramática», as classes fechadas, ditas funcionais; a secção «A máquina das frases» inclui o «Molde da frase» (funções sintáticas e grupos de palavras, mas também secções mais inovadoras, do género «Como criar frases infinitas»). A gramática dedica também um capítulo à produção textual («Como criar um texto»), um outro ao tratamento das dúvidas / erros frequentes («O verniz da escrita»). Aborda, por fim, a «Pontuação», «Sinais», «Abreviaturas, siglas, acrónimos e números» e «Maiúsculas e minúsculas».
No plano estrutural é, portanto, uma gramática que oscila entre a tradição e a procura de zonas de inovação, o que se afigura uma tarefa difícil quando se fala de gramática e, sobretudo, quando o objetivo é clarificar a gramática já existente. Não obstante, fica claro que todas as opções da gramática da autoria de Marco Neves se constroem a pensar no leitor não especialista e nas suas potenciais dúvidas / dificuldades. Por exemplo, as subclasses dos artigos e os seus tipos são assim descritas: «Os artigos são os determinantes mais conhecidos. Vêm em dois sabores.» (p. 59). Esta opção por um discurso mais informal e pela introdução ocasional de um tom jocoso, que poderão não ser apreciados por um leitor mais conservador, terá a virtualidade de chamar a atenção de leitores pouco despertos para o discurso gramatical, intenção que também se verifica na explicação da utilidade dos artigos numa língua ou nas regras de uso que a eles se associam. Será também motivado por este objetivo de cativar leitores novos que Marco Neves alerta, em diversas ocasiões, para erros típicos, apresentando propostas de correção, como é, por exemplo, o caso dos problemas de concordância (cf. p. 81).
A construção de um caminho que torna a gramática acessível aos leitores que se iniciam nestas lides é, em diversas ocasiões, muito eficaz. Veja-se, a título ilustrativo, a clareza que o autor consegue na distinção entre verbos transitivos e intransitivos (cf. p. 78). Não obstante, em determinadas ocasiões, as questões gramaticais envolvem um grau de complexidade tal que não se coadunam com uma tentativa de simplificação. Daí a distinção entre modificador do nome e complemento do nome não ser muito esclarecedora para quem tem dúvidas na identificação destas funções sintáticas. Muito útil para um escritor em iniciação (e não só) é o capítulo dedicado às dúvidas, que apresenta um conjunto de hesitações recorrentes na escrita ou de erros que surgem com alguma frequência.
Gramática para todos assume-se, deste modo, como uma obra de iniciação ao conhecimento gramatical, incluindo também uma vocação para prontuário e guia de escrita, numa linguagem acessível a qualquer leitor e, portanto, amiga de todos aqueles que têm vontade de iniciar a construção de um conhecimento gramatical.
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