« (...) Impor a sua língua é também uma forma de impor a sua visão do mundo e de escoar os seus produtos. Os Estados Unidos perceberam isto na perfeição. Os europeus e os franceses, menos bem…(...)»
[Os professores de língua] não dispensam tempo para ensinar a cultura linguística, o que é lamentável, inclusive do ponto de vista geopolítico, pois a língua, esquecemo-nos frequentemente, é também um instrumento de influência dos estados. O latim do tempo do Império Romano; o espanhol e o português na América latina; o árabe no Próximo Oriente; o francês no Magrebe e na África ocidental… Na história, língua e expansão territorial muitas vezes avançaram de mãos dadas.
Atualmente, esta regra é aproveitada sobretudo pelo inglês, que começou a difundir-se em países bem distantes das ilhas britânicas acompanhando as conquistas coloniais da Inglaterra. A língua de Shakespeare beneficia hoje do poderio dos Estados Unidos, cujo imperialismo conheceu três grandes fases: em primeiro, a conquista do oeste; depois, a anexação de territórios mais ou menos distantes, como o Havai, o Alasca e Porto Rico, antes da rutura operada depois da Segunda Guerra Mundial. Desde 1945, com efeito, o imperialismo linguístico americano deixou de depender da extensão geográfica dos Estados Unidos para passar a depender de outros três elementos: a tecnologia, o poderio militar e o domínio linguístico, tal como é sublinhado pelo historiador Daniel Immerwahr (1). Winston Churchill percebeu-o claramente. «Controlar a língua oferece muito mais vantagens do que tomar províncias ou países para explorar», declarava o antigo primeiro-ministro britânico. Antes de acrescentar a bem conhecida fórmula: «Os impérios do futuro serão espirituais». Um preceito completado por Donald Lillistone – um inglês – num excelente artigo da revista Défense de la langue française, onde escreve: «As línguas moldam as sociedades e o estatuto de que goza atualmente o inglês tem consequências pesadas e profundas» (2).
Os Estados Unidos têm disto consciência, como revelou, de forma espetacular, outro universitário, Robert Phillipson, professor no departamento de inglês na Copenhagen Business School (3) numa obra pertinentemente intitulada Linguistic Imperialism (Imperialismo linguístico), publicada em 1992. Aí desvendava um relatório confidencial elaborado depois de uma conferência anglo-americana sobre o ensino do inglês que se promovia em 1961 em Cambridge. Os princípios foram aí claramente enunciados desde o discurso de abertura: «O inglês deve tornar-se a língua dominante e substituir as outras línguas e as suas visões do mundo». Uma uniformidade cultural que se opõe diretamente ao nosso modelo europeu fundado no enriquecimento a partir da pluralidade, como testemunha a divida: «Unida na diversidade».
Por mais nefasta que seja, a política americana tem a seu favor o mérito da coerência: qualquer império, mesmo que espiritual, procura defender os seus interesses. Washington sabe perfeitamente que a Disney, Netflix, Apple e outras constituem os melhores meios para conquistar espíritos e escoar as suas mercadorias. Não poderemos dizer o mesmo da União Europeia que, apesar do Brexit, continua a estender o tapete vermelho ao inglês, a língua do país que acabou de a abandonar e da potência contra a qual se pretende concorrer! O mesmo não se poderá dizer da França, onde grande parte das “elites” acreditam ser elegante multiplicar os anglicismos, tornando-se numa espécie de idiotas úteis do imperialismo americano. Joe Biden, Google, Amazon e os outros nem pediriam tanto.
(1) How to hide an Empire, (Comment cacher un empire), de Daniel Immerwahr.
(2) L'empire spirituel, de Donald Lillistone, Défense de la langue française n° 279
(3) Linguistic Imperialism, de Robert Phillipson, Presses universitaires d'Oxford, 1992.
Artigo traduzido da revista L'Express, publicado a 29/06/2021