1. Não se fez esperar o impacto angustiante da identificação da variante ómicron (ou B.1.1.529), por mutação do SARS-CoV-2. Enquanto na Europa se vão fechando fronteiras, de África chegam recriminações pela falta de empenho dos países ricos em proteger da covid-19 as populações mais pobres. O tema merece, portanto, relevo especial na presente atualização, como adiante se mostra:
– Na rubrica "A covid-19 na língua", três entradas: ómicron, nome de uma das letras do alfabeto grego e agora também da mencionada variante do novo coronavírus; «o melhor é respirar fundo» frase proferida pelo Presidente da República português, a propósito da visita que fez a Angola em 27 e 28 de novembro p. p. – apesar do súbito agravamento da pandemia; e "Duas pandemias?", uma crítica dos escritores José Eduardo Agualusa e Mia Couto reproduzida no jornal Público, em 28 de novembro, relativa à atitude discriminatória da Europa para com a África logo após terem sido identificadas as primeiras infeções provocadas pela variante ómicron.
– À nova variante dá-se o nome da letra ómicron, de acordo com o critério de atribuir nomes das letras gregas às variantes do SARS-CoV-2, pela sequência que têm no alfabeto. Contudo, este processo deixou de ser linear, e a razão de assim acontecer foi esclarecida pelo jornalista Pedro Cordeiro em 27 de novembro no semanário Expresso, em artigo que se transcreve com a devida vénia em Diversidades.
– No Pelourinho, a professora Lúcia Vaz Pedro chama a atenção para um erro na escrita e na pronúncia de ómicron, que como palavra esdrúxula terá de exibir acento gráfico na antepenúltima sílaba.
Acrescente-se que ómicron (ômicron no Brasil) é forma «consagrada pelo uso», conforme se observava em 1966 no Vocabulário da Língua Portuguesa, de Rebelo Gonçalves. Este filólogo considerava, no entanto, preferível ómicro «quer por ter mais regular terminação, quer por facilitar [...] a formação do plural: ómicros». A verdade é que ómicron/ômicron (do grego ò mikrón, «o pequeno, ou seja, breve» – cf. Dicionário Houaiss) é a forma que se fixou no uso correto, com os plurais omícrones (com deslocação do acento) e ômicrons (este registado como variante do Brasil; ibidem). Quanto à pronúncia de ómicron, em Portugal, o -n é articulado como segmento consonântico nasal – "ómicrón(e)" (transcrição fonética: [ˈɔmikrɔn]) –, com ambos os oo abertos, recebendo o primeiro o acento tónico. No entanto, dada a tendência de muitos falantes para interpretar esse -n final como sinal de nasalidade vocálica, é aceitável a pronúncia com o nasal: "ómicrõ" [observação atualizada em 05/12/2021].
2. No Consultório, abordam-se novos casos que ilustram tópicos recorrentes do estudo do funcionamento da língua, como seja a noção de família de palavras (a de avião), de verbo defetivo (por exemplo, eclodir) e o valor semântico da preposições (a vs. para). Comenta-se ainda a pertinência da distinção entre conotação e denotação para os programas escolares em Portugal e a grafia de compostos formados por nome e adjetivo («mestre florestal»).
3. Angola possui um rico património linguístico, pois, além do português, são várias as línguas da subfamília banta que se falam no seu território, salientando-se o umbundo, bem visível na toponímia de Benguela e na antroponímia da sua população. Sobre a necessidade de recuperar este legado, Bonifácio Tchimboto e Ana Maria Katemo Ucuahamba escreveram Do Desprezo ao Apreço do Nome (Benguela, 20919), a que a rubrica Montra de Livros dedica um apontamento de leitura.
4. Em O Afeganistão de A a Z, uma nova entrada, Sharbat Gula, regista o refúgio que a Itália concedeu a esta mulher de 49 anos, famosa desde há mais de três décadas, quando ainda criança, fugindo à guerra no Afeganistão, foi capa da revista National Geographic.
5. O racismo é sempre condenável, mas há também atitudes antirracistas que acabam ironicamente por se confundir com o seu alvo. Desta situação é exemplo a polémica gerada em março de 2021 nos Países Baixos, por causa do fator da pele imposto na tradução em neerlandês da poetisa negra norte-americana Amanda Gorman. O episódio motivou o jornalista e escritor angolano João Melo a escrever uma crónica publicada em 17 de novembro, no jornal em linha Mensagem, a partir deste dia igualmente disponibilizada na rubrica Controvérsias.
6. Também evocativa das malhas em que, para o bem e para o mal, os impérios coloniais europeus enredaram o mundo, a data de 1 de dezembro, em Portugal, é marcada pelo feriado com que se comemora a Restauração da Independência em 1640. Este acontecimento foi seguido de uma longa guerra com Espanha no espaço ibérico e, nos domínios portugueses no Brasil e Angola, de um conflito com outras potências europeias, entre elas, os Países Baixos. Relativamente à efeméride política, que teve também ampla repercussão linguística, sugere-se a leitura de "Dedicatória a D. Duarte e conversação entre amigos", "A Restauração de 1640 na história e na geografia da língua", "A relação entre restaurar/restauração e reformar/reforma", "Restauração" e "O primeiro de janeiro".
Na imagem, uma gravura alemã do século XVII que representa os acontecimentos de 1 de dezembro de 1640 em Portugal.
7. Devido ao feriado de 1 de dezembro, em Portugal, as páginas do Ciberdúvidas têm a sua próxima atualização na sexta-feira, 3 de dezembro.