Agradeço, em nome da equipa do Ciberdúvidas, as simpáticas palavras que teve a amabilidade de nos endereçar.
Como já aqui foi múltiplas vezes salientado por vários consultores, as regras do uso do hífen nas palavras compostas são das mais complexas na ortografia portuguesa. Aliás, os seus níveis de diversidade e de discrepância são tais, que o Acordo Ortográfico recentemente ratificado prevê a sua suposta simplificação.
A propósito do lançamento do seu mais recente livro, metaforicamente intitulado Peso do Hífen, Onésimo Teotónio Almeida, numa recente entrevista concedida ao Jornal de Letras, Artes e Ideias, faz justamente referência aos imbróglios históricos de que este pequeno traço horizontal tem sido epicentro, chegando mesmo a reconhecer que a opção pelo referido título para o seu livro não tenha talvez sido a mais feliz, sobretudo «depois dos acesos debates sobre o Acordo Ortográfico, referindo-se «obviamente à decantada questão do hífen».
Dito isto, compreenderá o nosso consulente que não será este o local mais adequado para entrar em considerações de tão exigente profundidade.
Podemos, contudo, dar aqui conta de algumas notas que, penso, serão do maior interesse do consulente, pois vão certamente ao encontro das dúvidas expostas:
1. Quanto à datação e origem da palavra hífen,o Dicionário Houaiss, por exemplo, estabelece o seu surgimento na língua portuguesa no ano de 1576, especificando-se que o mesmo deriva etimologicamente do «gr. huphén, adv. "juntamente", pelo lat. tar. hyphen»;
2. No que diz respeito à origem do uso do hífen na ortografia do português e à sua evolução no contexto da língua portuguesa, Rita Marquilhas, num artigo intitulado «O acento, o hífen e as consoantes mudas nas Ortografias antigas portuguesas» (in Castro, Ivo, A Demanda da Ortografia Portuguesa, com Inês Duarte e Isabel Leiria, Lisboa, Edições João Sá da Costa, 1987), fornece-nos algumas informações importantes. Segundo a referida autora, «Para os substantivos compostos não entrava ainda qualquer sinal diacrítico no universo gráfico de João de Barros» (p. 109); na verdade, em Portugal, só no séc. XIX é que «se tomou [...] consciência da pertinência da colocação do hífen no interior das formas compostas. Ele fora praticamente esquecido pelos gramáticos anteriores ao século XIX; aparecia nos manuais no capítulo reservado aos sinais de pontuação, geralmente sob o título de Outros Sinais, e funcionava quase sistematicamente em relação a três únicos exemplos: guarda-porta, passa-tempo, val-verde; haviam sido dados por Duarte Nunes de Leão, e sob uma diferente morfologia, a de guarda υ porta, passa υ tempo» (p. 113). Ainda segundo Rita Marquilhas, «Só em 1739, na Orthographia de Madureira Feijó, há o testemunho de o hífen ter sido morfologicamente assimilado à linha de seguimento que, desde os copistas medievais, se traçava no fim da regra (-) [...]» (p. 113). Contudo, «foi necessário que chegassem os sónicos [um dos partidos da disputa ortográfica, em oposição aos etimológicos], e a sua preocupação de retratar fonograficamente a língua falada, para que o hífen ganhasse um papel mais relevante, libertando-se dos seus exemplos clássicos».
3. Quanto à sua utilização a{#c|}tual, Cunha e Cintra, na Nova Gramática do Português Contemporâneo (pp. 66-69), elencam as regras fundamentais: «a) para ligar os elementos de palavras compostas ou derivadas por prefixação (...); b) para unir pronomes átonos e verbos (...); c) para, no fim da linha, separar uma palavra em duas partes».
Para além das pistas que aqui lhe deixamos (assim como da bibliografia já mencionada) e que, esperamos, lhe venham a ser úteis, seguidamente, apresentamos um pequeno conjunto de referências e sugestões, que o poderão igualmente ajudar no seu trabalho de pesquisa:
TEYSSIER, P. História da Língua Portuguesa, Lisboa, Sá da Costa, 1980
REBELO GONÇALVES, F. L. Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa, Coimbra, Atlântida, 1947, pp. 252-256
História da Língua Portuguesa em Linha, Instituto Camões
Procurando, via Google, por «história do hífen na língua portuguesa artigos», surgirá uma «linha cronológica» bastante interessante, contendo artigos diversos sobre a evolução do hífen na língua portuguesa.
Quanto à questão relativa à terminologia utilizada para descrever a acentuação de palavras, verifica-se que os termos agudo, grave e esdrúxulo são característicos da descrição gramatical feita em Portugal (cf. Nomenclatura Gramatical Portuguesa de 1967 e Dicionário Terminológico). Na Nomenclatura Gramatical Brasileira (1959), consignam-se os termos oxítono, paroxítono ou proparoxítono, mais usados pelos gramáticos brasileiros (cf. Evanildo Bechara, Moderna Gramática Brasileira, 2002, pág. 86).
N.E. – Sobre os critérios de hifenização depois do Acordo Ortográfico de 1990, acompanhe-se a explicação do gramático brasileiro Sérgio Nogueira em registo de vídeo: