Não há diferença entre as duas formas de pretérito mais-que-perfeito, a simples (lavara, estivera) e composto (tinha lavado, tinha estado): ambos marcam um intervalo de tempo anterior a outro intervalo passado, como se assinala na Gramática do Português (Fundação Calouste Gulbenkian, 2013, pp. 524/525):
«Na maioria dos seus casos, o pretérito mais-que-perfeito simples é praticamente equivalente ao mais-que-perfeito composto [...], muito mais frequente. [...] Corroborando esta equivalência, é possível que os dois tempos coocorram com o mesmo valor temporal: cf. "A Ana tinha visitado o avô, mas não lhe dissera que havia uma maneira de ele sair daquela situação."»
O que se observa na escrita é que ocorrem as duas formas, provavelmente com o intuito estilístico de evitar a monotonia:
(1) «Ah! Era tarde. Muito tarde. Ela bem via que o tinha perdido. Quisera resistir? Quisera fazer--se desejar? Coitada! Que infelicidade!» (João Gaspar Simões, Pântano, 194, in Corpus do Português, de Mark Davies).
(2) «Foi por eles que soube que " seu Jusa " se tinha enforcado e ficara todo um dia pendurado na corda amarrada na trave do tecto da loja [...]» (Castro Soromenho, Terra Morta, 1949, ibidem).
Se em (1) parece que o mais-que-perfeito simples marca um estado passado («quisera») anterior a outro associado ao mais-que-perfeito composto («tinha perdido»), o caso de (2) mostra que a forma composta refere um evento («se tinha enforcado») imediatamente anterior ao estado resultante indicado pelo tempo simples («ficara...»).