Não se trata da voz passiva, mas sim de uma construção antiga (um arcaísmo) do verbo chegar, equivalente ao pretérito perfeito simples do indicativo:
(i) «É chegada a hora da partida.» = «Chegou a hora da partida.»
O verbo é intransitivo e, portanto, não tem voz passiva.
Sobre este uso, frequente com chegar e outros verbos na Idade Média, dizia a filóloga e linguista brasileira Rosa Vírgínia Mattos e Silva (1940-2012) o seguinte1:
«Com um subconjunto de verbos classificados como intransitivos, ocorriam no período arcaico e até, pelo menos, no século XVI, sequências constituídas de ser + PP [= particípio passado], para expressão do "acto consumado" [...], ou seja, do aspecto concluído ou perfectivo. São verbos tais como: nascer, morrer, falecer, passar (= "morrer"), chegar, ir, correr (= "passar o tempo"). Veja-se, por exemplo, o refrão desta cantiga de Pai Gomes Charinho:
Idas som as frores
d'aqui bem com meus amores!
e o início desta de Pedr'Amigo de Sevilha [...]:
Quand'eu um dia fui em Compostela
em romaria, vi ũa pastor
que, puis fui nado, nunca vi tan bela.
A autora citada apresenta, entre outros exemplos medievais, outros já do Renascimento, da autoria de João de Barros (c. 1496-1570): «Lopo Soares era chegado»; «Era fallecido el rei Bolife».
1 Rosa Virgínia Mattos e Silva, O Português Arcaico. UmaAproximação.Vol. I, Léxico e Morfologia, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2008, pp. 436/437. Significado aproximado das formas verbais destacadas nos versos medievais: «idas som»: «foram-se (embora»); «puis fui nado» = «desde que nasci».