1.«Surpresa inesperada», «pequenos detalhes» ou «ambos os dois» são bons exemplos de pleonasmos, isto é, de sequências de palavras redundantes. Em O nosso idioma, a linguista Carla Marques explica o seu funcionamento, num texto que é também um exercício divertido para tomar consciência dessas expressões e saber evitá-las em discurso. Noutro apontamento, Sara Mourato comenta o topónimo Valhadolid, um dos aportuguesamentos do nome da cidade castelhana de Valladolid, onde, em 21/11/2018, se realizou a 30.ª Cimeira Luso- Espanhola. Entre o muito que se publicou no século XX em Portugal sobre preceitos normativos, recupera-se um texto do professor universitário, jornalista e escritor português Agostinho de Campos (1870-1944), a respeito dos usos incorretos da locução «ponto de vista». Já que se fala de erros, leia-se a reflexão feita pelo linguista brasileiro Aldo Bizzocchi no seu blogue Diário de um Linguista (20/11/2018), à volta do papel da inovação, variação e mudança na vida dos idiomas (texto transcrito, com a devida vénia, para O nosso idioma). Finalmente, porque se fala da dinâmica das línguas, transcreve-se a crónica que o professor e jornalista angolano Edno Pimentel assinou em 22/11/2018, no semanário Nova Gazeta, em torno de um caso de escusada concordância – «ela foi pouca esperta»
2. A abreviatura de observação, Obs., deve escrever-se sempre com ponto? O que é mais correto: «há que fazê-lo», ou «há que o fazer»? E a que classe de palavras pertencerá a palavra próprio? As respostas fazem parte da atualização do consultório, que inclui mais duas questões, uma sobre o regionalismo matação e outra sobre o uso de maiúsculas iniciais no geónimo Península Itálica.
3. Ainda sobre a visita oficial a Portugal do Presidente de Angola, João Lourenço, entre 22 e 24/11/2018, já devidamente assinalada na nossa anterior Abertura. Interrogado sobre o combate à corrupção no seu país, João Lourenço afirmou, em linguagem metafórica, estar disposto a «matar o ninho do marimbondo» (= ninho de uma espécie de vespas), mesmo que leve umas picadas. Marimbondo tata-se de um agolanismo registado no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa com a definição genérica de «designação comum e imprecisa aos insetos himenópteros, espécie da família dos vespídeos e pompilídeos, sociais ou solitários, geralmente maiores e dotados de ferrão, distinguindo-se das vespas por manterem as asas anteriores longitudinalmente dobradas quando estão pousados». A fonte citada menciona uma variante, maribondo, e atribui a origem de ambas as formas ao quimbundo mari'mbondo, um composto de ma, prefixo de plural, e rimbondo, «vespa». Sobre a influência do quimbundo e outras línguas bantas de Angola no português consultem-se os seguintes artigos e respostas: "A língua quimbundo" (1997); "Quimbundo/kimbundo" (1998); "Quicongo e quimbundo" (1999); "Quimbundo no português" (2000), "Xingo" (2014); "Um cubico sem aspas" (2015).
A imagem construída por João Lourenço com base no vocábulo marimbondo foi muito comentada pela comunicação social portuguesa. Sobre as declarações do Presidente angolano em Portugal, saliente-se a visão da jornalista Bárbara Reis em "Até os marimbondos ajudaram para criticar José Eduardo dos Santos", artigo de opinião saído no jornal Público em 23/11/2018: «Os marimbondos são vespas que caçam aranhas e a sua picada está no topo da escala da dor das picadas de insectos. Fazem parte da cultura popular angolana e há até um poema de Ernesto Lara Filho [1932-1977], "Picada de Marimbondo", que foi musicado pelo célebre Waldemar Bastos (e que Fausto adaptou para o seu disco A Preto e Branco [com versão de Filipe Mukemba]). Porque está a falar para dentro, mas também para fora, Lourenço usou a imagem com calma: “Quando nos propusemos combater a corrupção em Angola, tínhamos noção de que precisávamos de ter muita coragem, sabíamos que estávamos a mexer num ninho de marimbondos. Até se costuma dizer que a picada da vespa é mais dolorosa do que a picada da abelha, por isso imaginem... Nós sabíamos que podíamos ser picados. Já começámos a sentir as picadelas. Mas isso não nos vai matar. Não é por isso que vamos recuar. É preciso destruir esse ninho de marimbondos. Quantos marimbondos existem nesse ninho? Não são muitos. Angola tem 28 milhões de habitantes, mas não há 28 milhões de corruptos. O número é bastante reduzido. Há uma expressão em Angola: somos milhões e contra milhões ninguém combate. Essa expressão continua viva, não morreu. Que ninguém pense que, por todos os recursos que tem, de todo o tipo, consegue enfrentar-nos.” O recado ficou dado. Mais tarde, um jornalista angolano lembrou que a frase de propaganda das FAPLA (Forças Armadas Populares de Libertação de Angola), que ele ouviu muitas vezes quando era um jovem pioneiro, acaba assim: “Quem combate será derrotado.” [...]»
Cf. Sobre a evolução semântica do lexema “marimbondo”
4. Quanto aos programas produzidos pelo Ciberdúvidas para a rádio pública portuguesa, refira-se o Língua de Todos, que se centra no projeto de Português Língua Não Materna para alunos do 1.º Ciclo que a Ciberescola desenvolve em parceria com a Direção Geral de Educação (RDP África, sexta-feira, dia 23 de novembro, pelas 13h15*; com repetição no sábado, 24/11). No programa Páginas de Português, a situação da língua portuguesa na Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e em Cabo Verde é o tema central de uma entrevista às investigadoras Maria Antónia Barreto e Clara Carvalho (Antena 2, domingo, 25 de novembro, às 12h30*; com repetição no sábado seguinte, 1 de dezembro, às 15h30).
* Os programas Língua de Todos, e Páginas de Português ficam disponíveis posteriormente aqui e aqui. Hora oficial de Portugal continental.