Convém começar por esclarecer que a frase
(1) «Veja que dia é hoje.»
pode não incluir uma oração subordinada interrogativa indireta. Aliás, consideramos que, sem outro contexto, o verbo ver é, preferencialmente, um verbo diretivo que seleciona como complemento direto uma oração completiva que corresponde à ordem dada. Estamos neste caso perante um ato ilocutório diretivo.
Se considerarmos que o verbo ver é usado como verbo de conhecimento ou desconhecimento, então a oração que o acompanha será uma completiva interrogativa indireta. Um contexto como o seguinte, no qual ver pode ser tomado como sinónimo de descobrir/verificar, é suscetível de esclarecer esta possibilidade de uso:
(2) «Não sei a data de hoje. Veja que dia é hoje.»
Estamos, neste caso, perante uma interrogativa indireta que, não obstante, não relata uma pergunta1 e 2. A diferença entre as duas interpretações está, portanto, relacionada com as intenções do falante e ocorre no domínio da pragmática, como se explica nesta resposta.
Tomada à letra, a frase
(3) «Você pode ver que dia é hoje?»
é uma interrogativa direta. Trata-se de uma interrogativa global, que incide sobre o valor de verdade, pelo que só poderá ter como resposta sim ou não.
Todavia, habitualmente, este enunciado não é usado para colocar diretamente uma questão, mas antes para dar uma ordem de forma mais mitigada, opção que é sentida como mais polida. Neste contexto, este enunciado não pretende uma resposta de sim ou não, procura, antes, desencadear uma atitude no interlocutor: a de procurar identificar qual é o dia de hoje. Realizações desta natureza correspondem a atos ilocutórios diretivos indiretos.
Disponha sempre!
1. Este funcionamento das orações interrogativas indiretas está descrito na Gramática do Português, onde os autores apresentam como exemplos deste comportamento as frases «O Ricardo sabe quem ganhou o jogo.» e «A Maria já decidiu se vem.» (cf. Raposo et al., p. 1835).
2. A este propósito, veja-se também a resposta dada aqui.