Atlas Histórico da Escrita é o mais recente livro publicado pelo professor universitário e investigador na área das línguas, literaturas e cultura, Marco Neves, na editora Guerra & Paz (2023)¹. Profusamente ilustrado com os mapas, imagens e infografias² sinalizadoras dos principais registos que se conhecem da história das línguas no mundo dos últimos cinco milénios, a obra, como sintetiza o autor na apresentação, percorre as três grandes revoluções da escrita: «A sua invenção e evolução ao longo dos tempos; a expansão da imprensa, da literatura e da leitura nos últimos séculos; e a explosão, nos últimos 70 anos, da alfabetização, com mais de metade da população humana a saber ler e escrever». Ou seja, como a escrita «[se tornou] basilar para compreendermos o mundo».
Dividido em seis partes, o primeiro capítulo, "Os Alvores da Escrita", aborda a importância do «princípio de rébus» na passagem da protoescrita para a escrita e o mecanismo de distinção entre a escrita e outros tipos de sinais, como é o caso dos mais antigos que se conhecem (3100 A.C.), o acádio e o elamita, cunhados em argila.
Em "As Invenções da Escrita", o segundo capítulo, trata-se da origens das quatro mais importantes tradições escritas, com origem na Suméria (com um subcapítulo sobre os desenvolvimentos posteriores desta tradição), no Egipto, na China (com destaque ainda para a especificidade do Japão) e na Mesoamérica.
"A Invenção das Letras" e os "Sistemas do Mundo" são o terceiro e quarto capítulos que descrevem como foram inventados os sistemas consonantais e alfabéticos, assim como os principais sistemas de escrita hoje utilizados no mundo, inclusive os ainda «intrigantes» Disco de Festo (Creta) e rongorongo (Ilha da Páscoa).
Nos dois últimos capítulos deste seu precioso Atlas Histórico da Escrita, Marco Neves descreve a evolução do nosso alfabeto latino – da Antiguidade e dos usos do scriptorum trazidos para a corte de Carlos Magno pelo monge e matemático inglês Alcuíno de Iorque até à imprensa e a internet – e o que denomina como "A Terceira Revolução da Escrita": «A tecnologia aliou‑se à explosão da alfabetização de muitas sociedades, levando a capacidade de ler e escrever a uma percentagem da população que, em muitos países, chega praticamente aos 100 %. A alfabetização de toda a população é um fenómeno inédito na História – mesmo no Império Romano, pensa-se que a alfabetização nunca terá ultrapassado os 20% da população.»
Pouco mais de dois mil anos passados – como se assinala na Introdução da obra –, a verdade é que «ler e escrever» mal tinha atingido «a metade da Humanidade por volta dos anos 60 do século XX». Por isso, não parece exagerada a conclusão: «Daqui a 10 000 anos, os historiadores do futuro considerarão o nosso tempo como uma fase dos primórdios (...) da universalidade do conhecimento da escrita», não obstante o facto de, com «a explosão do digital» dos últimos 30 anos, «usarmos a escrita em situações inimagináveis há poucas décadas»:
«Acordamos a escrever mensagens de texto, deitamo-nos a ler uma notícia partilhada por um amigo. Até os vídeos a que assistimos têm cada vez mais legendas, mesmo quando estão na nossa língua. Passamos o dia a ler e a escrever – e queixamo-nos da língua. A escrita também permitiu desenvolver uma relação neurótica com a linguagem, que já se notava na velha Suméria, em que os escribas se queixavam dos jovens, esse malandros a maltratar a língua.»
1 12.º livro piblicado pela editora Guerra & Paz de uma coleção que integra o Plano Nacional de Leitura, iniciada com o Atlas Histórico de África, a que se seguiram o Atlas do Império Romano, o Atlas Histórico do Médio Oriente, o Atlas Histórico dos Estados Unidos da América, o Atlas do Holocausto, o Atlas do Antigo Egipto, o Atlas da Guerra Fria, o Atlas Mundial da Água, o Atlas Histórico do Mediterrâneo, o Atlas da Primeira Guerra Mundial e o Atlas das Fronteiras.
2 Mapas, imagens e infografias da autoria do ilustrador Nuno Costa
Cf. A invenção da escrita + As três revoluções da escrita + Breve história da letra C + Expansão, papiar e bué
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