Do ponto de vista linguístico, recomenda-se a forma hipospadia, «anomalia congénita da posição do meato urinário que abre na face inferior do pénis ou mesmo no períneo»1, com acento tónico na sílaba -di- (soa "hipospadía"), porque é a que se regista sistematicamente como nome feminino em diferentes dicionários e vocabulários ortográficos2.
No entanto, existe margem de tolerância para variantes, como se assinala, por exemplo, no Dicionário Houaiss, a propósito do elemento de composição -spadia:
«[-spadia] pospositivo, do radical grego spad- + -ia (sufixo. formador de substantivos abstratos), tal radical é ampliação do radical. spa- do verbo spáō "retirar, extrair, arrastar; fig. engolir, devorar; dilacerar" ocorrente em spadiks, ikós "ramo arrancado", spadón, ónos "extração, espasmo", spádón, ontos "eunuco" (> português espadão "homem castrado"); a variação prosódica spadía/spádia certamente se deve à flutuação entre a prosódia grega e a latina; ocorre ainda a possibilidade de um -s final cuja presença é de difícil explicação visto que não parece estar necessariamente indicando o número plural; é igualmente de difícil explicação a oscilação de género masculino/feminino, parece razoável apontar-se o género feminino como o normal para todos os vocábulos formados com este elemento de composição; ocorre na terminologia médica do séc. XIX em diante: anaspadia, anaspádia, anaspádias, epispadia, epispádia, epispádias, hipospadia, hipospádias.»3
Pelo confronto da informação do consulente com as fontes consultadas, conclui-se, portanto, que, apesar da maior correção de hipospadia, os profissionais preferem as formas morfologicamente mais discutíveis.Trata-se de uma situação frequente, a da existência de variantes, muitas com preferência, no uso, pelas filologicamente menos consensuais. Seria com certeza importante que uma entidade interviesse efetivamente na fixação das terminologias científicas e técnicas – em Portugal,seria incumbência da Academia das Ciências de Lisboa ou do Instituto Internacional da Língua Portuguesa. Não havendo intervenção desse tipo, é de esperar que continuem a registar-se oscilações e afastamentos em relação a formas obtidas com critérios linguísticos e filológicos mais estritos.
1 Dicionário de Termos Médicos da Porto Editora, disponível na Infopédia.
2 Foram consultados os vocabulários ortográficos atualizados: o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras, o vocabulário eletrónico da Academia das Ciências de Lisboa e o Vocabulário Ortográfico Comum do Instituto Internacional da Língua Portuguesa. Também se utilizaram o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (1940) da Academia das Ciências de Lisboa e o Vocabulário da Língua Portuguesa (1966) de Rebelo Gonçalves. Quanto a dicionários, recorreu-se ao Dicionário Priberam e o Dicionário Infopédia, ao dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, ao Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa e ao Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa.
3 Como também se observa no Dicionário Houaiss, a forma hipospádias também tem registos dicionarísticos desde o século XIX, figurando na 6.ª edição (1858) do dicionário de Morais da Silva e no Vocabulario etymologico, orthographico e prosodico das palavras portuguezas derivadas da lingua grega (Rio de Janeiro, 1909), de Ramiz Galvão.