Leite de Vasconcelos descreve brevemente o português falado pelos judeus na Europa na sua tese intitulada Esquisse d'Une Dialectologie Portugaise (1901), em duas ocasiões:
– quando refere a geografia do português, focando a presença histórica da língua portuguesa nos Países Baixos, na Itália e na Alemanha (Hamburgo e Baviera) – (pp. 19/20);
– e quando descreve as comunidades judaicas de Amesterdão e Hamburgo na passagem do século XIX para o século XX (pp. 195/196).
Na primeira sequência acerca do português dos judeus, depois de dar notícia do seu uso no porto italiano de Livorno, no século XVI, bem como em Amesterdão e Haia até época mais próxima, fala da visita que fez em 1899 às duas cidades neerlandesas e a Hamburgo, na Alemanha, para concluir que a língua portuguesa estava aí praticamente morta, apenas reservada a certas cerimónias. O filólogo português termina com o registo de na Baviera, entre judeus refugiados, se ter falado português até ao século XVIII.
Ao retomar este assunto mais adiante, centra-se no português de Amesterdão, mencionando o número de falantes («uma colónia de cerca de 5000 judeus de origem portuguesa e espanhola») e a conservação de várias expressões – Boaç festaç melhoradas, Boaç entrada [sic] de jejum. Regista também a fala de um judeu de 70 anos, de Amesterdão, não identificado, o qual revelava os seguintes traços fonéticos: o g e o r eram pronunciados à neerlandesa; o s nunca era chiado (Lopes era "Lopeç"); o nh soava aproximadamente como ing, com [ĩ] nasal e o ng do inglês ou do alemão; o lh era articulado como "l-lh". Os apelidos eram também alterados: Teixeira dizia-se "Tecsera" ou "Teicseira", por causa da ortografia.
Sobre o português de Hamburgo, falado por uma pequena comunidade até à data de publicação de Esquisse..., Leite de Vasconcelos assinala a conservação de fórmulas – «que Deus o escreva em livro de vidas» ou, perante um mulher grávida, «que faça boa parida, e que veja de seu recém-nascido muito gosto» –, várias formas híbridas – «Rezabuch», ou seja, «livro de orações», do português reza, «oração», e do alemão Buch, «livro» – e o uso de esnoga, forma arcaica e regional de sinagoga. Descreve depois a fala de um informante, Isaac Cassuto, que pronunciava o ditongo ei com é aberto, sobretudo nas terminações -eiro e -eito, e o s "como no norte de Portugal". Som germânico tinha o r deste informante, que comunica ao filólogo português que, entre os judeus de Hamburgo, se empregava em lugar de batizar a forma "baltizar", igualmente característica regional em Portugal. Por último, Leite de Vasconcelos apresenta três termos correntes no funerais: mortalha, tumba e a fórmula funerária «sepultura do B. V.», na qual a sigla está por «Bem-Aventurado».
Para esta resposta, não foi possível achar outros comentários de Leite Vasconcelos sobre o assunto, a não ser a remissão feita à Esquisse... nas Lições de Filologia Portuguesa (1926, 2.ª edição, p. 20, nota 1, mantém-se a grafia original):
«Também outr'ora foi fallado em cidades da Itália, da França, da Inglaterra, da Allemanha, da Hollanda pelos Judeus de origem portuguesa. Occupei-me d'êste assunto na minha Esquisse d'une Dialectologie portugaise, Paris, 1901, pag. 15 ss., num capitulo consagrado á Geographia da nossa lingoa.»
Na nota 1 (ibidem) acrescenta:
«Vid. além d'isso : Recherches sur les juifs espagnols et portugais à Bordeaux por G. Cirot, Bordéus, 1909. Sobre os Judeus portugueses de outros países há differentes obras, que porém nào posso aqui especificar, para não sair muito do meu campo.»