A construção temporal com faz , relativa ao tempo decorrido, é correta e encontra-se atestada em várias fontes, incluindo dicionários elaborados em Portugal, como se pode verificar pelos seguintes exemplos:
(1) «Faz um mês que ele chegou» (Mário Vilela, Dicionário do Português Básico, Porto, Edições Asa, 1991, s. v. fazer).
(2) «Faz duas horas que estou aqui à espera» (Academia das Ciências de Lisboa, Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, 2001, s.v. fazer).
(3) «Já faz um ano que não o vejo» (J. Malaca Casteleiro, Dicionário Gramatical de Verbos, Lisboa, Texto Editores, 2007, s.v. fazer).
Trata-se de uma construção equivalente à construção com há – «há um mês/duas horas/um ano» –, embora seja mais corrente no Brasil1 do que em Portugal. Convém, aliás, acrescentar que há falantes de Portugal que só aceitam frases como (1) desde que nelas ocorra «um advérbio ou locução adverbial que introduz o momento de referência»2. Por outras palavras, tais falantes preferirão «faz hoje um mês que ele chegou»3.
Este uso parece decorrer de uma diferença entre a locução introduzida por há («há um mês») e a introduzida por faz («faz um mês»): com há, o momento de referência é o tempo da enunciação, isto é, o tempo em que o falante produz o enunciado (ex.: «o Pedro casou-se com a Joana há cinco anos»); mas, como faz, a localização do evento pode ser quer o tempo da enunciação («o Pedro casou-se com a Joana faz cinco anos» = «há cinco anos»), quer outro tempo marcado por um advérbio ou locução adverbial de valor dêitíco («O Pedro casou-se com a Joana faz amanhã cinco anos»).
Em suma, as construções temporais introduzidas por faz são corretas. No entanto, há um matiz semântico no uso europeu que pode ter consequências nos juízos de gramaticalidade dos falantes de Portugal.
1 No Corpus do Português de Mark Davies, observa-se que «faz n anos/meses/dias/horas» (em referência a tempo decorrido) é mais frequente nos usos literário e não literário do Brasil do que nos textos associados ao português de Portugal. Acresce que se regista o faz temporal sem qualquer comentário desfavorável no Dicionário de Questões Vernáculas, do gramático brasileiro Napoleão Mendes de Almeida (1911-1998), conhecido pelo seu forte prescritivismo.
2 E. B. Paiva Raposo et al. Gramática do Português, Lisboa Fundação Calouste Gulbenkian, 2013, p. 1633, n. 105.
3 No caso de (2) e (3), a ocorrência de aqui e já, remetendo para a enunciação, tornará as frases compatíveis com a atitude descrita.
4 Paiva Raposo et al., op. cit., p. 1633.