O poema O Desejo do Homem é um exemplo de um soneto moderno (a nível da métrica e da rima).
Distinto do soneto clássico1, o soneto moderno não segue o «uso exclusivo do decassílabo, o verso próprio do soneto na poesia clássica portuguesa, nem as distibuições rimáticas (Amorim de Carvalho, Tratado de Versificação Portuguesa, Lisboa, Universitária Editora, 1987, p. 106).
Para além da liberdade no domínio da métrica, este poema não tem as mesmas rimas nas quadras [ABAB CDCD], outra das características do soneto moderno, que «não tem, obrigatoriamente, as mesmas rimas nas quadras (quer dizer, não obriga à transposição da rima para a segunda quadra)» (idem).
Assim, desde os românticos, avessos às convenções que pesam sobre a arquitetura do soneto, que «os sistemas rimáticos se alteram e atingem as quadras [mesmo se se mantém como preferível o emprego de apenas duas rimas, varia-se a sua combinação, tornando-se corrente ABAB-ABAB e ABBA-BAAB]». E, embora «o decassílabo continue a ser o metro mais utilizado, a par dele passa a encontrar-se o alexandrino, que a partir de Castilho ganhava notoriedade e que abandonava os seus ritmos mais clássicos, adaptando-se a esquemas mais livres e diversificados» (Biblos, Enciclopédia Verbo das Literaturas de Língua Portuguesa, Lisboa/São Paulo, Verbo, 1995, pp. 169-176).
Repare-se que vários poetas optaram pela composição de sonetos modernos, com um esquema rimático diferente do do clássico — como, por exemplo, ABAB CDDC EEF GGF («Ó luz, ó alma na amplidão suspensa!», de Junqueiro) — ou sem rima («Ó florentino túmulo de prata», de Júlio Dantas), assim como o soneto «Quem poluiu, quem rasgou os meus lençóis de linho», de Camilo Pessanha, em versos alexandrinos e em que só uma das rimas da primeira quadra se transporta para a segunda.
Portanto, são as divisões estróficas (duas quadras e dois tercetos) que parecem identificar o soneto, definido por Maria do Céu Fraga como «poema de forma fixa, caracterizado pela tensão e pela concisão discursiva, e composto de catorze versos distribuídos por duas quadras e dois tercetos, que tendem a formar duas unidades, a primeira de oito, a segunda de seis versos» (Biblos, Enciclopédia Verbo das Literaturas de Língua Portuguesa, ob. cit.). Assim, são as divisões estróficas que «são fundamentais para o soneto perfeito», quer se trate do soneto clássico quer se trate dos sonetos modernos (Amorim de Carvalho, ob. cit.).
Nota: Importa referir também: «quando o soneto é de versos de pequeno número de sílabas, chama-se-lhe sonetilho (Amorim de Carvalho, ob. cit., idem, p. 108), sendo o mais usado o de heptassílabos. Mas Amorim de Carvalho informa-nos de que «o capricho tem sido até ao sonetilho de versos monossilábicos» (idem, p. 109).
1 O soneto clássico, «que os clássicos levaram à mais alta perfeição formal, consta de quatro estrofes isométricas: duas quadras + dois tercetos, perfazendo, portanto, catorze versos, com transposição das rimas da primeira para a segunda quadra e transportação das rimas do primeiro para o segundo terceto, sendo a distribuição mais prestigiosa das rimas a seguinte: ABBA ABBA CDC DCD» (idem, p. 104). Por sua vez, «o decassílabo é o verso próprio do soneto, reputado o mais belo e grave» (idem, p. 105).