Com efeito, como afirma o consulente, o verbo ser é descrito geralmente como um verbo que «marca a atribuição ao sujeito de uma propriedade que o caracteriza enquanto indivíduo»1, ao passo que estar «marca um estado mais ou menos provisório e contingente no qual se encontra o sujeito»1. A distinção de base destes verbos estabelece-se pela sua associação a predicados estáveis (verbo ser) ou a predicados episódicos (verbo estar).
No entanto, a realidade que a língua descreve em muitos casos não mantém uma dada característica ao longo de toda a sua existência, pelo que o verbo ser poderá apenas descrever uma estabilidade que caracteriza uma dada realidade ao longo de um período de existência. Daí alguns autores distinguirem entre estados estáveis permanentes e estados estáveis não permanentes2. Este último traço verifica-se nas frases aqui transcritas como (1) e (2):
(1) «Este processo químico agora é exotérmico, mas em pouco tempo será endotérmico.»
(2) «Estes tipos de estrelas são azuis apenas dois segundos da sua vida.»
Na frase (1), o recurso ao presente do indicativo e ao futuro do mesmo modo permite descrever dois estados que ocorrerão em diferentes intervalos de tempo. Na frase (2), o predicado estável não permanente é descrito como ocorrendo durante um curto intervalo de tempo, mas esta informação é dada pelo sintagma de natureza temporal «apenas dois segundos da sua vida» e não por uma “nova” significação do verbo.
Numa frase copulativa, com o verbo estar podem combinar-se particípios verbais télicos, isto é, que têm uma temporalidade interna, sendo capazes de denotar um processo com um fim intrínseco. O verbo abrir é um exemplo de verbo télico, que descreve uma situação que se prolonga no tempo e prevê um fim. Quando este fim é atingido, o verbo pode combinar-se com o verbo estar para descrever um estado resultativo ou consequente3, como se observa em (3):
(3) «A garrafa está aberta.»
Esta interpretação como estado resultativo ou consequente pode ser associada às frases apresentadas pelo consulente, aqui transcritas como (4) e (5):
(4) «Um lado da lua está sempre oculto.»
(5) «Esta comida não é velha, mas está estragada4.
Disponha sempre!
1. Raposo in Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, p. 1304
2. Idem. Ibid., p. 1307.
3. Idem, ibid., p. 1309.
4. Para um maior aprofundamento do tema, cf. Idem, ibid., pp.1304-1312.