É erróneo considerar pai como hipónimo de família, porque pai não define um subtipo de família, nem esta é propriamente uma palavra com um significado mais geral. Não há, portanto, uma relação de hierarquia entre as duas palavras que faça de família um termo superordenado (ou hiperónimo) e de pai uma especificação da noção associada a família (hipónimo)1.
A classificação descritivamente adequada ao caso de família e pai é a relação parte-todo, isto é, a relação entre merónimo e holónimo2. Assim, família denota um todo que inclui a entidade denominada pai, enquanto pai, definível como «um dos membros de uma família», denota um elemento participante de um todo denominado família. Diz-se, portanto, que família é um holónimo (refere um todo), e pai, um merónimo (refere uma parte de um todo).
Acrescente-se que o verbo ser permite identificar um hipónimo com o seu hiperónimo, mas não um merónimo com o seu holónimo3:
(1) «Um cão é um animal.»
(2) ?«Um pai é uma família.»
Em (1), a definição de cão é identificada com a de animal, que é o termo mais geral (hiperónimo). Contudo, a estranheza de (2) sugere que a definição de pai não corresponde a uma especificação do todo denotado por família4.
As relações parte-todo são identificáveis pelo verbo ter, numa frase em que o holónimo ocorre como sujeito e o merónimo como complemento5:
(3) «Uma família tem um pai.»
Em (3)4, pai aparece como denotação de parte (merónimo) de um todo maior, marcado por família (holónimo).
1 Sobre a relação entre um hiperónimo e os seus hipónimos, Maria Henriqueta Costa Campos e Maria Francisca Xavier, em Sintaxe e Semântica do Português (Lisboa, Universidade Aberta, 1991, pág. 245), observam o seguinte: «[...] a unidade flor é termo superordenado no subsistema em que os restantes elementos – co-hipónimos de flor – são rosa, cravo, tulipa, etc.: flor é definido pela propriedade «ser flor», rosa é definido pela propriedade «ser flor», acrescida de outra propriedade que exprime a especificidade de rosa, etc. [...]»
2 Ver no Dicionário Terminológico, documento orientador da descrição gramatical no ensino básico e secundário em Portugal, holonímia e meronímia.
3 No entanto, pode dizer-se que «pai é família», no sentido em que «ser família» equivale a «ser membro de família» ou «parente». Este caso, diferente do aqui comentado e merecedor de um exame mais detido, impossível de concretizar agora, parece aproximar-se da relação entre hipónimo e hiperónimo.
4 Interprete-se a frase de acordo com a conceção mais convencional do núcleo familiar: mãe, pai, filhos.
5 Cf. Rui P. Chaves, em "Organização do Léxico" in Gramática do Português, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2013, pág. 205). Este autor distingue seis classes de meronímia-holonímia, entre as quais, a meronímia inclusiva, entendida como a relação que «[...] estabelece uma ligação entre nomes coletivos (ou grupais) e os nomes que designam as entidades que compõem esses coletivos» (idem, pág. 207). É esta a relação que liga, por exemplo, alcateia a lobo, ou floresta a árvore ou diferentes tipos de árvore denotados por sobreiro, carvalho, pinheiro, eucalipto. Aceitando que família é coletivo de parente (cf. Dicionário Houaiss) e que se contam diferentes tipos de parente denominados pai, mãe, filho, irmão, etc., parece justificar-se a classificação da relação entre pai e família como um caso de meronímia inclusiva. Agradeço a Carla Marques, consultora permanente do Ciberdúvidas, a chamada de atenção para a discussão desenvolvida nesta e noutras referências, bem como as sugestões que levaram à alteração da primeira versão desta resposta.