As fontes de que dispomos não confirmam que a construção em causa – «dizer para» + infinitivo – seja resultado de uma deturpação provocada pela influência da língua inglesa. Com efeito, a Gramática do Português (Fundação Calouste Gulbenkian, 2013, pág. 1929) inclui o verbo dizer entre os verbos diretivos («designam atos de fala que representam ordens ou pedidos») que «selecionam orações infinitivas introduzidas pela preposição para, entre os quais dizer, implorar, insistir e pedir» (exemplos da mesma fonte: «a professora disse para (tu) não copiares»; «eu insisti para os jardineiros cortarem essa árvore»; «o prisioneiro implorou/pediu para os guardas o libertarem»).
Observe-se que a gramática referida tem um propósito descritivo e, portanto, poderá pensar-se que os exemplos que apresenta sejam o retrato de um uso que a norma tradicional não aceita. Mas não é bem isto que se verifica, porque mesmo os gramáticos normativos aceitam em parte ou totalmente a associação da preposição para ao verbo dizer (a discussão abrange também «pedir para...» + infinitivo). Assim:
1. Napoleão Mendes de Almeida (NMA), que, no seu Dicionário de Questões Vernáculas (artigo "Pedir que..."; foi consultada uma impressão de 2001, mas a obra é muito anterior), condenava o uso de dizer e pedir com para (a introduzir oração de infinitivo) e «para que» (no começo de oração finita), concedia legitimidade, pelo menos, a «pedir para» e «dizer para» + infinitivo, que os clássicos literários abonavam (exemplos do autor em referência): (i) «Um cavaleiro... pede para falar com o conde.» (Herculano) (ii) «Padre Antônio... pediu para ficar só comigo.» (Camilo) (iii) «Minha mãe ficou perplexa quando lhe pedi para ir ao enterro.» (M. de Assis) (iv) «Peça a algum lojista para ter na sua loja...» (Castilho). Em todos estes exemplos, NMA interpreta estas frases como construções elípticas, pelas quais se omite «pedir permissão/licença».
2. Não obstante, a posição de NMA não era partilhada por todos os cultores da gramática prescritiva. Com efeito, Vasco Botelho de Amaral, no seu Grande Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português (1958), tem outra posição, e, remetendo a construção «dizer para» para o artigo dedicado a «Pedir para», faz estas considerações (mantém-se a ortografia do original):
«Cândido de Figueiredo e outros autores criticaram frases, como: pedir para se fazer, pedir para que se faça, em lugar das quais só correcto seria redigir: "pedir que se faça. Isto é, haveria correcção apenas no emprego de uma oração conjuncional integrante, depois do verbo pedir, e o uso de uma oração infinitiva final era dado por erróneo. Hoje há quem siga esta opinião. Mas deve advertir-se que Epifânio Dias, na sua Sintaxe Histórica, 269, ensinou: "Na qualidade de complemento directo liga-se uma oração de que aos verbos... Obs. Alguns dos verbos de que trata este parágrafo têm outra sintaxe, v. g.: 1) pedir também se construi intransitivamente seguido de "para que" (com infinitivo). Também em latim a oração de ut que se junta ao verbo peto é originàriamente uma oração final." Afora isto, precisamos de concordar que, ao escrevermos, por exemplo, "peço para ler" ocorre aqui uma legítima elipse da palavra licença ou outra sinónima, como permissão, ordem, consentimento, autorização: "peço (licença) para ler". Dir-se-á que o mesmo se não pode subentender em redacções destas: "peço-te para vires cá hoje". E neste caso julga-se que o correcto só pode ser: "peço-te que venhas cá hoje". Ora, em primeiro lugar, afirmaremos que o povo emprega com toda a naturalidade essa e semelhantes maneiras de dizer. E, se ele assim diz, a redacção é legítima. Cumpre analisá-la, então. E a análise pode fazer-se deste modo: "peço-te" (quero dizer: "faço-te um pedido, rogo-te, faço-te um rogo") = oração principal, considerando-se o verbo "pedir" como intransitivo, ou, se se pretende, transitivo com o complemento directo elíptico (cf.: fulano anda a "pedir", isto é, anda a "pedir esmola"); para vires cá hoje – oração subordinada infinitiva final, adverbial. Isto é: "peço-te para vires cá = faço-te um pedido, faço-te um rogo, para quê? – Para vires cá, ou seja,: para que venhas cá. E, portanto, também é correcto: "peço para que venhas cá hoje". O filólogo Rodrigo de Sá Nogueira nas Questões de Linguagem, pág. 259, dá por correcta a elipse de licença, mas prefere "pedir que", se "o complemento de pedir é a oração seguinte". Parece-nos que o que acima dizemos mostra não ser necessária a destrinça estabelecida por este Autor. Por último remetemos o Leitor para o Joio na Seara, por Augusto Moreno, pág. 96, em que se verão exemplos de "pedir para" da autoria de Castilho, Herculano, Garrett e Camilo. De Herculano cita Augusto Moreno só o Monge de Cister. Mas também na pág. 128, 22.ª ed. de Eurico, o Presbítero, encontrámos nós: "pediu para falar..."»
Em suma, é muito duvidoso que a construção «dizer para» se deva à influência do inglês.
OBS.: Sobre a existência de construções análogas noutras línguas românicas, junta-se o seguinte comentário do consultor Luciano Eduardo de Oliveira: «A estrutura a que [o consulente] atribui influência inglesa encontra-se em outras línguas românicas também. Usando o exemplo [da pergunta]: "I told/asked you to do that." Em italiano: "Ti ho detto/chiesto di farlo." Em francês: "Je t'ai dit/demandé de le faire." Em espanhol nunca vi com o verbo decir, mas com pedir é possível, pelo menos na América Latina: "Te pedí hacerlo./Te he pedido hacerlo."»