É necessário começar por esclarecer que a construção «chamar alguém de...» não é um erro. Apesar de estar hoje identificada com o português do Brasil, sabemos que ela também ocorre na história geral do português, antes da atual diferenciação, e, mais tarde, talvez por reforço do contacto com o português do Brasil, no português de Portugal. Note-se, a propósito, que a construção se encontra em autores portugueses, pelo menos desde os fins do século XIX, o que pode pôr em causa a influência direta das telenovelas brasileiras:
(1) «Iria profanar-lhe os ossos, como um micróbio, visitá-lo até à rede interna dos ossos e a polpa do coração. A isso se chamava de trabalho abominável.» (Lídia Jorge, O Vale da Paixão, 1998, in Corpus do Português de Mark Davies)
(2) «E pouco demorou a que chegassem, convocados pelos brados de um que gritava no que chamavam de minarete [...]. (Mário Cláudio, Peregrinação de Barnabé das Índias, 1998, idem)
(3) «O incidente, que nem de propósito, distraiu da bengala e chamou de águas passadas o assunto da Francelina [...].» (Tomaz de Figueiredo, Gata Borralheira, 1954, idem)
(4) Como o Deão também fosse atacado pela mania oratória, a qual lhe dava para grandes e labirínticas metáforas, foi dizendo: « Antes do tremor de mãos eu noto em V. Ex. o que os peritos chamam de paralogia metafórica [...].» (Eça de Queirós, Alves & Companhia, 1924, idem)
(5) «[...] o arcebispo acudira dizendo: « Melhor vos acertara com o nome, segundo a vida que fazeis, quem vos chamara de Bene bibis e male vivis.» (Camilo Castelo Branco, A Queda dum Anjo, 1866, idem)
Quanto à análise de uma frase em que figure esta construção, deverá o verbo classificar-se como transitivo-predicativo (cf. Dicionário Terminológico). Sendo assim, «de burra» é um predicativo do complemento direto – a presença de preposição introdutória não impede esta classificação (ler aqui).