DÚVIDAS

Regência do verbo chamar, novamente

E desta forma termina o tópico denominado "Chamar com Regência":

(...) «Assim, embora se defenda como preferível a forma "ele chamou-lhe intelectual", não poderá dizer-se que é um erro a construção "chamar de" no sentido de "chamar nomes a alguém", presente na frase "ele foi chamado de intelectual"».

Mas como pode tal?...

Se aceitarmos a construção «ele foi chamado de intelectual», teremos de aceitar também «chamaram-no de intelectual». Se aceitarmos «chamei-o de mentiroso», teremos de aceitar, por exemplo, «chamaste-o», ao invés de «chamaste-lhe»; «chamámo-lo», ao invés de «chamaste-lhe», etc. E, como bem refere M.R.M.R.: «seria, sim, incorrecto dizer “o chamam” ou “chamam-no”. A forma correcta é "lhe chamam"». «Ela chamou sábio ao professor» = «Ela chamou-lhe sábio» Em Portugal, é esta a construção correcta.

Se alguém «o chamou», foi, possivelmente, para obter a sua atenção. Se alguém lhe chamou, foi, provavelmente, um nome qualquer. E são, decididamente, coisas diferentes. O que será que me escapa?

Obrigada.

Resposta

Não lhe escapa nada, cara consulente. Analisou muito bem a regência do verbo chamar. Acontece que fui eu quem deu as duas respostas, aquela da qual a consulente discorda e a que cita como correcta, pelo que vou tentar, então, esclarecer o meu ponto de vista.

A construção portuguesa correcta é «ele chamou-lhe intelectual, sábio ou mesmo mentiroso». Nesta frase, o verbo chamar pede um complemente directo (intelectual, sábio, mentiroso) e um indirecto (lhe). É esta a construção portuguesa correcta.

No entanto, eu não posso dizer que está errada uma construção que é usada correntemente no Brasil, que é aceite por grandes gramáticos brasileiros e que aparece em textos medievais, como explico na resposta que contesta. Apercebemo-nos de que, no Brasil, ao usar-se o verbo chamar no sentido de «acusar», se adoptou, simultaneamente, a regência deste verbo («acusar alguém de algo»). E, realmente, os exemplos normalmente utilizados contêm essa ideia de acusação, pois os epítetos ou têm carga negativa («chamaram-no de mentiroso») ou são utilizados em sentido negativo («chamaram-no de intelectual»).

Assim, apenas posso dizer que a construção portuguesa correcta é «chamaram-lhe intelectual».

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