A grafia correta é bola.
Esta palavra, feminino de bolo, é homógrafa de bola, «esfera, balão». A diferença está na pronunciação: enquanto em «bola de carne» temos bola com o fechado, em «bola de futebol», temos na sílaba tónica um o aberto. Bola é, em várias regiões de Portugal, o que noutras se conhece por folar e denomina, portanto, um pão grande e doce (cf. dicionário da Academia das Ciências de Lisboa s. v. bola2). Uma «bola de carne» – ou, simplesmente bola – é «espécie de pão feito da massa do pão de trigo a que se acrescentam ovos e em que se dispõem camadas de presunto, salpicão e outras carnes (idem, ibidem).
Sendo bola uma palavra grave (paroxítona) que termina em -a, não é possível aplicar-lhe qualquer acento gráfico. As palavras paroxítonas só recebem acento gráfico quando terminam em -ã(s) (órfã), -ão(s) (órgão, benção), -eis (fósseis), --i(s) (táxi, lápis), -um, -uns ou -us (álbum, álbuns, húmus), -l ( amável, têxtil), -n (íman, plâncton), -r (ímpar, Tânger), -x (tórax), -ps (bíceps) – cf. Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, Base IX, 3 e 5).
Acrescente-se que a palavra em questão já se escreveu com acento circunflexo. Com efeito, encontra-se registada sob a forma bôla, no Vocabulário Ortográfico e Remissivo da Língua Portuguesa (1913), de R. R. Gonçalves Viana, o que se explica porque o Formulário Ortográfico de 1911 (Base XXVIII) determinava o uso distintivo do acento circunflexo em vocábulos com e ou o fechados de forma a distingui-los dos seus homógrafos com e ou o abertos (mantém-se a ortografia original): «Quando um qualquer vocábulo que tenha por sílaba predominante a penúltima, e cuja vogal nessa sílaba seja e ou o abertos, fôr homógrafo com outro em que êsse e ou o seja fechado, marcar-se hão êstes com o acento circunflexo. Assim se diferençarão rêgo, substantivo, e rego, verbo; pêgo, ave, e pego, abismo, ou forma do verbo pegar; rôgo, substantivo, e rogo, verbo; sôbre, preposição, e sobre, verbo; mêdo, susto, e medo, nome étnico; dêmos, presente do subjuntivo, e demos, pretérito (do verbo dar).» Este preceito desambiguador praticamente deixou de ter aplicação com a entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1945, cuja Base XXII apenas o conservou em pares em que um dos termos não tinham acentuação própria (côa < coar e Côa, nome próprio vs. coa < com a) e em pares de formas flexionadas em contraste pelo timbre das vogais médias (pôde, 3.ª pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo vs. pode, 3.ª pessoa do singular do presente do indicativo; dêmos, 1.ª pessoa do plural do presente do conjuntivo vs. demos, 1.ª pessoa do plural do pretérito perfeito do indicativo)1. O Acordo Ortográfico de 1990 (Base IX, 6) foi mais longe, suprimindo o acento circunflexo em quase todos estes casos, exceto no par pôde/pode, em que é obrigatório e, opcionalmente, em dêmos/demos e fôrma (substantivo)/forma (3.ª pessoa do singular do presente do indicativo de formar).
1 Ainda no contexto do Formulário Ortográfico de 1911 (Base XIX, o acento agudo tinha também função desambiguadora de palavras paroxítonas: «Diferençar-se hão pelo acento agudo os seguintes vocábulos: pára, verbo, de para, preposição; pélo, péla, de pêlo substantivo, e de pelo, pela (per lo, per la, per o, per a); pólo, substantivo, de polo (forma antiquada, em vez de pelo); [...]. Pelo agudo se diferençará a forma do pretérito, louvámos, da do presente, louvamos.» O Acordo Ortográfico de 1945 manteve esta norma, conforme dispunham a Base XVI (relativamente ao contraste entre amámos, 1.ª pessoa do plural do pretérito perfeito do indicativo e amamos, 1.ª pessoa do plural do presente do indicativo) e a Base XVIII (a respeito de casos como o de pára<parar vs. para, preposição, ou pélo<pelar vs. pelo < por + o). Mais tarde, o Acordo Ortográfico de 1990, atualmente em vigor, suprimiu o uso desambiguador do acento agudo (Base IX, 9), exceto nas formas de 1.ª pessoa do plural do pretérito perfeito do indicativo de verbos da 1.ª conjugação, em que o referido acento passou a opcional (Base IX, 4).