É engano, pelo adjetivo ruça, «(de tom) pardacento ou acinzentado»1, quando referido a animais, e «loiro, castanho-claro», na descrição da cor de cabelo.
Não se sabe ao certo a origem da expressão. No Dicionário de Expressões Correntes (Lisboa, Notícias Editorial, 2000), Orlando Neves (1935-2005) dá uma explicação mais circunstanciada, mas não deixa de a assinalar como conjetural2:
«Doutor da mula ruça (tira o chapéu e põe a carapuça) – Designa pessoa de pouco valor que se dá ares de importante, uma espécie de charlatão.
Vários autores citam uma história acerca de um António Lopes, que exercia medicina e era muito popular em Évora. Este homem estudara na Universidade de Alcalá de Henares e aí obtivera o grau de bacharel. Requereu ao rei o grau de doutor pela Universidade de Lisboa para usufruir das mesmas vantagens dos diplomados por ela. O rei acedeu depois de o ter mandado examinar pelo seu físico-mor, doutro Diogo Lopes. Consta do livro Doações a carta régia de confirmação que foi passada a 2 de Maio de 1534 e está registada na Chancelaria de João 3.º: "Dom Joham 3.º A quantos esta minha carta virem faço saber que o douto Ant.º Lopes, físico d'Évora, me apresentou ua carta do doutor Dioguo Llopez,meu físico moor, de que o theor de verbo he o seguinte: "O doutor Dioguo Llopez, comendador da Ordem de XPO (Christo) e físico moor dellRey Nosso Senhor em seus regnos, e senhorios, faço saber a quantos esta minha carta de douctorado vyrem como por Antonio Loes, físico de mulla ruça, morador en esta d'Évora, me foy apresentado hum allvara dellRey noso senhor, per sua alteza asygnado e passado per sua chancellaria, da qual o trellado he o seguinte: Eu ell Reyfaço saber a vos Doutor Diogo Lopes, seu físico moor, que Antonio Llopz,físico da mula ruça, morador en esta cidade, me dice per sua petiçam que ell estudou nove ou deza nnos no estudo de Alcalá[...].'"
Provirá, então, a frase do facto de este doutor Lopes se deslocar numa mula ruça ter obtido o grau de doutro da forma narrada?»
Acrescente-se que o adjetivo ruço provirá do latim roscĭdu-, «orvalhado», cujo significado terá passado por um processo de extensão metafórica (cf. Dicionário Houaiss e,de Joan Coromines e J. A. Pascual, o Diccionario Crítico Etimológico Castellano e Hispánico).
1 Cf. Cândido Figueiredo, Novo Dicionário da Língua Portuguesa , 2.ª edição (edição eletrónica com o título Dicionário Aberto). Ver também a Infopédia.
2 Esta explicação foi exposta, em 2007, no programa Cuidado com a Língua!, da RTP, o qual também se encontra disponível na RTP Ensina.